É bastante difícil para o investidor comum tomar posições contrárias ao que se vê nas notícias.
Apesar disso, é importante, ao investir em ações, entender que o mercado não se move conforme as notícias do jornal, e sim conforme a interpretação dos agentes do mercado e segundo a antecipação destes acerca do que pensam sobre o futuro.
Compreender que, ao investir, nossa visão sempre deve ser para o potencial de resultado das empresas no longo prazo e atentar para o que está (ou não) precificado na cotação das ações em termos de riscos e oportunidades são dois conselho dos mais valiosos que eu daria para um investidor.
Se seguir as notícias gerasse sucesso ao investir, os jornalistas seriam os melhores gestores.
Enquanto os jornais noticiam o que é fato atual, o analista e gestor de ações tem que estimar cenários futuros, atribuir probabilidades e comparar quanto valeriam as ações em tais cenários frente ao preço que negociam, procurando assimetrias que façam valer os riscos incorridos.
Observe que, além da importância de entender que o mercado antecipa expectativas futuras, é valoroso conseguir entender o quanto dos riscos está refletido no preço dos ativos.
O investidor mais treinado vai olhar não apenas para um prazo maior do que o estampado na capa dos jornais, como vai procurar riscos imputados excessivamente nos preços.
Enquanto o investidor menos treinado pode estar querendo evitar entrar numa posição olhando para um risco que está estampado nas capas dos jornais, um investidor mais treinado sabe que existem outros tantos riscos tão ruins quanto ou até mesmo piores, que não estão estampados nas capas dos jornais, e por isso mesmo, não mapeados.
Riscos conhecidos, em geral estão precificados nos ativos. O risco, na verdade, está mais no que é desconhecido do que no que é conhecido.
Os fatos que já conhecemos e que estampam as manchetes dos jornais podem ser de alguma maneira estimados e quantificados e, por isso, já devem estas descontados nas cotações.
É no desconhecido que mora o verdadeiro risco. Quantos analistas descontavam em suas projeções para o Ibovespa o novo coronavírus antes de ele aparecer?
Tente pensar nos riscos muito conhecidos que estão estampando o noticiário atual (pelo menos o econômico) e, portanto, estão provavelmente precificados nas suas posições, mas que podem, justamente por serem amplamente comentados, ter levado algumas ações a negociarem a valuations atrativos.
Quando olho as movimentações recentes da Bolsa, vejo claramente um desconto grande pressionando as ações de construção civil, como consequência dos já amplamente conhecidos aumentos de preços das matérias primas e do ciclo já iniciado de aumento na taxa Selic, que saiu de 2% para atuais 4,75% e que é projetada em 6,5% até o final de 2021, segundo o último relatório Focus divulgado pelo Banco Central.
A grande questão é que, provavelmente, por ser algo que já ocorreu e é de conhecimento amplo, provavelmente as ações já embutem em seus preços boa parte desses dois riscos, sem os quais estariam negociando em outro patamar.
Quando converso com players do setor sobre o cenário atual, em geral o que falam é que estão conseguindo manter margens ou até melhorar, dependendo da faixa de renda, com aumentos nos preços dos imóveis acima do necessário para recompor o aumento de custos, devido à demanda aquecida.
Sobre o aumento da taxa Selic, as empresas comentam que, quando a Selic caiu abaixo de 7%, já foi um movimento transformacional para o setor, e que nunca tinham convivido com taxas tão baixas como aquele patamar, de forma que uma Selic inferior a dois dígitos ainda é benigna a suas atividades e muito menor que a média histórica brasileira, com a qual estavam acostumadas a conviver.
Assim, minha dica de hoje é para você olhar bem de perto se os riscos imputados nos preços das ações não abriram boas oportunidades de investimento no setor, para aqueles com visão de longo prazo.