Esta frase do célebre e icônico economista John Maynard Keynes conquistou ao longo das décadas uma fama e respeito que a situam, de certa forma, acima dos acirrados debates sobre o seu relevante legado. Parte substancial deste feito decorre, certamente, da sua conexão com a realidade observada na prática nos mercados financeiros, como, por exemplo, nos mercados de ações e imobiliário. As “bolhas” que ocorrem de tempos em tempos, sobretudo aquelas que persistem por longos períodos, são evidências cabais de que Keynes estava certo neste aspecto.
O fenômeno da “racionalidade limitada” dos mercados, reflexo do que ocorre em nível individual nos agentes econômicos em particular e nos seres humanos em geral e conceito este que resultou no Nobel de Economia concedido a Herbert Simon em 1978, torna ainda mais evidente a necessidade dos investidores buscarem investir de forma “racional”, ou seja, consistente com os seus objetivos, perfil e necessidades.
Para lidar com tamanho desafio, todos os quatro “componentes primordiais” da abordagem que eu tenho apresentado ao longo das últimas semanas através dos meus artigos publicados aqui no Investing.com – “conhecimento”, “autoconhecimento”, “processo decisório” (estes três já detalhados nos meus três últimos artigos) e “implementação” (objeto deste meu artigo de hoje) – são absolutamente críticos. Contudo, o componente “implementação” se destaca em contextos de maior irracionalidade dos mercados por ser o principal candidato a “colocar tudo a perder” no comportamento dos investidores e, ao mesmo tempo, ter o maior potencial de minimizar o cometimento de erros graves em ambientes sob estresse.
“Todos os erros humanos são impaciência, uma interrupção prematura de um trabalho metódico.” (Franz Kafka).
IMPLEMENTAÇÃO: afinal, do que se trata?
A “implementação” deve ser a execução consistente e sistemática de uma estratégia de investimento previamente estabelecida. Estratégia esta resultante de um “processo decisório” que aplique de forma estruturada o “conhecimento” e o “autoconhecimento” obtidos de forma contínua. E esta consistência – critério científico mais utilizado para avaliar a racionalidade decisória, conforme destaquei no meu artigo anterior – na execução é um requisito fundamental, pois de nada adianta tomar decisões de forma fundamentada e estruturada se a sua implementação for um fracasso.
Tanto aqui quanto no processo decisório, os mais de 180 vieses e heurísticas já mapeados pela Ciência são a maior ameaça. Por exemplo: na atual “bolha” do Bitcoin muitos investidores estão se mostrando vulneráveis aos vieses do “otimismo” e do “efeito manada”.
Imaginemos a seguinte situação: um executivo de 52 anos demitido logo no início da pandemia em 2020 define, após profundas análises e assessorado por um consultor financeiro independente, uma estratégia de investimento conservadora e consistente com o objetivo de assegurar a sua longa transição para uma nova carreira em um adverso contexto do mercado de trabalho. Durante meses ele se mantém fiel a esta estratégia com uma carteira de investimentos bastante diversificada e com níveis de risco, retorno e liquidez coerentes com o seu objetivo. Não obstante, recentemente um ex-colega de trabalho o convenceu a investir uma parcela substancial das suas reservas financeiras em Bitcoin, argumentando com os sedutores ganhos auferidos nas últimas semanas.
Mesmo que o resultado futuro desta abrupta mudança de estratégia seja positivo em termos de retorno e de liquidez – pagando o preço da assunção de um risco consideravelmente maior –, não terá sido uma decisão racional deste investidor, pois foi inconsistente com a sua estratégia e, portanto, colocou em risco o alcance do seu objetivo maior: assegurar a sua longa transição para uma nova carreira. Este tipo de erro é assustadoramente frequente, levando muitas vezes a resultados financeiros ruinosos e, não raramente, a sérios problemas pessoais e profissionais que demandarão muito esforço e tempo para serem sanados.
PROTOCOLO, este é o “nome do jogo”
Para conseguir resistir à tentação de tomar uma decisão circunstancial potencialmente desastrosa, os investidores devem estabelecer um protocolo para a execução consistente e sistemática da sua estratégia de investimento. Um protocolo é uma das mais eficazes ferramentas decisórias desenvolvidas pela Ciência nas áreas de Economia/Finanças Comportamentais e de Julgamento & Tomada de Decisão e visa minimizar a influência do Sistema 1 (“Automático” ou “Intuitivo”) e maximizar o engajamento do Sistema 2 (“Reflexivo” ou “Explícito”) dos nossos cérebros.
Um protocolo consiste em um conjunto de regras a serem seguidas de forma disciplinada. Exemplo de um possível protocolo para um investidor: ajustar a carteira de investimentos somente a cada 6 meses, independentemente dos movimentos que ocorrerem no mercado durante este período, e sempre após uma nova rodada de execução das quatro etapas do seu processo decisório (enquadramento/perspectiva, obtenção de “inteligência”, alcance de conclusões e aprendizado com a experiência), conforme detalhei no meu artigo anterior.
É fácil seguir com disciplina um protocolo? Obviamente que não. Especialmente no início, quando o mesmo ainda não foi incorporado como um hábito. A inércia (“viés do status quo”) é uma das mais poderosas e nefastas forças na natureza humana, mas pode ser vencida com persistência. Assim como com qualquer objetivo pessoal e profissional relevante na vida – como, por exemplo, perder peso para melhorar a saúde pessoal ou conquistar um título acadêmico para viabilizar uma nova carreira –, o alcance de objetivos financeiros estratégicos exige racionalidade e inteligência.
* Ronaldo Deccax é Doutor em Administração com ênfase em Economia/Finanças Comportamentais, Mestre em Administração com ênfase em Estratégia, pesquisador e professor convidado no COPPEAD/UFRJ e consultor em Julgamento & Tomada de Decisão, Economia/Finanças Comportamentais, Negociação e Compras/Suprimentos.