Por Rodrigo Augusto Prando e Paulo Dutra Costantin
Após praticamente uma semana de férias, com natação no litoral paulista e alegres pescarias, o presidente Jair Bolsonaro voltou a Brasília e, como de costume, fez aquilo que foi predominante na primeira metade do seu mandato: chamou a atenção da mídia e da sociedade, pautando as discussões e análises oriundas de suas declarações e ações.
Assim, desta feita, Bolsonaro afirmou, a apoiadores, o seguinte: "Chefe, o Brasil está quebrado, chefe. Eu não consigo fazer nada. Eu queria mexer na tabela do Imposto de Renda, teve esse vírus potencializado pela mídia que nós temos". Há, nesta fala presidencial, duas dimensões a serem exploradas: a econômica e a política. Vejamos.
Economicamente, o que o mercado financeiro entendeu? Temos duas hipóteses. A primeira, considerando que o presidente acredita que é verdade o que disse, o mercado financeiro desconsiderou mais uma de suas bravatas, pois o índice Bovespa fechou no dia 05 de janeiro, em alta de 0,44% a 119.376 pontos e o dólar comercial em queda de 0,16% a R﹩ 5,2603. A segunda hipótese, é a de que o presidente possui noção de que, para tentar se reeleger, deve atribuir a culpa de ter que realizar ações impopulares como o não reajuste das alíquotas da tabela do imposto de renda, a não continuidade do programa de auxílio emergencial e a realização das reformas administrativa e fiscal à imprensa e à pandemia do coronavírus. O mercado, portanto, pode ter percebido desta forma e mantido as expectativas com relação à trajetória de crescimento da economia em 2021, sem atribuir credibilidade à afirmação do presidente.
Politicamente, as reações, especialmente dos adversários e insatisfeitos com o governo, foram lépidas. "Se não consegue fazer nada, renuncie, oras!". Até podemos imaginar, na distante hipótese, o Vice-Presidente, General Mourão, no aquecimento.
No mais, a atitude de Bolsonaro é, dentro da lógica do presidencialismo de confrontação, atribuir culpa aos inimigos - a mídia sempre nas primeiras posições - e se eximir das responsabilidades atinentes ao importante e fundamental ato de governar. É certo que, exogenamente, a pandemia gerou crises econômicas em graus distintos no mundo, cada país, com sua situação histórica e estrutural, reagiu e equacionou esse problema conjuntural pandêmico.
No entanto, há, também, um fator endógeno, que é a desastrosa condução política por parte do governo em relação à pandemia seja no que tange à vacinação e aos aspectos de retomada da normalidade nos diversos campos da sociedade brasileira. Bolsonaro, em atitude de menoscabo em relação ao coronavírus, com mistos de negacionismo e pós-verdades, acabou perdendo o protagonismo político e o vácuo de poder foi ocupado por governadores e prefeitos que, em resposta à crise, distanciaram-se das posições do Planalto e de um combalido e desbussolado Ministério da Saúde. Dos alicerces principais prometidos pelo bolsonarismo, na campanha e início do mandato: combate à corrupção, simbolizado na figura de Sérgio Moro; e, ainda, do liberalismo, afiançado por Paulo Guedes, pouco sobrou nestes dois anos de mandato.
Bolsonaro deseja, portanto, construir uma narrativa objetivando defender-se de seus críticos, especialmente, com vistas à reeleição em 2022, pelo fato de, até aqui, não ter conseguido cumprir suas promessas de campanha e ter uma marca para apresentar como sua (FHC teve o Plano Real e Lula, o Bolsa Família). Não houve reformas, não houve privatizações, meio ambiente sob ataque, pandemia descontrolada, imagem do país no exterior alquebrada, enfim, o conjunto da obra não é positivo para o presidente e sua estratégia de confrontação.
O Brasil, garantem os especialistas, não está quebrado. Tampouco a situação é confortável. O problema econômico e político existe aqui e alhures e deve ser compreendido à luz da necessidade de liderança, diálogo democrático e planejamento estratégico. O desafio está posto. O governo dará conta dele?