Alguém tinha de cair primeiro: ou os preços elevados dos imóveis residenciais novos nos EUA ou a madeira serrada utilizada em sua construção.
Por enquanto, tudo indica que é a madeira, já que as construtoras americanas reduziram bastante a atividade em abril, na tentativa de recompor os estoques do material, que já disparou 300% neste ano.
O movimento de queda da madeira, ocorrido depois de uma incansável demanda de construtoras residenciais nos EUA, culminou com três dias consecutivos de desvalorização, pior sequência de perdas em oito meses.
No fechamento de terça-feira, o contrato futuro de madeira serrada nos EUA com entrega em julho fechou a US$ 1.264 por pé-tábua, uma queda de quase 5% no dia.
A desvalorização ocorreu após dados do Departamento de Comércio mostrarem um declínio de quase 10% na construção de novas casas, provavelmente devido a uma reação das construtoras à disparada de preços da maioria dos materiais, inclusive a madeira.
Antes mesmo da terça-feira os preços da madeira serrada já vinham caindo, cedendo 15% na segunda-feira e quase 4% na sexta-feira.
Em conjunto, a queda de US$366, ou quase 23%, nos três dias desde o último fechamento positivo na quinta-feira a US$1630 marcou a mais acentuada desvalorização da madeira serrada desde o período de 15-17 de setembro.
Nesses três dias, o mercado perdeu US$387, ou 42%. Naquele momento, entretanto, a madeira serrada era negociada abaixo de US$ 1000 por pé-tábua. Neste ano, seus preços já atingiram a máxima de US$ 1711, pesando muito sobre os resultados das construtoras.
Especialistas do setor vinham alertando que havia um limite para a alta dos preços dos materiais passíveis de absorção pelas construtoras, abrindo espaço para fortes quedas.
Esse é apenas o começo de uma correção mais significativa na madeira?
O que vimos na madeira serrada norte-americana nos últimos três pregões pode ter sido apenas o começo de uma correção mais acentuada, de acordo com Paul Jannke, especialista no mercado madeireiro da Forest Economic Advisors, responsável por prever a desvalorização em uma postagem no portal Pro Sales em abril.
Apesar do aquecido mercado imobiliário residencial, a capacidade de produção latente da indústria norte-americana de madeira serrada “supera de longe qualquer alta no nível de demanda para os próximos anos”, disse Jannke.
Jannke, que passou 15 anos estudando os mercados madeireiros, afirmou que o rali na madeira serrada no último ano foi impulsionado por três fatores: alta no consumo, baixos estoques no atacado e clima úmido, atrasando os cortes e a logística de entrega – “todos fenômenos de curto prazo”.
Apesar de concordar que a alta do consumo impulsionou a demanda da madeira serrada, o mais importante, em sua visão, foram os níveis extremamente baixos de estoques de revendedores e fornecedores de materiais de construção.
Segundo o analista, os níveis de estoques na venda caíram quase 4 bilhões de pés-tábua, portanto apenas sua recomposição poderia ter causado uma disparada de pedidos.
Além disso, o clima frio no Sul dos EUA e o período usual de reflorestamento após o desgelo de primavera no Norte impossibilitaram as madeireiras de atender à demanda.
Mas agora os madeirais estão secando, o que elimina esses fatores, e as compras neste verão local serão feitas de olho nos projetos de construção a partir de setembro, quando a atividade começa a arrefecer, afirmou Jannke.
É preciso lembrar ainda a enorme capacidade latente na indústria. Jannke disse que as madeireiras estavam trabalhando em dois ou três turnos por dia durante o boom da construção de residências e agora voltaram a apenas um turno e muitas estão fechadas.
Ao mesmo tempo, o menor consumo das construtoras faz com que a taxa de cortes siga o crescimento dos madeirais na América do Norte.
“A madeira está disponível”, segundo Jannke. “Esse é outro fator que explica por que os preços em 2011 devem ficar dentro da faixa de 5% registrada neste ano".
Em uma publicação no mês passado, Jannke previu que “em maio, talvez em junho, veremos uma queda acentuada dos preços".
Construção de novas casas explica hesitação de construtoras
O fato de tudo ocorrer conforme o previsto não deve surpreender quem acompanha os detalhes do relatório mensal de construção de novas casas, divulgado pelo Departamento de Comércio.
O órgão afirmou na terça-feira que o número de imóveis autorizados para construção, sem os canteiros ainda instalados, atingiu seus níveis mais altos desde 1999, sugerindo hesitação por parte das construtoras.
Mike Fratantoni, economista-chefe da Associação de Banqueiros Hipotecários de Washington, ao comentar os dados, declarou que as construtoras sem dúvida estavam atrasando o início de novas construções por causa do aumento dos custos da madeira e outros insumos.
Fratantoni disse ainda à Reuters:
“Essas restrições na cadeia de suprimentos estão limitando o avanço do mercado residencial, que deveria estar acelerando com a forte demanda impulsionada pela melhora no mercado de trabalho e nas taxas hipotecárias”.
O mercado residencial – exemplo mais notável do chamado “American Dream” – é um dos pilares da economia dos EUA, respondendo por 15% do PIB do país.
O setor residencial vem liderando a recuperação econômica após a recessão provocada pela Covid-19 a partir de fevereiro de 2020. O investimento na construção de imóveis residenciais registrou crescimento de dois dígitos desde o quarto trimestre do ano passado.
A falta de madeira serrada nos EUA fez com que os preços mais do que triplicassem no último ano e aumentou em milhares de dólares o custo geral de novas construções residenciais no país.
Em apenas um ano, o preço da madeira serrada aumentou cerca de 370%, atingindo a máxima recorde acima de US$ 1.700 por 1.000 bd ft. Para fins de contexto, a madeira serrada historicamente flutua entre US$ 200 a US$ 400.
Nos Estados Unidos, o preço médio de uma residência é de US$ 35.872, de acordo com uma análise realizada na semana passada pela Associação Nacional de Construtoras.
Em uma pesquisa recente em Nevada, publicada pelo periódico Las Vegas Review-Journal, as casas novas unifamiliares custavam em média US$ 25.000 e, para residências maiores, a falta de madeira serrada poderia aumentar os preços de US$ 50.000 para US$ 60.000.
Apesar da queda no mercado futuro da madeira nos últimos três dias, os preços físicos do material não cederam.
De acordo com a última análise da Random Lengths, empresa que rastreia a indústria, os preços mostram que o custo da madeira estrutural se aproximou de US$ 1327 bd ft na terça-feira, uma alta em relação aos US$ 1200 de 23 de abril.
Aviso de isenção: Barani Krishnan utiliza diversas visões além da sua para oferecer aos leitores uma variedade de análises sobre os mercados. A bem da neutralidade, ele apresenta visões e variáveis de mercado contrárias. O analista não possui posições nos ativos e commodities sobre os quais escreve.