Recentemente, li uma matéria muito interessante do The Wall Street Journal abordando alguns números sobre as famosas recompras de ações. No artigo de hoje, resolvi abordar este polêmico tema que vem levantando uma série de discussões a respeito de seu real benefício para a economia.
Antes de começarmos, é necessário dar um passo para trás e explicar alguns conceitos básicos do mercado financeiro.
Os acionistas de uma empresa podem ser remunerados de duas formas diferentes: via pagamento de dividendos ou recompra de ações.
A primeira forma é mais conhecida pelos investidores. As empresas brasileiras são obrigadas, por lei, a distribuírem dividendos a cada exercício. Dividendos nada mais são do que uma parcela do lucro líquido apurado pela empresa que é destinada aos seus sócios.
Dessa forma, se você possui 1% das ações de uma empresa que paga R$ 100 ao ano na forma de dividendos, você tem o direito de receber RS 1 ao ano.
A segunda forma de remuneração possível não é muito compreendida pela maioria dos investidores, que não entendem seu funcionamento e nem as suas consequências.
Como o próprio nome diz, as empresas recompram as ações de seus acionistas a fim de custodiá-las em tesouraria ou tirá-las de circulação do mercado, resultando em menos ações negociadas, e, portanto, aumentando a participação dos acionistas existentes.
Dessa forma, investidores esperam que a companhia em que investem somente recompre suas ações quando acreditar que estão sendo negociadas abaixo de seu valor intrínseco. Caso contrário, não há valor criado.
Essas movimentações financeiras alteram algumas métricas, como o Lucro Por Ação (LPA), já que o denominador diminui, enquanto o numerador permanece intacto. Sendo assim, um investidor que analisa cegamente o LPA pode se precipitar acreditando que a empresa passou a lucrar mais quando, na verdade, não foi o que ocorreu.
Essa estratégia tem gerado muita polêmica, uma vez que muitos analistas afirmam que, na última década, as recompras impulsionaram mais a valorização das ações americanas do que o valor efetivamente criado.
O gráfico abaixo mostra o tamanho dessas movimentações econômicas. Para se ter uma ideia da dimensão, as empresas do S&P 500 gastaram cerca de US$ 5,3 trilhões recomprando suas próprias ações desde 2010. O recorde foi atingido no quarto trimestre de 2018, no qual foram gastos US$ 223 bilhões.
Como podemos ver pelo outro gráfico abaixo, o fenômeno das recompras foi intensificado com o corte dos impostos protagonizados pelo presidente Donald Trump em 2017. Isso aumentou a liquidez das empresas, que passaram a ter mais caixa à disposição para gastarem da forma que acharem melhor.
É justamente aí que está o problema.
Sabemos que o papel principal de uma empresa é gerar valor ao seu acionista. De um lado, há aqueles que acreditam que as recompras são positivas pois cumprem esse papel, já que botam dinheiro no bolso dos mesmos.
Do outro lado, há quem diga que o dinheiro gasto em recompras seria melhor alocado em outras oportunidades, como em novas fábricas, mercados, oportunidades, fusões ou aquisições, pesquisa e desenvolvimento, equipamentos, prédios, tecnologia etc.
Ou seja, em investimentos que gerariam algum retorno para a sociedade - como novos empregos, inovações e redução de preços – ou em maiores retornos para o acionista.
Além disso, estes analistas também acreditam que, ao fazer as recompras, as empresas se privam de liquidez que poderia ajudá-las a lidar em momentos de quedas de vendas, lucros ou recessões econômicas.
Nos últimos 10 anos, as 20 principais empresas do S&P recompraram cerca de US$ 1.3 trilhões de ações. As que mais remuneraram seus acionistas com essa estratégia foram a Apple (NASDAQ:AAPL), Microsoft (NASDAQ:MSFT), Oracle (NYSE:ORCL), JPMorgan (NYSE:JPM) e Wells Fargo (NYSE:WFC), e eu fico muito contente de ser acionista de duas delas!
E qual minha opinião sobre o assunto?
Acredito que as recompras geram sim valor ao acionista se i) realizadas quando o preço da ação estiver substancialmente abaixo de seu valor intrínseco; ii) não houver outros investimentos a serem feitos com uma melhor taxa de retorno; iii) não comprometa a saúde do caixa da empresa ou sua estrutura de capital.
E você? Qual a sua opinião?