E, de repente, a liquidez externa, irrigada pelos Bancos Centrais das principais economias que estava represada pela aversão aos riscos, se liberta e “invade”, até com falta de acurácia, os ativos de maior risco, afastando-se do dólar, e muito provavelmente do ouro, como “porto seguro” e impacta nos ativos com perspectivas de melhores retornos e isto conduz os investidores aos mercados emergentes.
A reação provoca mutações expressivas e ao mesmo tempo em que relega a consideração de riscos latentes em economias emergentes, cria consequentes riscos no desarme de posições especulativas montadas com foco no pior cenário, e isto pode deixar grandes “estragos” e grandes perdas a investidores que apostaram firmemente no pior cenário.
O Brasil já “assistiu a este filme” e presenciou grandes corporações encerrarem suas atividades e/ou consolidarem enormes prejuízos, por enquanto não há sinais emitidos, mas não se pode descartar que ocorrências venham a se tornar públicas proximamente.
O destempero fortemente emocional que motiva a liberação de recursos financeiros até então represados entusiasma e, momentaneamente, desfoca a percepção de quadros econômicos absolutamente problemáticos que não se alteraram, e que pode gerar uma equivocada visão de que “está tudo resolvido”.
Uma mudança de R$ 0,90 no preço do dólar num curto período de tempo num mercado que tem posicionamentos bilionários é substancial e dá a dimensão da capacidade de perda para alguns “players” do mercado, até porque quando um ganha o outro perde neste mercado, onde normalmente só os ganhadores se tornam públicos.
Em realidade os desafios grandiosos postos para o Brasil no momento persistem, seja no ambiente econômico seja no ambiente da crise do coronavírus, nada sugere que tenham sido alterados, muito menos para melhor, mas se temos pouco a fazer por nós mesmos os outros, os estrangeiros em grande parte com seus recursos abundantes e fomentando expectativas favoráveis, o fazem e o Brasil, que até então havia perdido atratividade volta a “sonhar com os bons tempos”, mas precisa ser sensato e não menosprezar seus próprios riscos, extrapolando a racionalidade.
O governo brasileiro, oportunisticamente, testa o mercado internacional buscando captar recursos em tranches para 5 e 10 anos, na expectativa de que a liquidez internacional farta demonstre interesse nos nossos títulos já que o Brasil tem conceito de bom pagador e ao mesmo tempo aferir a sensibilidade dos investidores estrangeiros em relação ao país.
Inegavelmente há diversos fatores de risco presentes na economia brasileira, a queda da produção industrial é um indicativo, e a julgar pelo comportamento recente dos ativos domésticos, estão sendo atenuados pela ansiedade presente no mercado financeiro, mas perduram sem perspectivas e tendências concretas.
A propensão a novo corte da taxa de juro SELIC se confirmada pode acarretar problemas para o governo na rolagem da dívida, pois o nível de juro praticado no Brasil é desestimulante ao investidor estrangeiro para retornar, até porque há países emergentes em melhor situação econômica e fiscal que ofertam juro mais atraente.
Idealmente, o BC/COPOM não deveria cortar mais o juro SELIC para, ainda que em patamar baixo, a excessiva liquidez externa sentisse alguma atratividade pela renda fixa ajudando o financiamento da dívida pública do país.
Se efetivado novo corte na SELIC poderá ocorrer nova rodada de depreciação do real frente ao dólar, em especial se afetar a capacidade de financiamento da dívida pública.
O fluxo cambial de maio deixou evidente que a “sangria” líquida de recursos financeiros alocados no país foi drasticamente reduzido apontando tão somente negativo de US$ 882,0 Mi contra um fluxo comercial líquido de US$ 3,962 Bi, o que gerou um saldo positivo no mês de US$ 3,080 Bi.
O momento requer serenidade por parte dos “players”, pois há muito a ser feito, o desafio do país é grandioso e não há como prognosticar duração da recessão e o quanto será necessário para serem retomados os sinais iniciais efetivos de recuperação.
Movimentos como o que está sendo sugestivo que ocorra no mercado financeiro brasileiro devem ser observados com extrema cautela e, naturalmente, com visão rigorosa aos riscos, porque podem ser enganosos e conduzir a equívocos.
No quadro atual o que ocorre é consequência da melhora do ambiente externo e ainda não tem o Brasil como causa, sendo tão somente beneficiário.