David Hume dizia que a razão só pode ser escrava das paixões, portanto, abster-se da nossa paixão pelas empresas que nos trouxeram bons lucros e fazer uma análise racional do caso é uma tarefa difícil. Afinal, qual acionista de IRB Brasil não é apaixonado por ela?
O ano era 2017. Naquele dia fatídico do mês de maio, uma notícia veiculada fazia a bolsa de valores brasileira despencar ao ponto de causar um circuit breaker. O dólar subia 8%. Curiosamente, os responsáveis pela notícia eram um dos poucos que lucravam com isso.
Quando os irmãos Batista fizeram a delação premiada que causaria pânico no mercado financeiro, eles já tinham suas posições montadas para desfrutar dessa agitação.
Vendendo ações da própria companhia antes da revelação do conteúdo da deleção, a economia foi de R$ 138 milhões. Com a compra de dólar no mercado futuro, com liquidação para poucos dias após a divulgação, o lucro foi de R$ 100 milhões. Movimento genial, se não fosse crime.
O ano é 2020. A gestora Squadra monta uma posição vendida (lucra quando o preço da ação cai) em IRB Brasil. Após posição montada, divulga dois relatórios que apontam indícios de manipulação contábeis da companhia. Em apenas uma semana, a ação chegou a despencar quase 30%.
Quem assistiu o documentário Bet on Zero, na Netflix, sabe que essa prática é um tanto comum nos EUA. Operar vendido e lucrar com a própria divulgação de informações capazes de influenciar o mercado ao seu favor, no curto prazo, acaba sendo uma atitude controversa.
Porém, Aristóteles já dizia que o ignorante afirma, o sábio duvida, e o sensato reflete; por isso, seguindo essa dica, vamos imaginar que um swing trader, com todas as informações disponíveis, enxerga uma oportunidade de compra em IRB Brasil, montando sua posição compradora. Outro player no mercado, tendo uma informação privilegiada, e sendo ainda o divulgador desse conteúdo, tendo, portanto, o poder, mesmo que de curto prazo, de causar forte oscilação ao seu favor, monta posição contrária.
Na abertura do mercado, o gap da ação em questão é tão grande, que faz do stop loss de qualquer trader tão ineficiente quanto garfo sem dentes. O prejuízo para um dos lados é enorme. O lucro, para o outro, era certeiro e com pouco risco.
A IRB afirma que a Squadra, sendo uma gestora de recurso e não uma casa de análise, não poderia publicar análises de investimentos. A CVM informou que já abriu três processos administrativos desse caso.
Mesmo que a frase popular “pode ser legal, mas é imoral” venha à nossa mente, devemos compreender que o mercado também oferece esse tipo de risco, e estar preparado para o pior, ainda pode ser a melhor opção.
Entretanto, para investidores de longo prazo, tal prática não possui grande influência. Inclusive, na maioria das vezes, oportunidades de compra de ativos descontados aparecem em momentos como esse.