Já com um grau de irritação explosivo quanto aos descalabros presidenciais, a sociedade reagiu com vigor à intervenção emocional de Bolsonaro na Petrobras (SA:PETR4). Na mídia, a perplexidade vinha revestida de repúdio em editoriais, colunas ou simples postagens; e no mercado, em repulsa à ação de uma empresa que entraria em decadência.
E não era para menos. Depois de se eleger envolto na bandeira liberal, o presidente só gerou decepções, seja pela lentidão das privatizações, respeito ao corporativismo estatal, aliança com avessos ao mercado até uma abortada tentativa de ejetar o talentoso presidente do Banco do Brasil (SA:BBAS3). Sem esquecermos das manifestações presidenciais primatas sobre gênero, meio ambiente, armamentos e pandemia.
O resultado foi imediato: no primeiro pregão após a notícia de que o atual presidente da estatal seria substituído por um general, a Petrobras perdeu quase um quarto de seu valor. O fantasma do intervencionismo da ex-presidente Dilma Rousseff, congelando preço dos derivados e deteriorando a lucratividade da Empresa, foi a mola a impulsionar vendas desenfreadas das suas ações.
Por outro lado, o episódio da substituição envolve atenuantes importantes que, no calor da refrega, estão passando desapercebidas e que, quando conscientizadas, induzirão a recuperação das perdas ocorridas:
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O mercado rodoviário brasileiro apresenta peculiaridades jaboticabais. Em primeiro lugar, é hipertrofiado, tendo crescido sobre o ferroviário ineficiente como resultado do protecionismo à indústria automobilística. Donde seu poder de paralisar as cadeias produtivas rapidamente.
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Outra peculiaridade do setor é o convívio nele de grandes empresas de logística, capitalizadas e geridas nos padrões internacionais de eficiência e o enorme contingente de autônomos, que jantam o que ganharam no almoço. A vulnerabilidade destes foi agravada pela intervenção de Dilma, financiando caminhões a juros polpudamente negativos e transformando, conforme postou Claudio Mendes recentemente, “barbeiros, encanadores e biscateiros em empresários rodoviários.” Esta frota artificialmente expandida, cujos proprietários são pessoas físicas financeiramente vulneráveis, exerce uma pressão baixista recorrente sobre os fretes, mantendo os autônomos sempre à beira do prejuízo.
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Paulo Sergio Ribeiro, controlador da transportadora Tora, em artigo na semana passada no Jornal do Commercio, lembrava que um autônomo, transportando um frete do Sul para o Norte, confrontado com um reajuste no diesel, que representa até 60% do seu custo operacional, toma um prejuízo contra o qual não tem qualquer reserva. A sensação de sentir-se lesado por um aumento significativo do diesel é inevitável. Paulo Sergio propõe uma solução engenhosa: que os aumentos obedeçam continuamente ao comportamento de uma média móvel de preços internacionais, evitando mudanças bruscas, para cima ou para baixo, sem prejuízo para a Petrobras, sem sobressaltos para os caminhoneiros.
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O atual presidente da Petrobras é um dos mais respeitáveis executivos que a coletividade de economistas brasileiros gerou: honesto, talentoso, devotado, um exemplo. O trabalho de recuperação que vem fazendo na empresa é admirável. Entretanto, ao declarar que o problema dos caminhoneiros não é dele, cometeu pênalti mercadológico. Abusou do poder de um monopólio estatal, desrespeitando a velha máxima de que o cliente tem sempre razão e suas demandas devem ser consideradas pela empresa.
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A decisão de Bolsonaro não foi extemporânea. Certamente, acelerada pela declaração de Castelo Branco após o reajuste de 15% do diesel, mas a indicação do presidente da Petrobras para os próximos 2 anos estava marcada há tempos, para março. Esperava-se que o atual presidente fosse reconduzido, mas não há violência alguma em não o fazer.
Ao exigir que se pise em ovos ao lidar com caminhoneiros, Bolsonaro está revelando sensibilidade política para com um segmento social que se complicou, por aderir a um projeto antimercado de Dilma, parte da herança maldita dele.
Ao demitir o presidente que lhe gerou um problema político ao desprezar um princípio comezinho de marketing, agiu como faria qualquer chairman de uma grande empresa. Com a vantagem de concretizar seu desejo de sócio controlador em data previamente estabelecida para tal.
Ao comprometer-se em não interferir na política de preços da Petrobras, eliminou falsas analogias entre sua postura e a de governos passados, ratificando assim seu compromisso com soluções de mercado.
Ao escolher o atual presidente da Itaipu Binacional como substituto, comporta-se como recomendaria um headhunter consagrado, indicando um executivo com experiencia na gestão de uma corporação de grande porte. O fato de ser militar não pode ser critério nem para escolha, nem para rechaço de um candidato, ainda que não se possa negar-lhes o apanágio de profissionais treinados no comando de grandes contingentes de talentos e braços para cumprimento de metas.
Estamos começando uma nova era na retomada do crescimento, no diálogo político e na independência dos poderes. Por mais engulhos que o estilo Bolsonaro possa nos causar, se a autonomia da estatal for respeitada como assegurado, não há razão para ela sofrer perdas cavalares na Bolsa.