No dia 28 de agosto de 2023, foi introduzida a Medida Provisória (MP 1.184) que altera a forma como os fundos de investimento são tributados. Neste artigo, explicaremos essas mudanças, focando nos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) que funcionam como condomínios fechados.
A MP estabelece que, duas vezes por ano (em maio e novembro), os rendimentos dos fundos serão tributados na fonte. Esse processo é popularmente chamado de “come-cotas”.
Anteriormente, essa cobrança do “come-cotas” só se aplicava aos fundos abertos. Porém, a MP deseja aplicá-la tanto a fundos abertos quanto fechados. Contudo, alguns fundos, como os voltados para ações (FIAs), participações (FIPs) e índices de mercado (ETFs), estão isentos dessa regra. Já os FIDC fechados não tiveram essa sorte.
Para entender melhor: fundos abertos permitem que os investidores retirem seu dinheiro quando desejarem, enquanto os fechados possuem regras mais rígidas e prazos determinados. É importante ressaltar que a maior parte dos FIDCs (aproximadamente 75%) é do tipo fechado. Logo, o impacto da nova regra nesse setor será expressivo.
A nova regra faz sentido?
Os FIDCs podem investir em diversos tipos de direitos creditórios, como duplicatas, notas promissórias, precatórios, entre outros. Algumas dessas opções apresentam maior risco ou possuem liquidez reduzida. O problema da nova tributação encontra-se aqui.
Imagine um FIDC que investe em uma Cédula de Produto Rural. Se, por algum motivo, ocorrer uma valorização, o "come-cotas" será aplicado, mesmo que esse rendimento ainda não tenha se concretizado. Caso o fundo não tenha dinheiro em caixa para arcar com a tributação, poderá ser necessário vender ativos rapidamente.
A regra faz sentido? Não.
Primeiro, porque muitos títulos são ilíquidos, ou seja, não são facilmente vendidos no mercado secundário. Nessa situação, o investidor pode ser obrigado a aportar recursos para cobrir o Imposto de Renda sobre um lucro meramente presumido.
Segundo, porque, frequentemente, os ativos são contabilizados no patrimônio dos fundos baseados na melhor expectativa de recebimento, o que não garante que tais valores sejam, de fato, liquidados conforme na forma e prazos esperados. Assim, novamente, a implementação indiscriminada do "come-cotas" pode levar à tributação de lucros meramente teóricos.
Potencial prejuízo para ao mercado
O mercado de FIDC tem apresentado significativo crescimento. Até junho de 2023, alcançava mais de R$ 400 bilhões, representando um aumento expressivo nos últimos anos. Dado seu papel fundamental no financiamento de diversos setores econômicos, a nova diretriz tributária pode afetar negativamente o setor justamente quando este vem ganhando crescente relevância no desenvolvimento econômico do país.
Outro ponto a se considerar é que, ao comparar os FIDCs fechados com outros investimentos de renda fixa, a nova tributação pode desestimular investidores em relação aos FIDCs. Além disso, já surgiu entre os participantes do mercado o debate sobre a tributação de lucros ainda não concretizados e a potencial violação do princípio constitucional da irretroatividade.
Por essas razões, em eventos e comunicações recentes, alguns membros do governo que estiveram à frente dessas alterações já mencionaram a possibilidade de discussões visando ajustes na norma.
Diante dessas preocupações, acreditamos que é essencial um diálogo construtivo, robusto e transparente sobre o aperfeiçoamento da legislação. A justiça fiscal é importante, mas não deve comprometer o dinamismo, a vitalidade e a expansão de um setor tão relevante para a economia brasileira. Um ambiente regulatório claro e estável é fundamental para garantir a confiança dos investidores e o crescimento sustentável do mercado.