Nos últimos anos estamos sempre nos deparando com a expressão “O Brasil é o celeiro do mundo”. Temos muito a celebrar e parabenizar um segmento da nossa economia que vem apresentando números impressionantes nos últimos anos, a despeito de todas as adversidades políticas, econômicas e sanitárias.
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O setor do agronegócio no Brasil consolidou-se como um dos mais eficientes do mundo graças ao significativo investimento em tecnologia no campo, modernização das empresas, ganhos de governança, melhores práticas ESG e, por fim, um melhor acesso a capital de terceiros.
Tudo indica que o agro deverá ampliar seu protagonismo. Um dos vetores para essa nova onda de crescimento será a disponibilidade de recursos mais adequados para o financiamento do setor. Investimento no campo exige uma enorme quantidade de capital e financiamento para garantir o planejamento, produção, colheita, armazenagem e escoamento.
A falta de acesso ao crédito de longo prazo por parte dos pequenos e médios produtores é um dos principais gargalos para que a expansão do agronegócio brasileiro seja ainda mais pujante, mas esta conjuntura vem mudando com a tendência de desintermediação bancária e o crescimento do mercado de capitais que, cada vez mais, passa a cumprir seu papel no Brasil como financiador do setor produtivo no longo prazo.
Neste sentido, o ano de 2021 pode se tornar um marco com a Lei nº 14.130, de 29 de março, que instituiu os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro). Na prática, os Fiagros são uma nova opção que traz uma perspectiva positiva para o setor com o incremento de capital, via mercado. Ele possibilita a criação de fundos de investimento com a junção de recursos de vários investidores para a aplicação em ativos da cadeia de negócios, sejam eles de natureza imobiliária rural ou de atividades relacionadas à produção do setor. É bastante abrangente e permite investimentos em direitos creditórios, imóveis, valores mobiliários, ações ou cotas de sociedades, conforme resolução CVM n°39.
Embora as primeiras ofertas tenham saído num momento especialmente turbulento, dificultando o acesso de tais fundos ao mercado, tudo leva a crer que os Fiagros tendem a se tornar cada vez mais uma importante opção para investidores em geral, principalmente considerando-se o benefício fiscal hoje existente.
Num primeiro momento houve confusão do investidor pela natural comparação com os FIIs (Fundos de Investimento Imobiliários) em um período que a maioria deles sofreu perdas no mercado secundário. De fato, a maioria dos Fiagros que foram ofertados usam uma regulamentação muito parecida com as dos FIIs de “papel”, mas não se pode perder de vista que os ativos investidos, bem como o benchmark da maioria deles, são diferentes.
Para os produtores, os Fiagros consistem em uma outra solução de crédito quando comparados com as linhas de custeio de bancos. São uma forma de o médio produtor acessar o mercado de capitais através de gestores profissionais. As grandes empresas já contavam com essa possibilidade, que ficou especialmente disponível a partir da desintermediação impulsionada por empresas corretoras que passaram a conectar os emissores diretamente com os investidores em geral através de emissões de CRA, CRI e debêntures incentivadas, porém, o médio produtor não.
A desintermediação bancária é um caminho sem volta, mas no Brasil o sistema bancário ainda é responsável por uma fatia significativa do crédito tomado pelas empresas. Em mercados desenvolvidos observa-se o oposto, contudo, nos últimos anos, já se verifica uma inversão dessa tendência. Vamos continuar observando esse movimento nos próximos anos, e a pergunta que ainda não conseguimos responder é: com que velocidade trilharemos esse caminho? Qual é a derivada?
A perspectiva é de que haja momentos em que a desintermediação acelere mais e depois suavize. E o momento atual é desafiador. Vivemos um cenário com uma pressão inflacionária mais longa do que o esperado – o que trouxe grande volatilidade no cenário de juros. Se a expectativa do mercado se concretizar, sairemos de juros de 2% ao ano para 12% ao ano, em menos de um ano. E a grande pergunta é se será suficiente para conter a inflação e a que custo para a atividade econômica.
Esse clima de incerteza e mudanças de expectativas impõem naturalmente um período de acomodação. Vivemos no ano passado um período de taxa de juros real negativa, na expectativa que o impacto na atividade fosse grande o suficiente para pagar esse custo.
Não bastassem todas as questões econômicas, 2022 nos impõe mais um desafio que é o nosso calendário político que, mesmo em momentos de calmaria, sempre traz reflexos para a atividade econômica.
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Em momentos de volatilidade, o investimento em Renda Fixa tende a ganhar espaço, e o papel do gestor profissional passa a ser fundamental para administrar o risco do portfólio dos clientes.
* André Ito é sócio da MAV Capital, uma gestora de recursos independente e especializada em créditos estruturados e ativos ilíquidos. Formado em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo, tem mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro. Além de sócio responsável pelo time de Structured Finance e DCM na XP Investimentos (SA:XPBR31), também atuou em Investment Banking no BTG Pactual e como superintendente comercial dos bancos Pine e Pan. Além disso foi sócio responsável pelo Corporate Desk do Banco BBM.