As famosas sereias, que tanto ocupam o imaginário infantil nos filmes da Disney (NYSE:DIS), têm sua origem nas histórias de personagens míticos, capazes de atrair e enfeitiçar viajantes que passavam próximos das ilhas onde elas moravam, para depois naufragarem seus navios e devorá-los.
Criaturas híbridas, com metade do corpo na forma de peixe e a outra metade na forma de mulher (originalmente, eram vistas como metade humanas, metade pássaros, na mitologia grega). A parte de cima, feminina, extremamente bela, com cabelos muito bonitos e bem cuidados. A voz aveludada, com um canto afinado e uma música que enebriava a tripulação das embarcações. O canto era irresistível, nunca se viu nada igual, e ninguém conseguia voltar depois de se deixar levar pelo feitiço.
Nos dias de hoje, quando falamos em nossa vida financeira, enfrentamos uma grande quantidade de sereias, que nos atormentam com seus cantos. Criaturas mitológicas que nos falam sobre coisas que seriam muito boas, se fossem verdadeiras. Mas não são. Por isso, mais mitológicos que as originais, são os vendedores de rentabilidades inatingíveis, por meio de produtos, ativos financeiros inadequados (ou inverossímeis), com uma argumentação recheada de palavrório difícil, destinados a deixar os pobres investidores perdidos - e dóceis para caírem na cilada.
As ofertas mostram ganhos estupendos, com apresentações magníficas, vídeos fartamente ilustrados e com imagens de pessoas poderosas, passeando em praias paradisíacas, em barcos luxuosos, tudo regado a champanhe. Outras imagens frequentes são de casas maravilhosas, com três ou quatro andares, com gramados perfeitos, mansões. O som é o de músicas animadas, perfeitamente alinhadas ao sucesso, com pessoas muito bem apresentadas e, em geral, mostrando os relógios mais caros que existem, carros possantes e caríssimos, usando as roupas da moda. Tem um pessoal que vai muito além e mostra montanhas de dinheiro na mão dos apresentadores, os gênios das finanças…
Pense nos últimos casos que apareceram na imprensa: o caso Braiscompany, com mais de 3.300 reclamações de clientes lesados, com prejuízo beirando a casa dos R$ 2 bilhões nos últimos 4 anos. A promessa que atraía os incautos era a garantia de rentabilidade mensal de 9% ao mês para o staking, isto é, aluguel de suas criptomoedas.
Outro caso que ganhou notoriedade foi o do “faraó dos bitcoins”, Glaidson dos Santos. A Polícia Federal e a CVM investigam saques de mais de R$ 1 bilhão pertencentes aos clientes para ocultação em contas particulares. Promessa de remuneração: 10% ao mês.
Além disso, a quebra da corretora de criptomoedas FTX no ano passado levou ao início de investigações criminais a seu ex-CEO, Sam Bankman-Fried, sendo denunciado por 13 crimes. O processo já acumula mais de 6 milhões de páginas de provas.
Temos, ainda, o recente caso da plataforma de cassino online Blaze, com mais de 5.700 reclamações de que o dinheiro ganho em apostas não poderia ser sacado e que o saldo das operações era alterado, com apenas 38 delas respondidas.
Todos eles vindos de vendedores muito bem apresentados, em roupas elegantes, apresentações em PowerPoint perfeitas… e principalmente, muita autoconfiança. Uma aura de certeza inabalável no seu produto que ninguém tem igual. Todos os outros são otários que não sabem ganhar dinheiro e você não pode ser otário como todos, diziam eles…
Taxas de rentabilidade de 5% ao mês. Mesmo em tempos de Selic a 13,75% ao ano - what a big deal! – oferta enganosa…
Essas sereias se aproveitam do cansaço e da ignorância dos marinheiros, digo, investidores. E quando falamos em ignorância, trata- se de ignorar o que precisa ser aprendido.
Veja que esses casos se repetem. Sempre teremos pessoas sem nenhum tipo de escrúpulos ou honestidade tentando se posicionar como bem-sucedidas, usando a falta de cuidado - aliada a uma certa ganância por altos rendimentos - para se darem bem.
Sabe como Ulisses se protegeu? Ele se amarrou ao mastro da embarcação e mandou sua tripulação tapar seus ouvidos com cera. Talvez a gente precise fazer o mesmo por aqui.