O mercado financeiro começa a “precificar” o que seria, de fato, um Trump trade. Em outras palavras, os investidores começam a embutir nos preços dos ativos o que implica para os mercados globais o retorno de Donald Trump à Casa Branca a partir de 2025.
Para quem não se lembra, mais quatro anos do republicano como o homem mais poderoso do mundo significam restrições comerciais mais rígidas dos Estados Unidos contra a China e repetidos choques com o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell - que, aliás, foi nomeado por Trump em seu primeiro mandato.
Em entrevista no mês passado publicada ontem (16), Trump afirmou que Powell deve permanecer até o fim de seu mandato como presidente do Fed, “especialmente se eu achar que ele está fazendo a coisa certa”. A sentença em destaque é importante e sinaliza que se as taxas de juros nos Estados Unidos não se moverem na direção que Trump prefere (para baixo), a independência do Fed pode estar sob ameaça.
Onda vermelha no mercado
Ainda mais se a tal “onda vermelha” que o mercado cogita se confirmar, com o domínio dos republicanos na Câmara e no Senado permitindo o avanço dos planos elaborados por aliados de Trump para enfraquecer o principal banco central do mundo. É isso o que explica o derretimento do dólar nesta manhã contra as moedas rivais.
O Índice DXY já está abaixo de 104 pontos, com o iene subindo mais de 1%, ao passo que o euro e a libra ganham cerca de 0,50%, cada. Já o juro projetado pelas Treasuries está de lado nos vencimentos mais longos, enquanto os títulos mais curtos recuam, indicando que, em algum momento, a inversão da curva de juros americana deve, enfim, chegar ao fim.
Entre as ações, uma onda vermelha já se forma no setor de tecnologia. O receio de uma renovada tensão geopolítica sino-americana, com um novo governo Trump elevando a repressão às exportações chinesas e o acesso aos semicondutores derruba a holandesa ASML (NASDAQ:ASML), a taiwanesa TSMC (NYSE:TSM) e a japonesa Tokyo Electron (TYO:8035).
Em Nova York, o futuro do Nasdaq cai mais de 1%, com queda mais pronunciada que o S&P 500 e o Dow Jones. Até Elon Musk está tentando explicar o apoio à chapa presidencial republicana composta por dois candidatos céticos em relação aos subsídios do governo para ajudar a indústria americana de veículos elétricos - depois de Joe Biden taxar a importação dos EV’s chineses para 100%.
E o Brasil?
Nessa queda de braço entre as duas maiores economias do mundo, os emergentes, em especial o Brasil, podem tirar proveito. Afinal, o Ibovespa não possui nenhum grande representante entre as techs. Além disso, a economia doméstica é produtora e exportadora primária de várias commodities que alimentam essa tech war. De quebra, isso fortalece o real e a atividade econômica, colocando em xeque o dólar a R$ 5,40 e o IPCA+ acima de 6%.
Ou seja, a quebra da sequência de 11 altas da bolsa brasileira ontem pode ter sido um breve respiro - uma oportunidade de entrada na renda variável em meio à correção nos preços. Mas nada impede uma continuidade do movimento negativo no curto prazo. Até porque a ligeira baixa de 0,16% foi apenas a primeira deste mês e do segundo semestre.
A dúvida, então, é se o complexo do mercado vai permitir aos investidores locais entenderem o cenário que se desenha em âmbito global. Afinal, se alertar para a chance de antecipação do ciclo de cortes nos juros dos EUA já para julho nada mais é, aos olhos de muitos, um wishful thinking; o que dizer então, daqueles que falam que o Copom deve preparar o mercado para uma possível alta da taxa Selic em setembro?