Um assunto recorrente das discussões de mercado nesses últimos dias tem sido a possibilidade de uma severa desaceleração na economia norte americana, a ponto de provocar uma recessão. Nesta sequência de dois textos, falaremos sobre os aspectos teóricos e práticos de uma recessão e o porquê desta discussão ganhar força recentemente. Este primeiro texto lida diretamente com os aspectos teóricos de uma recessão.
A economia tradicionalmente evolui em ciclos ao longo do tempo. Diversos atores contribuem para que ela se expanda ou contraia. Pelo lado da demanda, temos consumidores que compram bens e serviços, empresas que compram materiais para investimento, alugam espaço e um governo que demanda diversos produtos para poder fazer frente aos projetos que uma determinada sociedade julga relevante.
Já pelo lado da oferta, as famílias disponibilizam mão de obra (com diversos graus de qualificação) e as empresas oferecem seus produtos para compradores. Todos esses fatores em conjunto geram o famoso PIB. Ou, por outra, tudo aquilo que uma economia gera no tempo.
O PIB pode se expandir ou contrair a diversas taxas. Eventualmente, ele cresce de maneira muito acelerada e, em outros momentos, ele acaba em recessão. De forma geral, os economistas acreditam que exista uma taxa de PIB que é consistente com a meta de inflação do Banco Central e não gera desequilíbrios na economia que justifiquem aperto ou afrouxamento da política monetária. Assim, caso a economia cresça de acordo com esse número de equilíbrio, não haverá riscos de boom econômico ou recessão.
Porém, a economia não é um organismo absolutamente controlável. Fatores exógenos atuam constantemente para tirar o PIB de sua trajetória potencial. Por outra, existem ciclos em torno desse crescimento potencial que podem desestabilizar seriamente a economia dependendo do motivo que o gerou.
Como alguns exemplos recentes (desde a crise de 2008), podemos citar: excesso de crédito estendendo, choques de preços de commodities para cima ou para baixo, conflitos geopolíticos, eventos como eleições, covid-19 etc. Todos contribuem de alguma forma para desestabilizar o ciclo em torno de seu potencial.
Assim, quando a economia está crescendo acima do nível potencial, ela terminará por gerar pressões inflacionárias excessivas, algo extremamente nocivo (como a história brasileira bem demonstra). Para combater os excessos em ambas as direções, o Banco Central atua por meio de movimentos na taxa de política monetária.
A dificuldade está na defasagem da atuação da política monetária. A atuação hoje do Banco Central levará a movimentos na demanda agregada somente em cerca de três a seis trimestres, período durante o qual nada impede que novos choques impactem a economia agregada. Além disso, dependendo do grau de pressão inflacionária, o aperto monetário terá de ser significativo, provocando uma desaceleração que possivelmente resulta em recessão na economia.
Obviamente, o Banco Central não objetiva gerar recessões no tempo, mas sim uma desaceleração. A grande questão é o grau de engenharia necessário para tal em um ambiente, por definição, cheio de incógnitas.
Portanto, a tarefa da autoridade monetária é extremamente delicada e costuma gerar recessões. Dado o grau de aceleração inflacionária global neste momento, a chance de vermos um forte aperto dos juros que gere uma contração significativa e para além do desejado pelos Bancos Centrais é significativa. Portanto, isso eleva a chance de recessão em algumas economias na medida em que nos aproximamos de 2023.