O sentimento prospectivo do mercado financeiro, embora pouco falado, mas com atitudes indicativas, é de absoluto desconforto com o quadro fiscal brasileiro, e isto além do expressivo montante conhecido e das dificuldades do governo em conter a propensão ao rompimento do teto orçamentário, se torna bastante evidente quando se observa o agravamento do perfil dos títulos da dívida pública brasileira e as mudanças recentes.
Como destacou Fernando Canzian em sua coluna na Folha, o prazo médio dos títulos da dívida pública brasileira emitidos desde janeiro de 2020 caiu à metade, de 4,7 anos para 2,4 anos, o que não é pouco, e isto permite a leitura de que a insegurança dos investidores em relação à solvência do país é latente. Cita o autor, com isso, em apenas um ano os vencimentos em 12 meses praticamente dobraram de R$ 553,0 Bi para R$ 1,02 Tri, atingindo quase 25% da dívida total.
Consequência, os juros repercutem pressões e apontam para alta, sendo que o TN já paga juros do dobro da SELIC nos vencimentos daqui a dois anos e a pressão vem vindo para o curto prazo.
Há muitas causas identificáveis consequentes das diretrizes da área econômica do governo envolvendo política monetária, cambial e fiscal, sobejamente esplanadas por inúmeros economistas, e todo o contexto deságua na desconfiança do mercado na capacidade de solvência do governo.
Quando entra no cenário a desconfiança tudo aponta para o dólar como reserva de valor e, desta forma, o preço do câmbio que já vinha aviltado pela indução do governo ao “câmbio alto e juro baixo” acaba rompendo parâmetros de equilíbrio em ambas as pontas e com a intensificação da busca do “hedge por desconfiança”, para preservar reserva de valor, o preço do dólar poderá atingir parâmetros preocupantes e mais danosos à economia brasileira do que benéficos a alguns setores pontuais, provocando a inflação repercutiva nos preços dos bens exportáveis no mercado interno , que o governo busca não sancionar reconhecimento, e a desorganização dos preços relativos da economia.
A busca, tentativa do governo de encontrar meios para financiar os programas assistenciais às populações carentes, antes por questão da pandemia e agora mais acentuadamente por questões eleitorais, num ambiente de crise fiscal e que representa elevado risco de rompimento do teto orçamentário tem provocado uma sequência de declarações conflituosas por parte do governo, que evidencia que quer por que quer estabelecer os necessários programas assistenciais, mas não tem diretrizes claras de implementação das fontes de financiamento.
Neste cenário conturbado e temeroso buscam-se pinçar dados indicativos de que a economia reage apontando números de desempenho, que, contudo, tem baixa percepção efetiva no cotidiano onde perdura elevado desemprego, inquietações na população de baixa renda e riscos elevados de retração do consumo pela perda de benefícios e também pelo aviltamento dos preços dos bens essenciais.
A realidade, o cotidiano, parece distante das percepções enaltecidas frequentemente nas manifestações dos membros do governo e até de alguns setores não governamentais, suscitando dúvidas se o objetivo não seja tão somente construir ambiente de otimismo.
Em suma, continuamos com nosso ponto de vista de que há um desalinhamento forte nos parâmetros do “câmbio alto e juro baixo” atuais, e, as repercussões são expressivas no mercado financeiro e na economia brasileira e que há um certo menosprezo pelas perspectivas preocupantes no horizonte que ensejam queda de consumo dada a queda de renda e alta dos preços (inflação) e isto será impactante nas projeções de retomada da atividade econômica.
Entendemos que os movimentos oscilatórios do preço do real frente ao dólar expõe claramente a grandeza das incertezas presentes e nem sempre bem pontuadas.
A relação real/dólar atualmente não repercute fluxos cambiais legítimos transacionais, mas seguramente o grau de incerteza e insegurança que, embora com pequenos espasmos de contenção, poderão acentuar a demanda do “hedge pela insegurança” e aviltar fortemente o preço causando efeitos consideravelmente danosos à economia.