Novembro quase foi um mês de esperanças. A recuperação da economia dos Estados Unidos e a aprovação da PEC dos Precatórios – que permitiu, de certa forma, evitar o furo do teto de gastos –, chegaram a animar os investidores. Mas a descoberta da variante Ômicron do coronavírus balançou o mundo e derrubou os mercados diante de seu alastramento e da falta de informações sobre contágio e eficácia das vacinas.
Mas como a PEC dos Precatórios passou de ameaça fiscal a fator positivo na visão do mercado? Modificações importantes foram incorporadas ao texto, como um destaque que impede a flexibilização da “Regra de Ouro”, não permitindo que o governo assuma dívidas sobre despesas recorrentes sem o aval do Legislativo.
No entanto, outras pedras no caminho da economia brasileira evidenciaram a gravidade do cenário no país. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou alta de 7,5% em 2021 e a maior variação para outubro em quase 20 anos. O PIB, divulgado nesta quinta-feira (02), colocou o Brasil em recessão técnica: no terceiro trimestre, a economia encolheu 0,1%, a segunda queda consecutiva.
As estimativas oficiais para este ano já haviam piorado, com o Ministério da Economia esperando um crescimento do PIB de 5,1% (ante 5,3% anteriormente) para 2021 e de 2,1% (contra 2,5%) para 2022. Quanto à inflação, a previsão de 7,9% para este ano subiu para 9,5%.
O conjunto de más notícias macroeconômicas acertou em cheio o varejo, setor mais sensível a essas condições e cujas empresas sofreram quedas expressivas na bolsa. Por outro lado, o leilão do 5G, que movimentou R$ 46,7 bilhões, impulsionou as ações das empresas de telecomunicações.
Lá fora, o presidente do Federal Reserve System (FED), Jerome Powell, afirmou que as medidas de incentivo à economia americana devem continuar, mas podem terminar antes do previsto – mesmo considerando o risco da nova cepa do coronavírus. O fim do chamado tapering significa a retirada de US$ 15 bilhões em estímulos por mês. Até então, a autoridade monetária comprava US$ 120 bilhões mensalmente para injetar liquidez na economia.
Esse mecanismo contribui para elevar a inflação, que tem sido persistente no país e alcançou 6,2% em outubro, o maior nível em 30 anos. Problema semelhante também se observa na China, onde os preços ao produtor tiveram alta mensal de 13,5% em outubro, e na Alemanha, maior economia da Europa, que viu sua inflação ao consumidor atingir 4,5%, maior patamar desde 1993.
A Europa, aliás, também sofre com um novo crescimento dos números de casos e mortes por Covid-19, causado por uma recusa coletiva à vacinação. Como resposta, novas determinações de fechamento e lockdown têm sido impostas, como na Áustria.
Porém, nem tudo são cumulonimbus nos céus globais (ainda que essas nuvens sejam muito bem vindas em um contexto de crise hídrica no Brasil e têm amenizado a situação crítica dos reservatórios). A temida derrocada do conglomerado Evergrande (HK:3333) teve seus efeitos controlados pela China, que conseguiu praticamente anular o risco de calote da gigante da construção.
E 2022?
Já sabemos que, com a inflação nas alturas e os juros levantando voo, as aplicações em renda fixa tendem a se tornar mais atraentes. E não é só aqui: em novembro, as expectativas de mercado em relação aos juros de 5 anos nos EUA superou 1,3% ao ano, alta relevante se comparado ao 0,7% ao ano em julho. No Brasil, há de se ter atenção à próxima reunião do Copom marcada para hoje. Ao que tudo indica, haverá uma nova elevação na taxa Selic, atualmente em 7,75% e que deve chegar a 11% no próximo ano.
Na renda variável, três fatores podem beneficiar o investimento. As commodities devem continuar oferecendo bons retornos com o dólar mais alto, enquanto algumas empresas que conseguem se proteger do cenário macro tendem a se sair melhor em meio à turbulência. Além disso, o prêmio de risco para as ações do Ibovespa está favorável, em 7,8% e capaz de competir com os juros altos.
O mês de dezembro e o início de 2022 serão fundamentais para traçarmos um panorama mais assertivo da economia global. O fator Ômicron será determinante em qualquer cenário: uma nova onda de fechamentos pode desacelerar a retomada? Qual o impacto da variante em países com alta adesão à vacinação, como o Brasil? Medidas de estímulo às economias seguirão sendo suspensas? Ou o impacto será menor do que o temido e seguiremos na atual trajetória, apenas com um pequeno percalço? Conte comigo para trazer novas informações por aqui e fique ligado.
*Rodrigo Sodré, economista e sócio da BRA