*Com Adilson Bolico
Quando confiamos nosso patrimônio a um assessor de investimentos, consultor ou corretora, surge a dúvida: será que eles estão realmente protegendo nossos interesses? A questão é mais complexa do que parece, mas há obrigações legais e éticas que guiam a conduta desses profissionais no mercado financeiro. Até onde vão os deveres de proteção ao patrimônio do investidor?
O assessor de investimentos, que geralmente atua como um intermediário vinculado a uma corretora, é a principal ponte entre o investidor e o mercado financeiro. Sua função é orientar, apresentar produtos e facilitar a tomada de decisão. Contudo, ele não tem autonomia completa: sua atuação está vinculada às políticas comerciais da corretora e, muitas vezes, aos produtos que oferecem maiores comissões.
Apesar disso, o assessor tem obrigações claras. Ele deve agir com transparência, respeitar o perfil do cliente e apresentar recomendações compatíveis com os objetivos e a tolerância ao risco do investidor. Mas será que isso significa proteger o patrimônio do cliente como se fosse dele? Não exatamente.
Ao contrário dos consultores independentes, que possuem um dever fiduciário expresso – ou seja, a obrigação de agir exclusivamente no melhor interesse do cliente –, os assessores estão sujeitos a um conjunto mais limitado de responsabilidades. Mesmo assim, normas como a Instrução CVM 178/2023 exigem que eles ajam com boa-fé, lealdade e diligência, garantindo que suas recomendações sejam adequadas ao perfil do investidor.
As corretoras, por sua vez, têm um papel ainda mais estruturante. Além de supervisionar os assessores que atuam em seu nome, elas precisam implementar mecanismos para evitar abusos, como a venda de produtos incompatíveis com o perfil do cliente. Normas do Banco Central e Conselho Monetário Nacional reforçam a necessidade de controles internos e análises de adequação (suitability), mas a realidade do mercado nem sempre reflete esse ideal.
A prática mostra que muitas corretoras priorizam metas comerciais em detrimento da proteção efetiva ao investidor. Isso não significa que não existam mecanismos de proteção, mas demonstra que a responsabilidade pela escolha dos produtos nem sempre recai integralmente sobre o cliente.
Um ponto central nessa discussão é o que acontece quando o investidor sofre perdas significativas. Será que assessores e corretoras podem ser responsabilizados? A resposta é sim, desde que fique demonstrado que houve falha na prestação do serviço, como a venda de um produto inadequado ao perfil do cliente, omissão de riscos ou informações confusas.
O Código de Defesa do Consumidor e a legislação que regula o mercado financeiro oferecem suporte para que o investidor busque reparação nesses casos. Inclusive, decisões recentes têm reforçado a ideia de que as corretoras e seus representantes devem zelar pela proteção do cliente, mesmo que não possuam um dever fiduciário expresso.
Embora a legislação brasileira não atribua expressamente um dever fiduciário aos assessores de investimentos e corretoras, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) evidencia que a fidúcia é intrínseca a essa relação. A expectativa legítima do investidor é de que o assessor, como profissional especializado, esteja ali para conduzi-lo de forma segura, agindo em seu melhor interesse. Essa expectativa é amplamente alimentada pela maneira como a assessoria de investimentos é apresentada ao público – não como uma simples intermediação, mas como um benefício agregado ao contratar serviços e produtos financeiros.
Na prática, no entanto, a realidade, muitas vezes, se revela diferente. Em vez de priorizarem o interesse do consumidor, os interesses comerciais das corretoras e a busca por comissões acabam prevalecendo, distorcendo a essência dessa relação. Isso gera não apenas conflitos de interesse, mas também prejuízos materiais e a perda de confiança no mercado financeiro.
Portanto, é imperativo que os direitos do investidor sejam mais amplamente reconhecidos e protegidos, inclusive por meio de interpretações mais rigorosas do CDC e da regulação do mercado financeiro. A credibilidade do sistema financeiro depende de um alinhamento maior entre o que se promete ao investidor e o que realmente se entrega. Mais do que nunca, o investidor precisa ser tratado com o respeito e a segurança que lhe são devidos, especialmente em um mercado tão complexo e sensível como o de investimentos.