Em dia de bastante volatilidade, o Ibovespa fechou segunda-feira com queda inexpressiva de 0,08%. Apesar de quase nulo, o resultado negativo foi o quinto seguido - daí podemos entender os porquês dessa onda de revés que custou pouco mais de 6% do índice nos 5 pregões vermelhos e só terminou ontem, com alta de 1,76%.
Como todos vimos, semana passada rapidamente se tornou um pesadelo político. A reforma dos militares foi um indigesto acontecimento na quarta-feira. Na quinta, a prisão de Temer aumentou as incertezas sobre a reação do Congresso, enquanto Rodrigo Maia e Sérgio Moro aumentaram a troca de farpas e Carlos Bolsonaro - que parece não conseguir ficar longe dos traiçoeiros holofotes da egolatria - usava as redes sociais para criticar o presidente da Câmara.
Para coroar, na sexta-feira deu-se início a um embate entre Rodrigo Maia, irritado com a quantidade de críticas vindas do governo, e Bolsonaro. O motivo: um jogo de empurra para definir de quem é a responsabilidade de angariar votos na Câmara dos Deputados. Nas entrelinhas, um claro atrito entre Legislativo e Executivo; de condução política.
O presidente da Câmara não pretende tomar o ônus da articulação política somente para si, enquanto Bolsonaro evita o caminho da política tradicional, assim como não deixa Maia vencer a queda de braço.
A discussão se estendeu para o fim de semana. Na sexta-feira, o democrata ameaçou largar a reforma previdenciária. Nas suas palavras, ele irá fazer a “nova política”: não fazer nada e esperar por aplausos das redes sociais. No sábado, Maia declarou que o governo é um deserto de ideias. Bolsonaro rebateu e acusou Maia de estar sendo muito agressivo em suas declarações. Terminou reafirmando que manterá suas críticas ao “toma lá dá cá”.
Bolsonaro ainda vem lutando para aprimorar a articulação política e “apagar” os pequenos focos de incêndio que apareceram nas últimas semanas. O novo fogo, de maior magnitude, estava retirando o foco da agenda que deveria estar sendo levada para frente com o máximo de celeridade possível.
Tanto que todos agiram para reduzir os danos. O presidente da Câmara afirmou que a reforma deve seguir independente da situação do governo. Da mesma forma, o presidente da República reiterou seu compromisso com a medida. A paz foi restaurada. Reuniões de Guedes, militares e ministros parecem ter atenuado os ânimos e injetado uma boa dose de pragmatismo nos envolvidos. Nos bastidores, entretanto, o clima segue bastante tenso. Como dizem por aí: por fora bela viola, por dentro pão bolorento.
Vejamos os riscos do mais recente imbróglio. Primeiro, não é exagero ressaltar a importância do presidente da Câmara. Ele é um grande negociador e conhece como poucos o jogo político na Câmara dos Deputados. Indo direto ao ponto, se Maia efetivamente jogar a toalha podemos rever as probabilidades de aprovação da reforma.
Em segundo lugar, é aconselhável que Bolsonaro e seu núcleo mais “ideológico” reconheça que governar sem acordos é utopia. Associar presidencialismo de coalizão à corrupção, como diz o próprio criador do termo - o cientista político Sérgio Abranches - é um mito. Não preciso dizer que o presidente está desconfortável com a situação. Claro, ele terá de contrariar seu discurso de campanha e eventualmente perder apoio de alguns eleitores em tempos de queda de sua popularidade.
Por último, mas não menos importante (não mesmo), temos de lembrar do que esquecemos com toda a confusão entre presidentes dos dois poderes: a reforma dos militares desagradou muitos no Congresso, até mesmo deputados do próprio PSL; e estamos atrasados no cronograma previsto para a tramitação da reforma da Previdência na CCJ.
Corremos, portanto, contra o relógio e, por consequência, contra a popularidade do presidente Bolsonaro. Logicamente, quanto mais demorado o processo, pior para a economia, para a política, para o governo, para a sociedade como um todo. Em resumo, ainda temos um cenário positivo para a Previdência, mas motivado mais por inércia do que por novos insumos - os motores encontram-se desligados.
Por um lado, o ápice da crise já é passado. Ontem, o Ibovespa subiu perto de 1,8%, apesar de Guedes não ter comparecido à CCJ – outro erro de estratégia do governo, ao criar expectativas sobre o comparecimento do ministro. Por outro, o episódio do fim de semana praticamente confirma que a reforma da Previdência deve ser aprovada com bastante emoção, trazendo volatilidade para o mercado. Inicialmente, as condições eram muito mais favoráveis. Agora, as crises geradas pelo próprio governo dificultam o caminho.
O governo se mostra amador ao tentar rifar aliados. Põe em xeque a crença e vontade de Bolsonaro de realmente aprovar a reforma. O presidente, aparentemente, não acredita no fracasso de seu governo caso o projeto não seja aprovado.
Não custa lembrar: quem o convenceu foi Paulo Guedes, o mesmo que agora é apontado como a melhor opção para encabeçar a agenda da reforma. Apesar dos pesares, o cenário-base ainda é de aprovação de uma reforma da Previdência, seja ela a de Bolsonaro ou, pasmem, a de Temer - como já começam a falar por aí.