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O Coronavírus é um “Cisne Negro” no Mercado de Petróleo?

Publicado 24.01.2020, 10:55
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Ser o primeiro a prever algo é um privilégio, principalmente se você estiver certo.

Quando Olivier Jakob, analista da consultoria suíça de risco em petróleo PetroMatrix, chamou de “Cisne Negro de 2020” o medo causado pelo novo coronavírus ao redor do mundo, acabou gerando mais do que um ar de descrença nos mercados de petróleo. Os operadores se perguntaram se o mais recente perigo à saúde mundial merecia esse rótulo, quando ainda se sabia muito pouco sobre ele.

Entre os “Cisnes Negros” do passado se destacam a crise financeira asiática de 1997, o crash das empresas “ponto com" em 2000, os ataques de 2001 aos EUA, a crise financeira mundial de 2008, a crise da dívida soberana na Europa em 2009, a derrocada do mercado de petróleo em 2014 e o Brexit em 2016. Não temos certeza se o coronavírus se tornará de fato uma crise com essas proporções.

Por isso, antes do fim de quinta-feira, pelo menos dois veículos de imprensa – o Financial Times, em Londres, e o The Globe and Mail, em Toronto – fizeram uma análise aprofundada da nota que Jakob emitiu durante o horário comercial europeu naquele dia, na qual expressou seus receios com o vírus identificado como 2019-nCoV.

Você provavelmente está lendo a terceira análise da série, depois que eu decidi apenas citar a nota de Jakob brevemente em meu artigo sobre o petróleo na quinta-feira para o Investing.com, deixando para depois uma reflexão mais detida sobre o tema – o que estou fazendo agora.

“O ano de 2020 está começando com um ‘Cisne Negro’ na forma do coronavírus”, escreveu Jakob, que ingressou na PetroMatrix há 14 anos, depois de atuar em empresas como a petrolífera russa Lukoil e o grupo norte-americano de commodities Cargill, em diferentes funções, como trader e gerente de risco.

Coronavírus: uma incerteza da qual os gestores de risco “não gostam"

“Um evento do tipo ‘cisne negro’ é imprevisível e ultrapassa o que normalmente se espera de uma situação, podendo ter consequências graves”, continuou Jakob. “É um evento do qual os gestores de risco não gostam.”

Ele afirmou que o possível impacto do 2019-nCoV no petróleo – após 18 mortes, mais de 600 pessoas infectadas e o isolamento da cidade de Wuhan de 11 milhões de habitantes na China – já superou os efeitos das restrições de oferta de petróleo nesta semana por causa da Líbia e da interrupção provocada por ataques a instalações sauditas em setembro.

“Os últimos eventos envolvendo a oferta na Arábia Saudita e na Líbia não são considerados ‘cisnes negros’, pois já incluem certa antecipação de risco de mercado”, escreveu Jakob, que disse ainda:

“Os distúrbios na oferta ocorridos na Líbia estão longe de ser uma surpresa e, por isso, as manchetes sobre o caso tiveram um impacto marginal no mercado. O efeito desses distúrbios de oferta na Líbia sobre os preços ocorrerá através do mercado físico, e não pela tela".

“Surpresa total”, ainda sem avaliação concreta dos danos

“O coronavírus, por outro lado, foi uma surpresa total. Ele tem um grande potencial de dano, mas ninguém consegue ainda dimensioná-lo devidamente”.

Em uma nota na terça-feira, o Goldman Sachs antecipou um choque negativo de 260.000 barris por dia (bpd) em média na demanda mundial, incluindo uma perda de 170.000 bpd de demanda de combustível de aviação, por causa do 2019-nCoV. Sua análise se baseia na comparação com a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS, na sigla em inglês) de 2003, que mexeu com os mercados mundiais, incluindo o petróleo.

