Recentemente, o Ministro da Economia Paulo Guedes mencionou que o “overshooting” no dólar havia passado e que agora estava havendo o ajuste, mas em termos efetivos esta não é uma realidade verdadeira, os números atestam isto.
O Real, nossa moeda, não deu causa para sua valorização e nem há fundamentos internos que sustentem a depreciação do preço do dólar no nosso mercado, que é efetivamente consequente da fragilização da moeda americana no mercado internacional, reflexo do ambiente de distensão e reformulação de expectativas a partir da eleição de Joe Biden para a Presidência dos Estados Unidos, agregado aos avanços no campo das vacinas contra o coronavírus que ganharam excepcional materialidade e afetaram positivamente as perspectivas globais.
Há enorme liquidez no mercado internacional prospectando oportunidades de rentabilidade, reduzindo substancialmente a aversão ao risco.
Sabidamente, a moeda americana fragilizou-se muito rápido frente às moedas emergentes, em especial as vinculadas a países produtores de commodities. Podemos até afirmar que a depreciação do dólar poderia ter sido maior, até o momento, não fosse os problemas, incertezas e a difícil situação fiscal do Brasil, que são fatores de contenção da tendência.
No campo das vacinas, naturalmente em algum momento seremos beneficiados, mas não tão rapidamente quanto precisávamos, visto que a convergência de esforços em nosso país é sempre difícil e há muito antagonismos.
Também, não é consequência do “intenso” fluxo de recursos externos direcionados para a Bovespa como se imagina numa leitura leiga.
Os estrangeiros direcionaram para a Bovespa no mês de novembro algo como R$ 33,3 Bi, digamos US$ 6,0 Bi, que é coincidentemente o saldo positivo do fluxo financeiro conhecido até 27 de novembro que ficou em US$ 5,985 Bi, que foi “consumido” por pagamentos comerciais que estavam empossados aguardando a queda do preço da moeda americana no montante de US$ 5,707 Bi, que levou o saldo efetivo do fluxo cambial líquido até 27 de novembro ser de tão somente US$ 278,0 mi, o que nem de longe tem capacidade para impor queda ao preço do dólar no nosso mercado.
O volume de US$ 6,0 Bi foi bom, mas não excepcional, visto que há muito tempo o Brasil estava fora do radar dos investidores internacionais, mas ao que têm sido observado estes recursos têm buscado as nossas “blue chips” ligados a segmentos consolidados, que não são muitas, o que é um fator limitante, e o quadro atual sugere cautela, inclusive com papéis do sistema financeiro, pois há riscos de inadimplência consequente do período de pandemia, assim como os do e-commerce que tendem a frágil sustentabilidade, na medida em que os programas assistenciais do governo apontem para o término.
Por ora, ainda prevalece o otimismo, mas é necessário, como já salientamos manter o otimismo com sensatez, pois este fluxo de investidores estrangeiros pode ter sido algo pontual pela oportunidade e não efetivamente como um retorno dos mesmos ao nosso mercado, até porque estamos no mês de dezembro, normalmente de apuração de resultados.
O Brasil, ainda que se procure contestar, está com o 2º ciclo da pandemia do coronavírus se instalando rapidamente, e isto pode ser fator altamente neutralizante aos indícios iniciais havidos de recuperação da atividade econômica, sabidamente, em grande parte, ancorada no incentivo ao consumo pelos programas assistenciais do governo que injetou R$ 250,0 Bi na economia, que provocou o surgimento de novos consumidores, que estão, até onde se tem noticias, com seus términos programados para o final deste mês.
Afora este problema grave na área sanitária, e também na área social, sabidamente, o Brasil está “travado” na dinamização das reformas fundamentais e programas de privatizações, o que o faz conviver com uma severa e neutralizante crise fiscal, que é fator extremamente limitante à sua gestão.
Neste mês o mercado de câmbio tem conhecimento do ajuste de posição dos bancos em operações de “overhedge” que montam em demanda de US$ 16,0 Bi, mas como se trata de fato conhecido, o BC já iniciou a mitigação do impacto com oferta suplementar diária de novos contratos de swap cambial, e, se necessário poderá vender dólares a vista das reservas cambiais brasileiras para equacionar este fato pontual.
Por outro lado, o Tesouro Nacional anunciou o retorno ao mercado internacional com a colocação de títulos nominados em dólares aos prazos de 5, 10 e 30 anos, o que será interessante para aferição do comportamento a respeito do Brasil, que neste momento tem o seu CDS em torno de 156 pontos para 5 anos, muito em razão do quadro fiscal, visto que o país é credor líquido em moeda estrangeira. A resultante será uma sinalização consistente de “apetite” do mercado internacional para as corporações brasileiras que tenham foco em captações externas.
Acreditamos, visto não haver mais a disponibilização deste dado, que haja um bom volume de importações “em ser” vincendas e com pagamentos atrasados, não atrelados a “hedge” devido à época o preço da moeda americana estar muito elevado e que tendem a ser liquidadas na medida em que o preço do dólar se mostrar atrativo e este fato pode dar sustentação ao preço no entorno de R$ 5,20, onde passaria a evidenciar resistência.
Por outro lado, ainda que a economia possa ter proporcionado menores dividendos devido à pandemia, acreditamos que poderá ocorrer incremento nas remessas de lucros e dividendos, primeiro como atitude defensiva ao risco de eventual tributação adiante e pelo fato da taxa cambial menos exacerbada permitir remessa maior de dólares na conversão.
Por enquanto, o dólar é que vem sofrendo depreciação sem que o real dê causa, mas em perspectiva podemos admitir que se o governo conseguir implementar ações mais efetivas focando as reformas imprescindíveis e equacionar o grave quadro fiscal, então o real poderá ter razões próprias para apreciar-se frente ao dólar e em 2021 o preço ficar entre R$ 4,50 a R$ 5,00, mas é fundamental que o nosso governo, juntamente com o Congresso, desenvolvam ações simétricas com foco no que efetivamente é fundamental para o país.