O FED americano não elevou o juro, mas o mercado americano o está precificando com base na expectativa de inflação nos Estados Unidos, consequente da liquidez que será promovida com o pacote de US$ 1,9 Tri, e com isto o mercado de Treasuries ganha atratividade global e promove deslocamento forte dos investimentos que estavam nos países emergentes para o mercado americano.
Consequência natural dada a procura pelo dólar é a sua valorização perante as demais, em especial as emergentes, com destaque para a lira turca, real e rand sul africano. A Turquia tem expressivo déficit em conta corrente, e Brasil e África do Sul tiveram forte expansão da crise fiscal em 2020, revelando forte dependência de financiamentos em 2021.
Enfim, com este cenário americano fortalecido, os mercados emergentes e suas moedas ficam vulneráveis, e o refluxo dos investimentos estrangeiros locados nestes mercados provoca forte venda das moedas locais na busca do dólar para retirada em direção ao mercado americano.
O Brasil tende a ter acentuado efeitos deste ambiente, visto que a economia dá sinais somente amenos de recuperação, mas tem fundamentalmente a política monetária retardatária no trato do quesito juro e enorme risco de agravamento maior da já caótica situação fiscal, visto que convive com o pior momento da pandemia do coronavírus e tem necessidade de reestabelecer o programa assistencial às populações carentes, sem que tenha fontes de financiamentos.
Ocorre que os problemas brasileiros no curto/médio prazos são relevantes e de grande impacto na dinâmica do país, enquanto que soluções somente seriam viáveis a longo prazo, com a efetiva aprovação das reformas tributárias e administrativas e, em especial, as privatizações.
Este “gap” temporal é praticamente incontornável, mas revela que o país está muito atrasado nas medidas que deveriam ter sido tomadas ao longo dos últimos 2 anos e que somente agora são postas em pauta pelo governo, com perspectivas mínimas de aprovações em não menos do que 1 ano.
Pontifica neste momento, de forma incontestável, a consequência da inércia e o retardamento das medidas de política monetária proativas, que foram postergadas sob as mais diversas justificativas, que contudo, não ganharam fundamentos, inclusive quanto a visão sobre a inflação, referida como temporária e que se revela voraz e permanente.
A visão complacente sob um quadro prospectivo notoriamente perverso do COPOM/BC vai levar o país a “pagar um preço” elevadíssimo, que pode emitir sinais amplamente negativos já neste 1º trimestre e até propagar-se para uma visão total sobre o ano de 2021.
Este cenário pode provocar retrocesso e comprometimento nos discretos avanços alcançados na retomada da atividade econômica, e, impor ao COPOM/BC a absoluta necessidade de um ajuste mais forte e abrupto na taxa de juro SELIC, para buscar tecnicamente atenuar as pressões de depreciação do real.
Se algo assim não for feito, o preço do dólar permanecerá sobre pressão e volátil e não tende a ser atenuada com as eventuais intervenções do BC com ofertas de dólares à vista ou no mercado futuro com contratos de swaps cambiais novos, e isto será extremamente nefasto em razão dos impactos nos preços dos combustíveis, já que 70% do modal de transportes no Brasil é rodoviário, e mais afetará de forma contundente o preço das commodities exportáveis no mercado interno, e no conjunto propagando explosiva pressão inflacionária interna de imediato nos preços da cadeia produtiva.
Por outro lado, o cenário poderá ser desalentador para a Bovespa e para os projetos de IPO´s em andamento, que repercutirá somente os efeitos da alta das commodities nas ações de empresas do segmento, mas a diversidade tende a ser prejudicada pelo recuo do investidor estrangeiro.
Os estragos do fortalecimento do preço do dólar no nosso mercado tendem a ser expressivos, num momento em que o país enfrenta a pior situação da pandemia do coronavírus que afetam de forma altamente preocupante as suas perspectivas.
Há muito que se observar, mas o viés é bastante preocupante, com o risco do que está ruim ficar pior.