Tem havido muitas reações contrárias dos fanáticos por criptomoedas e blockchain ao recém-divulgado relatório do Banco de Compensação Internacional (BIS) que criticou duramente as moedas digitais e ignorou os diversos benefícios da tecnologia blockchain subjacente. Jeremy Allaire, diretor-presidente da empresa de criptomoedas Circle, apoiada pelo Goldman Sachs, foi uma das muitas pessoas que reagiram após o lançamento do relatório em 17 de junho.
Pesquisa errada, perspectiva pouco profunda
Em uma entrevista ao Business Insider, ele caracterizou o relatório de superficial e desatualizado e identificou um de seus principais defeitos — pouco considera os benefícios do blockchain, a principal tecnologia da rede em que opera a maioria das criptomoedas, incluindo o bitcoin:
"Está claro que o [BIS] não pesquisou corretamente. Ainda estão analisando informações antigas e não estão interessados no que realmente está acontecendo em termos do real P&D nesse espaço. É apenas uma pesquisa muito precária”.
Joseph Thompson, diretor-presidente e co-fundador da AID:Tech argumenta que, embora o conteúdo geral do relatório do BIS esteja bem argumentado, só é relevante no contexto do sistema financeiro. O relatório, chamado Looking Beyond the Hype (Olhando além do hype), foca na falta de crescimento de ativos digitais, chamando-os de substitutos precários para o dinheiro. Também destaca o fato de que o desempenho ou a escalabilidade das criptomoedas piora à medida que aumenta a popularidade das moedas digitais.
Thompson observa que o problema subjacente do relatório é que não inclui aplicativos não financeiros, as mesmas áreas onde o blockchain está tendo o maior impacto agora mesmo.
“É importante lembrar que o blockchain revoluciona fundamentalmente 'a transferência de valor' e não apenas o valor financeiro. Por exemplo: ajuda, bem-estar, doações, identidade, direitos de conteúdo, propriedade de dados, distribuição de recursos além do dinheiro e, portanto, o tom particularmente pessimista do relatório não está equilibrado, no mínimo. É um fato conhecido que a regulamentação está sempre um passo atrás da inovação: como a regulamentação pode ser implementada sem entender completamente o potencial integral da tecnologia? Se as partes relevantes decidem adotar uma abordagem colaborativa, alguns dos principais desafios — por exemplo a regulamentação — inevitavelmente serão resolvidos”.
A disrupção tecnológica do blockchain, especialmente dentro do sistema financeiro, tampouco foi devidamente examinado, disse Manuel Martin, cofundador e chefe de projeto sênior, especialista em blockchain na Orvium. Já reduziu o tempo de transação e as taxas de transferência, mudando a forma como as pessoas enviam dinheiro. Assim, não deve e não pode ser ignorado.
“Hoje em dia, os bancos e as empresas estão reconhecendo a oportunidade apresentada pelo blockchain e estão assumindo um papel de liderança na adoção dessas tecnologias. Isso, no entanto, é apenas a ponta do iceberg. Semelhante à revolução tecnológica vivida durante os anos 90 e a crescente adoção da internet, quando surgiram muitos projetos novos, inovação em quase todos os campos, hoje vivemos tempos fascinantes para o blockchain, onde projetos disruptivos estão criando um ecossistema de aplicações de rápida evolução .
Por que o relatório do BIS é importante?
O BIS, muitas vezes chamado de "o banco central dos bancos centrais", é uma organização coordenadora com vínculos com o Federal Reserve dos EUA e o Banco Central Europeu, bem como a outros bancos centrais regionais que estabelecem a política monetária das economias emergentes, desenvolvidas e em desenvolvimento. Esses bancos centrais regionais, em conjunto com o BIS, também colaboram para chegar a uma regulamentação financeira que influencie as políticas nacionais oficiais — inclusive oferece orientação sobre como organizações financeiras governamentais deveriam ver as moedas digitais.
Não é surpreendente então que, com as questões regulatórias relacionadas a criptomoedas ainda pendente em todo o mundo e uma gama ampla e diversificada de normativas já escritas — tudo, desde proibições diretas a ofertas iniciais de criptomoedas (ICOs), bolsas e vendas em algumas áreas, até a liberdade e liquidez das operações em outras — uma nota negativa sobre moedas digitais pode ter um efeito adverso na classe de ativos e sua aceitação.
E o relatório do BIS não era nada diplomático. Alega que os elevados volumes de operações com criptomoeda poderiam colapsar a internet. Também enfatizou sua falta de escalabilidade, que poderia provocar uma diminuição da confiança e eficiência no futuro. Além disso, é claro que isso indica que, apesar da tendência, as criptomoedas não podem se comparar com o dinheiro. Claramente não é um endosso de qualquer tipo.
Em contraste, o vice-diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dong He, divulgou um relatório em 31 de maio dizendo que os criptoativos poderiam reduzir a demanda de dinheiro do banco central e indicou uma série de formas em que os bancos centrais poderiam um dia usar a tecnologia de contabilidade distribuída incorporada no blockchain. Em sua opinião, isso simplificaria o processo e ao certificar o objeto usado para pagamento — um dos principais benefícios da tecnologia de contabilidade distribuída — "a transação pode ser feita, independente da confiança na bolsa ou contraparte". O relatório também disse que "tal mudança poderia também sugerir uma alteração na forma como o dinheiro é criado na era digital".
Embora no início deste ano, o BIS e o FMI anunciaram que pretendem colaborar mais estritamente para ajudar a fortalecer os conhecimentos e habilidades dos reguladores e supervisores financeiros, particularmente no contexto da implementação de reformas financeiras pós-crise e sobre questões emergentes como a “tecnologia financeira”, com base nas duas versões, poderia parecer que o FMI tem uma visão muito mais progressista sobre a influência e adoção de criptomoedas e o blockchain.
Refutar os argumentos ponto a ponto
Talvez a melhor maneira de lidar com o relatório do BIS seja simplesmente refutar seus argumentos principais ponto a ponto, disse Vladislav Dramaliev, chefe de marketing da aeternity, uma plataforma de blockchain 3.0. Quando isso for feito, a mensagem alarmista poderá ser mais facilmente abordada e resolvida.
Tem que levar em consideração cada um dos pontos críticos mencionados, como os hard forks, a concentração de mineração, a volatilidade, a escalabilidade e consumo de energia, e inclui:
“Assegurar um ecossistema monetário de várias centenas de bilhões, resistente a censura, aberto e transparente de forma descentralizada é sem dúvida uma causa digna e uma tarefa enorme. Mas vai colapsar a internet? Certamente que não. Tome como exemplo uma das preocupações do BIS, os hard forks, como exemplo, a própria natureza da criptomoeda gira em torno da confiança, com ou um hark fork— se a confiança for preservada — um hard fork terá vida curta breve".
Dramaliev também se concentra em uma das questões levantadas no relatório: a concentração de mineração. Em sua opinião, embora seja uma preocupação para todos os sistemas públicos de blockchain, qualquer pessoa que invista tempo, dinheiro e energia para atacar o bitcoin ou outra moeda digital poderia dedicar-se a usar esses recursos para seguir as regras e ganhar o pagamento pelo bloco.
A segurança que oferece o blockchain permanece inatacável, disse. Deve levar em conta que se um mineiro ou um grupo de mineradores ataca o sistema, só poderão mudar as transações futuras, explica Dramaliev. Recriar o histórico de transações significa repetir os blocos antigos e reconstruir o blockchain de um ponto no passado (no caso do bitcoin). Isso é muito caro e quase impossível de fazer.