A cautela do investidor tem aumentado no exterior e o quadro para ativos de risco já não é tão favorável, mesmo parecendo ser bem administrado no mercado doméstico. O cenário de incerteza quanto ao futuro de blocos político-econômicos e quanto ao tema imigração nos dois lados do Atlântico Norte segue no foco, mas o lado político no Brasil tampouco está tranquilo, apesar da aparência.
A calmaria pode simplesmente antecipar uma turbulência à frente, já que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve pedir o fim do sigilo de parte das delações de 77 executivos da Odebrecht. O pedido deve ser feito na esteira da abertura de inquéritos, baseados nos depoimentos.
Mas o governo Temer mostra uma posição segura, sem ver riscos na divulgação do conteúdo. O Palácio do Planalto avalia que o pedido de Janot evitaria vazamentos seletivos, diluindo os efeitos negativos entre os diversos investigados na Lava Jato. Os bastidores em Brasília, porém, revelam um ambiente agitado, com os parlamentares e o governo tentando se blindar da Operação.
A manobra na Câmara dos Deputados para impedir que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de punir partidos foi classificada pelo presidente do TSE, o ministro Gilmar Mendes, como uma consagração à impunidade, que se traduz no "comodismo" e no "corporativismo" que se vê hoje na classe política. A matéria poderia ter sido votada já ontem, mas o presidente da Casa, Rodrigo Maia, recuou na proposta.
Ele, aliás, foi apontado pela Polícia Federal como responsável por realizar favores à OAS, em troca de doações eleitorais. A investigação tem como base mensagens de celular entre o ex-presidente da empreiteira Léo Pinheiro e Rodrigo Maia e aponta indícios de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Além disso, o interrogatório do ex-deputado federal Eduardo Cunha aponta o presidente Michel Temer como interlocutor na reunião ocorrida no Palácio do Planalto para tratar de nomeações na Petrobras (SA:PETR4). Mais que isso, Temer sabia da existência de uma cita de cargos do PMDB dentro da petrolífera. O fato já foi negado pelo presidente.
Trata-se de uma bomba-relógio que já está armada e prestes a estourar, à medida que o noticiário político voltar a esquentar. Por enquanto, o governo tenta desviar o foco e concentra as atenções mais no Legislativo do que no Judiciário, em meio ao andamento das medidas de ajuste fiscal, com a instalação de comissões para avaliar as reformas da Previdência e a trabalhista, e na sabatina de Alexandre de Moraes, indicado ao STF.
No exterior, as incertezas políticas também continuam pautando os mercados financeiros. As posições do presidente dos Estados Unidos Donald Trump e da sua versão feminina na França, a candidata de extrema-direita Marine Le Pen, podem afetar a dinâmica da atividade de grandes empresas no mundo, espalhando temor nas relações comerciais.
Tanto que nem mesmo a melhor safra de balanços nos EUA desde a crise de 2008 tem sido capaz de embalar os mercados. No radar dos analistas, está o setor de tecnologia alocado no Vale (SA:VALE5) do Silício, que é demandante de mão de obra imigrante – muitos vindos de países de origem muçulmana que têm sido alvo de Trump. O Velho Continente também concentra as atenções, com a proximidade de eleições na Alemanha e na França ainda neste semestre.
Nesse ambiente, é a falta de detalhes e a expectativa por medidas para impulsionar o crescimento econômico que abalam os negócios, dificultando a ação dos investidores rumo a uma direção única. Na Ásia, por exemplo, as bolsas de Xangai (+0,5%) e de Hong Kong (+0,3%) registraram ganhos em meio à caça por pechinchas, ao passo que Tóquio caiu (-0,5%), diante do fortalecimento do iene.
A moeda norte-americana, por sua vez, ganha terreno do euro, diante das incertezas quanto ao futuro da região da moeda única e da própria União Europeia (UE). Essas dúvidas atrapalham a abertura do pregão acionário na Europa, que recebe pouca ajuda de Wall Street, onde os índices futuros das bolsas de Nova York estão de lado.
O dólar também avança em relação ao xará neozelandês ("kiwi"), após o Banco Central local (RBNZ) sinalizar desconforto com a taxa de câmbio no país. O dólar australiano segue o vizinho e recua, assim como as demais moedas de países correlacionados às commodities.
Em relação às matérias-primas, o petróleo ensaia uma recuperação e volta a ser negociado acima de US$ 52 por barril, enquanto os metais estão no vermelho. O cobre devolve parte do salto na véspera após o início de greve em uma mina no Chile, ao passo que o ouro também realiza lucros, um dia depois de alcançar o maior nível desde novembro.
Entre os indicadores econômicos, a agenda segue fraca. Aqui, saem a primeira prévia de fevereiro do IGP-M (8h) e as estimativas para a safra agrícola neste ano (9h). No calendário norte-americano, serão conhecidos os pedidos semanais de auxílio-desemprego (11h30) e os estoques no atacado em dezembro (13h).
Mas o grande destaque lá fora é a decisão de política monetária do México, às 17h. A expectativa é de aumento da taxa de juros no país, de 5,75% para 6%, em meio à artilharia verborrágica de Trump contra o país latino, o que tem depreciado o peso mexicano.