A última semana de novembro é marcada por um feriado nos Estados Unidos (Thanksgiving), o que tende a esvaziar a liquidez dos mercados globais a partir de quinta-feira. Com isso, os investidores dedicam-se aos ajustes finais do mês, ponderando os riscos de curto prazo à economia global em meio à segunda onda da pandemia e a confiança no longo prazo com uma vacina eficaz contra a covid-19 distribuída amplamente.
Nesse cabo-de-guerra, ganha o lado otimista, com o sucesso nos testes de imunização alimentando esperanças de voltar à vida normal após um longo inverno (no Hemisfério Norte), que ainda pode trazer algumas surpresas econômicas desagradáveis. Os índices futuros das bolsas de Nova York abrem a semana em alta, após uma sessão de ganhos na Ásia. Esse sinal positivo embala o início do pregão europeu. O dólar é negociado nos menores níveis em mais de dois anos e meio. O petróleo sobe.
Por aqui, a crise é política. A ameaça do risco fiscal assusta mais do que a aceleração de casos e óbitos por coronavírus no Brasil, com as dificuldades do governo para deslanchar as reformas e cortar gastos acendendo o sinal de alerta sobre a real situação das contas públicas. Ainda mais após o ministro Paulo Guedes falar em “queimar” as reservas cambiais para amortecer o impacto da queda forçada da dívida federal.
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A notícia incomodou os ativos locais na sexta-feira passada, pois evidencia que qualquer discussão mais criteriosa sobre o “teto dos gastos”, a prorrogação do auxílio emergencial e o Orçamento deve ficar para 2021. Às vésperas do segundo turno da eleição em algumas cidades brasileiras, não haverá sessões entre os deputados. Essa paralisação no Congresso reflete a disputa entre Legislativo e Executivo em torno da eleição para a presidência da Câmara e do Senado, no início do ano que vem. Até lá, a pauta deve seguir travada.
Com isso, o titular da Economia, que vem desencantando o mercado doméstico, busca soluções fáceis para problemas difíceis no Brasil, sem endereçar as questões estruturais. Usar as reservas, que representam estoque - e não fluxo - para reduzir a dívida está longe de promover um ajuste nas contas públicas e, portanto, não garante uma trajetória sustentável à frente. Ao contrário, deixa o país vulnerável também a choques externos.
Dólar Forte
Há quem diga que com a Casa Branca na iminência de lançar um novo pacote fiscal trilionário, assim que estiver sob nova direção, em janeiro, somada à chance de estímulos monetários adicionais jorrados pelo Federal Reserve já em dezembro, adotando medidas para impedir que a taxa de juros de longo prazo fique muito maior que as de curto prazo, resulta em um movimento global de desvalorização do dólar. Na teoria, é isso mesmo.
Mas na prática nenhum país pode ignorar a verdadeira demanda pela moeda nacional. Ao tentar copiar o Fed e a Casa Branca, o Brasil promoveu cortes na Selic até o piso histórico em grau superestimulante - portanto, bem abaixo do nível neutro - ao mesmo tempo em que elevou os gastos públicos para socorrer os mais vulneráveis aos impactos econômicos da pandemia. Porém, pouco se fez para atrair os investidores estrangeiros.
A crescente presença do “gringo” nos negócios locais não é uma exclusividade tupiniquim e pode ser observada em outros mercados emergentes, onde os recursos externos têm sido até mais expressivos do que aqui. Nesse sentido, o Brasil poderia tirar proveito de tal fluxo, se tivesse caminhado na direção de trazer segurança a esse investimento, ao invés de contaminar o percurso tanto pela questão fiscal quanto pelo combate ao coronavírus.
Com isso, o dólar não se enfraquece excessivamente ante o real, seguindo bem longe da faixa de R$ 4,00 vista no começo do ano, porque o Brasil já enfrenta uma perda das reservas internacionais ao mesmo tempo em que aumenta a oferta (base monetária) em moeda local em um ritmo muito mais rápido do que o Fed - mas sem possuir uma moeda de reserva global. Daí que o dólar segue colado à marca de R$ 5,40.
O aviso do Banco Central de que pode atuar no câmbio local para atenuar o desmonte de posição defensiva (hedge) indica que a pressão no dólar até o fim do ano é para cima - e não o oposto. Mas enquanto instrumentos artificiais nos EUA tendem mesmo a enfraquecer a moeda norte-americana mundo afora, o ritmo desigual de crescimento econômico ainda em um contexto de disseminação da covid-19 tende a separar vencedores e perdedores.
Agenda Cheia na Semana
Depois de uma semana relativamente tranquila, a agenda econômica ganha força, no Brasil e no exterior. Aqui, destaque para os dados sobre a inflação (IPCA-15 e IGP-M) e o desemprego (Pnad e Caged). Lá fora, merecem atenção números preliminares sobre a indústria e o setor de serviços nos dois lados do Atlântico Norte, que vêm ampliando as restrições à atividade e à mobilidade. O risco da segunda onda pode levar os BCs dessas regiões (Fed e BCE) a agir, elevando a importância das atas das últimas reuniões.
Confira a seguir os principais destaques desta semana, dia a dia:
*Horários de Brasília
Segunda-feira: A semana começa com as tradicionais publicações do dia, a saber, o relatório de mercado Focus, do Banco Central (8h25), e os dados semanais da balança comercial (15h). Também por aqui, sai a prévia da confiança da indústria neste mês (8h). No exterior, saem dados preliminares sobre a atividade nos setores industrial e de serviços nos EUA e na zona do euro.
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Terça-feira: O destaque doméstico fica com a prévia da inflação oficial ao consumidor brasileiro (IPCA-15) em novembro, enquanto lá fora a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, participa de debate sobre a economia global organizado pelas Nações Unidas. Nos EUA, saem dados do setor imobiliário e sobre a confiança do consumidor.
Quarta-feira: A agenda norte-americana está carregada e concentra as atenções ao longo do dia. Entre os destaques, saem a segunda leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA no terceiro trimestre deste ano; os dados sobre a renda pessoal e os gastos com consumo em outubro; os dados semanais de auxílio-desemprego e sobre os estoques de petróleo, além da ata da última reunião do Federal Reserve. No Brasil, têm os números sobre a confiança do consumidor e na construção civil, além dos dados do BC sobre o setor externo e o fluxo cambial.
Quinta-feira: O feriado pelo Dia de Ação de Graças esvazia a agenda dos EUA e mantém as bolsas de Nova York fechadas, enxugando a liquidez dos mercados globais. Por aqui, saem a confiança no comércio, a inflação ao produtor (IPP), os dados das contas públicas (governo central) e do Caged. Na zona do euro, destaque para a ata da última reunião do BCE.
Sexta-feira: As bolsas de Nova York funcionam a meio mastro hoje, fechando mais cedo, às 15h, o que tende a manter a liquidez do dia reduzida. No varejo, a Black Friday dá início à temporada de compras de fim de ano. A data também é celebrada por aqui. Entre os indicadores econômicos, saem os dados atualizados do mercado de trabalho no Brasil (Pnad) até outubro, o IGP-M de novembro e sobre as operações de crédito no país no mês passado. Na zona do euro, será conhecido o sentimento do consumidor.