Jakob reconheceu a relevância de comparar o coronavírus com a SARS, que também teve origem na China. Mas Pequim é mais importante para a economia mundial agora do que em 2003, e o aumento da capacidade de refino na China causará um grande estresse na indústria energética e, consequentemente, na demanda mundial, caso a demanda interna caia, afirmou.

Demanda de combustível de aviação em questão

Em condições normais, a demanda de combustível de aviação já levantava dúvidas no segundo trimestre do ano, ele afirmou, referindo-se à perspectiva do Goldman Sachs.

“O coronavírus pode debilitar as margens das refinarias, exercendo impacto negativo nos contratos futuros de Brent. O coronavírus é o retorno da avaliação de risco dos 'velhos tempos' nos mercados de petróleo", escreveu Jakob.

Apesar de o avanço da tecnologia ter permitido uma avaliação dos transtornos de oferta em menos de 24 horas, “imagens de satélite não ajudam em nada a determinar a gravidade do coronavírus, o que abre espaço para o mercado especular sobre seu impacto – da mesma forma que os eventos de oferta geravam grandes especulações quando havia menos tecnologia", concluiu.

David Sheppard, colunista de energia do Financial Times, concorda com a teoria de Jakob.

“Venda agora e se preocupe depois”

Sheppard afirma que, enquanto os investidores não souberem qual é o real impacto do coronavírus, o mais seguro a fazer diante da falta de força do mercado após os distúrbios de oferta na Líbia é “vender agora e se preocupar com o resultado final depois”.

Os preços do petróleo atingiram as mínimas de nove meses na quinta-feira, com o petróleo norte-americano caindo 9% no ano, enquanto o Brent, referência mundial, afundou 6%.

WTI semanal

Sheppard citou a pesquisa realizada pela Energy Aspects, de Londres, que indica que a demanda de combustível de aviação não cairá drasticamente no segundo trimestre, argumentando que a maioria dos voos deve prosseguir, ainda que com menos passageiros.

“Mas, dependendo da maneira como as empresas aéreas se protegem da exposição ao combustível, os problemas no setor podem ter uma influência muito maior nos preços do petróleo, se os compradores forem forçados a desfazer várias operações", declarou Sheppard. “Os investidores estão certos em ter cautela”.

Prever os preços do petróleo: “um jogo sem sentido”

Eric Reguly, chefe da sucursal europeia do periódico The Globe and Mail, afirmou que tentar prever os preços do petróleo “sempre foi um jogo sem sentido”.

“E apostar certo no mercado de hoje tem sido extremamente difícil, para não dizer impossível, por causa da chegada de um temido 'Cisne Negro'".

Ele citou que o escritório de advocacia Haynes and Boone, do Texas, entrou com pedidos de falência de 50 empresas de energia dos EUA, em sua maioria produtoras de óleo e gás e prestadoras de serviços petrolíferos, nos primeiros nove meses de 2019.

“Como os investidores do setor de petróleo e energia vão se proteger do pesadelo do coronavírus?” Perguntou Reguly. “Na verdade, não podem, pela simples razão de que ‘Cisnes Negros’ não seguem qualquer regra”.

Do meu ponto de vista, acho difícil dizer se é prematura a caracterização do coronavírus como Cisne Negro por Jakob. Há apenas duas semanas, Dave Ernsberger, diretor global de commodities da S&P Global Platts, chamou de "Cisne Negro” os transtornos envolvendo navios petroleiros no Estreito de Ormuz, após uma breve escala nas tensões entre EUA e Irã.

Todos sabemos que não foi assim.

Medo gera mais medo

Mas, ao contrário de Sheppard, concordo que o medo gera mais medo.

Mesmo que a desaceleração nas negociações de petróleo por causa do 2019-nCoV possa ser contida, o ímpeto para encerrar posições de compra pode causar danos maiores e mais duradouros à demanda e aos preços do petróleo.

Tudo acabará como no crash de 2014?

Teremos que esperar para ver.

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