Em nossa busca por saúde financeira, facilmente nos voltamos para conselhos e estratégias positivas (conselhos sobre o que devemos fazer, notadamente o que fazer rápido para alcançar resultados rápidos ou até milagrosos). O problema disso é que muito do que precisamos fazer hoje tem relação com aquilo que poderíamos ter evitado ou é consequência da nossa busca de atalhos e fórmulas mágicas.
Hoje, quero conversar com vocês a respeito da importância de reconhecer o poder dos conselhos negativos (preventivos) - aquilo que devemos evitar. Assim como na saúde, onde evitar o tabagismo, por exemplo, traz mais benefícios do que inúmeras intervenções médicas posteriores, em matéria de organização financeira, evitar certos comportamentos pode ser muito mais eficaz do que muitas intervenções financeiras posteriores.
Quantos erros cometemos?
Resistir à tentação de gastar compulsivamente ou evitar investimentos altamente especulativos que extrapolam nosso perfil como investidor pode proteger nosso patrimônio mais efetivamente do que tentar encontrar uma fórmula mágica ou um método revolucionário. Este princípio, simples mas poderoso, é frequentemente ofuscado pela sedução de soluções rápidas e promessas de ganhos fáceis.
Eu sei e você sabe: nós não gostamos de conselhos negativos. Por isso, nós subestimamos ou negligenciamos esse tipo de conselho. Prestamos mais atenção quando o médico diz o que temos que fazer (tomar os remédios, por exemplo) do que quando diz o que devemos evitar (evitar refrigerantes, por exemplo). Ninguém gosta muito de restrições. Gostamos mais de conselhos positivos - o que fazer rápido para conseguir resultados rápidos. Isso está presente em quase toda promessa de cursos sobre investimentos encontrados na internet. Infelizmente, é o que mais vende.
É dessa forma que nós funcionamos. Nossa natureza frequentemente nos atrai para essas soluções rápidas ou transformações milagrosas. No entanto, como Nassim Taleb aponta, prever o imprevisível é uma tarefa árdua e muitas vezes infrutífera.
Podemos enxergar isso na forma de esquemas de enriquecimento rápido e investimentos da moda - veja como é comum ler sobre esquemas de pirâmides e sobre novas moedas digitais, apostas esportivas, etc - que, em regra, levam ao fracasso financeiro. Não conseguimos prever quase nada, mas adoramos quando alguém nos apresenta certezas. O discernimento e a sabedoria, tão essenciais na tomada de decisões financeiras, acabam ficando em um segundo plano diante das promessas de “faça isso e consiga aquilo”.
Quer um conselho negativo?
Como disse, o poder dos conselhos negativos refletem uma verdade simples, mas poderosa, sobre as finanças pessoais: o nosso desempenho financeiro pode ser melhroado em grande medida apenas se soubermos o que evitar, o que não fazer, quem não ouvir. Dito isso, vamos aplicar um pouco dessas lições em nossa vida diária. Deixarei com vocês três conselhos negativos que podem nos conduzir a uma vida mais significativa:
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Evite dívidas de alto custo, incluindo o cartão de crédito (cheque especial):
Pesquisas revelam que evitar dívidas com altas taxas de juros é mais benéfico para a saúde financeira do que tentativas de maximizar retornos em investimentos arriscados. Esse estudo (1) demonstra como o uso crescente de cartões de crédito, frequentemente não percebido como uma forma de dívida, contribui para o aumento geral da dívida das pessoas.
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Evite o investimento da moda e as oportunidades (não reguladas) de alto retorno:
Está todo mundo investindo naquele novo investimento? Fique de fora. A maioria dos investimentos promovidos como "a próxima grande coisa" é insustentável e logo desaba. Além disso, fique também de fora daquelas oportunidades (não vigiadas pela Comissão de Valores Mobiliários - órgão regulador do mercado de capitais) que apresentam altíssimos retornos. Em contraste, estratégias de investimento comprovadas, regulamentadas e diversificadas oferecem uma abordagem muito mais segura e consistente para o crescimento do patrimônio.
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Evite decisões financeiras baseadas em emoções ou apenas no valor da parcela:
Estudos (2) indicam que decisões tomadas sob influência de emoções mais intensas alteram nossa percepção da nossa realidade financeira, assim como as formas de pagamento também distorcem a nossa percepção sobre a realidade dos produtos, o que frequentemente nos conduz a erros significativos. Esses estudos sugerem que o uso de cartões de crédito pode fazer com que as pessoas deem menos atenção aos custos, o que pode contribuir para o acúmulo de dívidas.Um plano financeiro bem pensado e a adesão disciplinada a ele são fundamentais para evitar esses erros.Vai comprar algo muito caro? Reflita durante uma semana, pelo menos. Recebeu uma herança? Como sempre digo: dinheiro herdado, cuidado redobrado. Reflita durante alguns meses.
Como vamos concluir este artigo?
Estava aqui pensando em como concluir este artigo para que você realmente entenda a importância dos conselhos negativos. Pense comigo por um instante. Embora a internet esteja repleta de promessas de riqueza rápida e soluções fáceis, a verdadeira sabedoria financeira muitas vezes reside no simples fato de saber o que evitar.
O discernimento e a prudência são os maiores amigos da sua vida financeira. Não acredita ainda? Lembre dos ensinamentos bíblicos, históricos e filosóficos, como os dez mandamentos, que majoritariamente é composto de conselhos negativos. Nós podemos aplicar essa sabedoria na organização do nosso dinheiro. Evitar erros, hábitos prejudiciais e decisões precipitadas pode trazer benefícios significativos - muito maiores do que imaginamos.
*Fontes:
(1) Dunkelberg, William C. “Analyzing Consumer Spending and Debt.” Business Economics 24, no. 3 (1989): 17–22.
(2) Chatterjee, Promothesh, and Randall L. Rose. “Do Payment Mechanisms Change the Way Consumers Perceive Products?” Journal of Consumer Research 38, no. 6 (2012): 1129–39.