Por Daniel Gregório e Suelen Salgo
No mercado doméstico, como não há uma padronização dos papéis, a questão da precificação pode ser o entrave para o desenvolvimento deste mercado. E, neste contexto, a solução pode estar exatamente na figura do agente de cálculo, criada pelo CMN na 5070.
O mercado de derivativos de crédito movimenta trilhões de dólares em todo o mundo. Em 2022, somente as operações com o chamado Credit Default Swap (CDS) envolveram cerca de US$ 30 trilhões. No Brasil, há alguns anos, os reguladores buscam incentivar o desenvolvimento deste mercado. O mais recente avanço foi a publicação da Resolução 5070 do Conselho Monetário Nacional, em abril deste ano, que representou um verdadeiro marco para o segmento. A normativa traz mais transparência e busca estabelecer alguns padrões, o que é essencial para aumentar a segurança neste tipo de operação. No entanto, alguns meses após a entrada em vigor da Resolução, o mercado ainda engatinha, com poucas operações concretizadas. O que realmente falta para trazer liquidez e desenvolver este mercado no Brasil?
Para tentar responder esta questão, o primeiro ponto é entendermos como funcionam alguns instrumentos de derivativos de crédito. Pela representatividade e montante envolvido, vamos pegar como exemplo os CDS. De forma simples, podemos dizer que um CDS é uma securitização contra o risco de inadimplência de uma empresa específica, na qual se paga um prêmio à entidade tomadora de risco. O prêmio a ser pago depende de uma análise da qualidade de crédito da entidade de referência. E a complexidade começa exatamente neste ponto.
Podemos elencar três principais parâmetros - ou indicadores - que devem ser considerados para a análise. São eles: spread de crédito; probabilidade de sobrevivência; e o chamado LGD (Loss given Default).
Podemos definir spread de crédito como a diferença entre a taxa de juros que a entidade de referência paga em seus títulos e a taxa de juros de um título comparável “sem risco”. Para essa comparação, primeiro precisamos de títulos com diferentes durations para determinarmos uma curva livre de risco. Em seguida, buscamos estimar o prêmio pago pela entidade de referência, ou seja, buscar estimar o quanto o retorno deste ativo está acima da curva livre de risco. Este prêmio está intrinsecamente vinculado a sua qualidade de crédito e é geralmente o preço cobrado pela securitização.
Já a probabilidade de sobrevivência (complementar à probabilidade de default) é uma medida que indica a probabilidade de a entidade de referência não entrar em inadimplência durante a vida do CDS. Essa probabilidade é um componente importante no cálculo do preço justo do CDS. É importante destacar que a estimativa da probabilidade de sobrevivência envolve incertezas do mercado e suposições. Além disso, diferentes modelos podem produzir resultados variados. A escolha do modelo adequado depende da disponibilidade de dados, das características da entidade de referência e das preferências do analista ou instituição que está realizando a análise.
Por fim, o LGD (Loss given Default) é uma estimativa da fração total do investimento que será efetivamente perdida em caso de default pela entidade de referência, já considerando custos. Possui uma correlação com a probabilidade de default e sua estimativa depende de um histórico de dados confiáveis.
Com os parâmetros acima, junto de informações sobre as exposições, é possível estimar o risco de crédito e possíveis perdas esperadas durante a vida do contrato. A qualidade dessas estimativas vai depender muito do quão bem ajustado o modelo está ao cenário e da confiabilidade dos dados.
No mercado doméstico, como não há uma padronização dos papéis, a questão da precificação pode ser o entrave para o desenvolvimento deste mercado. E, neste contexto, a solução pode estar exatamente na figura do agente de cálculo, criada pelo CMN na 5070.
Se o agente de cálculo assumir a responsabilidade por disseminar práticas para ajudar a melhorar a percepção de análise de risco e precificação destes instrumentos, o mercado como um todo pode ganhar o fator que faltava para o aumento da liquidez.
De um lado temos investidores com títulos de crédito buscando hedge e equilíbrio na carteira; do outro, precisamos ter os parâmetros de apreçamento bem definidos. Os agentes de cálculos precisam apresentar modelos robustos de análise das probabilidades de default, spread de crédito e LGD, oferecendo a credibilidade necessária para que as entidades sintam-se seguras em aumentar os volumes com este tipo de operação.
Já temos o arcabouço regulatório e referências internacionais de como estes instrumentos são importantes às instituições. Precisamos agora focar no agente de cálculo para concluir a criação de um ambiente propício para o aumento de liquidez. Com modelos bem definidos e transparência na informação, as operações com derivativos de crédito possuirão tudo o que precisam para alcançar o patamar que merecem - e que o mercado doméstico precisa.
*Suelen Salgo é CEO da LUZ Soluções Financeiras
*Daniel Gregório Chagas, analista de Pesquisa de Desenvolvimento da LUZ Soluções Financeiras