Muito se fala nos dias atuais sobre o ESG, sigla em inglês que significa Ambiental, Social e Governança. Aliás, mais do que falar, o conceito tem sido cada vez mais adotado pelas grandes corporações como forma de mitigar impactos de suas atividades na sociedade e no meio ambiente, com base em uma gestão responsável e transparente. Tanto que hoje, um bom modelo de governança é implementado dentro dos padrões ESG.
Mas implantar um modelo de governança nessas diretrizes é difícil por duas razões. A primeira está na própria cultura da empresa que precisa ser totalmente mudada para ser verdadeiramente ESG. E isso envolve tudo e todos. Do time de serviços gerais ao presidente, quando se trata de pessoas, e do setor administrativo à linha de produção, passando por todos os departamentos, quando se trata dos processos ali existentes.
Há uma segunda questão, porém, que é mais complicada. Como implantar um modelo de governança nos padrões ESG, se ainda falta uma métrica global para o referido padrão? O que se tem claro é o conceito, que envolve práticas para reduzir níveis de emissões de poluentes, que contribuam para o desenvolvimento e bem-estar social, que evitem práticas em desacordo com a legislação e por aí vai. E tudo tem de ser sustentável. Não podem ser ações meramente pontuais.
De fato, regras existem, mas não uma unificação de protocolos que possibilite às empresas caminharem na mesma direção quando o assunto é ESG. Como avaliar e mensurar a aderência dos diversos fatores que cercam a sustentabilidade se ainda não existe um conjunto de informações que sirva de regra? Baseado em que um gestor acredita que determinada decisão vai gerar este ou aquele resultado? Qual a base de comparação? Qual a credibilidade dos dados usados para a implantação do modelo? Quais aspectos culturais estão sendo levados em conta? O plano se preocupa com a inclusão de pessoas?
É possível que a União Europeia conclua, até o final do ano, a redação de uma regulamentação (Regulation 2020/852 of the European Parliament and of the council) com métricas a serem utilizadas pelas empresas. Isso será bom porque dará a companhias, investidores e mesmo ao poder público as bases necessárias para avaliações. No entanto, temos de ter em mente que tais regras serão baseadas na realidade europeia. Será que elas poderão ser adotadas em sua plenitude por empresas americanas, japonesas ou brasileiras?
Certamente, boa parte do que for definido pelos europeus terá validade por aqui, mas não tudo. No Brasil, o tema é muito discutido pelo mercado, que acompanha o que se passa lá fora. Apesar de ainda estarmos um pouco atrasados em relação a eles, o assunto tem sido tratado por aqui de forma cada vez mais estruturada e consistente.
A falta de um regramento global ou pelo menos regional não pode ser usada como justificativa para se deixar de lado as preocupações que envolvem o ESG. Pode não haver métricas únicas, mas há um conceito que possibilita às corporações, individualmente, estabelecerem parâmetros próprios e aceitáveis pelo mercado. Não por acaso, um grande banco com operações no Brasil, por meio de seu braço de Asset Management, relançou, no ano passado, um dos primeiros fundos de investimento do País a adotarem critérios ESG na escolha dos ativos.
Até então, o fundo adotava parâmetros locais. Mas diante da desconfiança de muitos investidores, que às vezes enxergam o tema como mero marketing, a gestora resolveu criar uma métrica proprietária global (no caso um parâmetro único próprio para suas operações em todos os países), com base em um ranking para classificar as empresas de acordo com o desempenho nestes critérios. A partir daí são criadas estratégias de investimentos rentáveis e sustentáveis.
O exemplo pode ser seguido por outras gestoras de fundos, mas também por empresas diversas, listadas ou não na Bolsa de Valores. Em um mundo cada vez mais exigente e preocupado com questões ambientais, com as consequências que a emissão de poluentes traz ao planeta, como o aquecimento global, é imprescindível adotar práticas que ajudem a evitar o colapso. Mesmo que, eventualmente, possamos estar sob a gestão de governos descompromissados com o conceito ESG, o fato é que o resto do mundo só vai fechar negócios com empresas que assumem tal compromisso.
Vamos pegar como exemplo uma recente exportação de madeira extraída da floresta amazônica para os Estados Unidos. Não adiantou nada o poder público afrouxar as regras, sendo que no país de destino elas são mais rígidas do que aqui. O resultado é de conhecimento público: a mercadoria foi transportada, mas ficou retida na alfândega estadunidense.
E não se trata apenas de observar a legislação de outros países. Há casos em que o regramento público é leve, mas o cliente é exigente e só compra de quem trabalha dentro do conceito ESG. Em resumo, a falta de uma métrica global é um dificultador para a implantação de um modelo de governança nesse molde, mas não pode ser usado como desculpa. Há um conceito bem definido e modelos implantados com base em regras muito coerentes que o mercado em geral tem aceitado bem e que pode servir de norte para quem resolva seguir o caminho da sustentabilidade. Provavelmente, o único aceitável para quem deseja um sistema econômico viável nas próximas décadas. Mesmo sem uma métrica global, a governança dentro dos padrões ESG é um caminho sem volta.
*Marcos Rodrigues é sócio-fundador da BR Rating