Quando eu tinha 17 anos, entrei para uma Universidade Pública, a Universidade Federal do Rio de Janeiro, pra fazer o curso de Administração de Empresas.
Naquele época, me empolgava com as idéias de Mário Covas, lia textos de Economia e Administração e era favorável às privatizações, até porque, ficava 5, 10 minutos segurando o aparelho de telefone à espera de um sinal para fazer uma ligação.
Tal perfil me colocava, segundo o Manual do Partido dos Trabalhadores, como um neo-liberal burguês tucano a serviço do capitalismo selvagem.
Apesar do meu lado, novamente segundo o Manual do Partido dos Trabalhadores, neo-liberal burguês tucano privatista e ativista do capitalismo selvagem, precisava ganhar algum dinheiro pra ajudar nas despesas de casa.
Não havia dinheiro pra despesas básicas , muito menos pra comprar um Vinho Romanée-Conti.
Assim, fui fazer uma das poucas coisas que eu sabia fazer, dar aula particular de Matemática.
Sim.....afinal, um adolescente de 17 anos não tem tantas oportunidades assim no mercado de trabalho e, afinal, gostava de matemática.
Passadas 2 décadas, percebo que não é preciso trigonometria, derivadas, geometria analítica ou espacial ou mesmo equações reflexivas e complexas para avaliar a Bolha Imobiliária pela qual o Brasil vive hoje.
Basta Matemática Básica, Matemática Simples.
Peço apenas um pouco de atenção, um pouco de calma pra chegarmos lá.
Antes, apenas uma rápida passagem no cenário que construi aqui e no meu blog, em um artigo escrito há alguns meses, acerca da minha tese sobre como chegamos na disparada dos preços dos imóveis no Brasil.
Resumidamente, inseri no contexto um estudo-pesquisa de 2002 do BIS (Banco de Compensações Internacionais) no qual estabelecia uma relação forte entre o tripé "PIB, Taxa de Juros e Mercado acionário" e a direção dos preços dos imóveis.
Ou seja, as 3 variáveis mencionadas ajudariam a explicar uma eventual exacerbação dos preços dentro de um contexto de "Bolha".
No raciocínio que expus, questionei tamanha simbiose, dado que, PIB e Mercado acionário já vinham subindo ao longo dos "anos 2000", ali no período 2002-2007, mas nem por isso, o preço dos imóveis disparou.
Nem tampouco a queda na taxa de juros foi determinante, dado que a queda mais forte se deu nos últimos 12-18 meses, muito depois da disparada dos preços dos imóveis, que foi mais intensa no período 2008-2011.
Logo, o tripé "PIB-JUROS-MERCADO DE AÇÕES" não seria determinante para a disparada dos preços dos imóveis no Brasil, talvez no máximo, agiu como "reforço" ou "alimentador final" para a perpetuação do "Efeito Manada".
A minha tese carregava um ponto pouco discutido até hoje, por especialistas ou não;
Qual era o ponto?
O quanto os IPO'S das várias construtoras ao longo de 2006-2007-2008 foi determinante para tirar da inércia os preços dos imóveis.
O quanto o dinheiro trazido pelos IPO'S das construtoras foi determinante para inundar o mercado de liquidez e "inflacionar" o preço dos terrenos e, por conseguinte, dos mercados primário e secundário de imóveis.
O tripé "PIB-JUROS-MERCADO DE AÇÕES" apenas "corroborou" a liquidez jogada no mercado de imóveis.
Sem o dinheiro dos IPO'S das Construtoras, o tripé "PIB-JUROS-Mercado acionário" não teria força para tirar da inércia os preços dos imóveis.
É claro que o chamado "investidor" teve um papel "primeiro" no processo, isto é, vendo "oportunidades à frente e percebendo a dinâmica de valorização que os preços poderiam tomar, ele comprava "barato", inflava mais ainda o discurso da valorização e ampliava os ecos de uma "bolha" em andamento.
Todos os inúmeros processos e acontecimentos que foram se sobrepondo posteriormente, mês a mês, ano a ano, apenas chancelava, reforçava e empurrava os preços cada vez mais para cima, numa velocidade impressionante e "irracional", num clássico "Efeito Manada".
Questões como o aumento do crédito dos bancos privados e públicos, a manutenção da taxa de juros americana em "zero" desde dezembro de 2008, Copa do Mundo e Olimpíadas se sobrepunham e representavam pólvora pura na fogueira já armada da "Bolha Imobiliária em andamento".
"Comprem!! Comprem! Vai bombar! Vai bombar!"
Expressões como essas, já vistas em bolhas de qualquer ativo, principalmente nas bolhas dos mercados de ações, eram frequentes entre os participantes, investidores ou não.
O que se ouvia e ainda se ouve é que "vai valorizar" até a Copa, até as Olimpíadas, "tá tudo barato", enfim, sem que as pessoas parem para fazer apenas uma coisa.
MATEMÁTICA BÁSICA, MATEMÁTICA SIMPLES
Volto a dizer.....
Pesquisas precisam ser aprofundadas, principalmente no Brasil que carece de dados, históricos e pesquisas no campo de "imóveis". A minha "defesa", representa apenas mais uma, entre tantas outras, vigentes ou não.
Ponto.
Por outro lado, nesse artigo, quero enfatizar o "elo final".
Ou seja, até esse instante, me preocupei em expor a minha visão de como chegamos até aqui, como chegamos nos preços aviltantes dos imóveis que encontramos por aí.
Agora, é preciso tratar da consistência por trás das compras, que, afinal, é por onde se passa o "chancelamento" da aberração dos preços.
Se não tivesse comprador, não teríamos a "Bolha", correto?
Nesse momento, a MATEMÁTICA BÁSICA E SIMPLES faz milagre.
Obviamente, a figura do investidor "primeiro" ou "segundo" não pode ser descartada. Eles compraram e repassaram para outros " segundos investidores" inflando e ecoando a "Bolha", como destaquei mais acima.
Outros compradores que não eram investidores "compravam a idéia" e embarcavam no discurso, "se virando" como podiam.
"Como podiam"???? Uma grande pergunta, não é?
Como isso acontece?
Não sei!!
Perguntem aos bancos.....
Vamos a MATEMÁTICA BÁSICA!
Diz o IPEA, que o rendimento médio nominal do trabalhado principal, habitualmente recebido por mês, pelas pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por regiões metropolitanas (leia-se: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre) é hoje cerca de R$ 1.800,00.
Vejam no gráfico abaixo:
Mesmo que fôssemos nos restringir apenas aos trabalhadores do setor público, esse rendimento subiria para algo em torno de R$ 2.900.
Vejam abaixo:
Continuemos.....
Ao entrar num simulador de financiamento imobiliário num site de um dos principais bancos do Brasil, me deparo com uma tabela Price que me mostra a realidade "formal" dos financiamentos à disposição.
E o que essa TABELA me diz?
Uma das primeiras constatações é que, dificilmente, você conseguirá um financiamento acima de 70% do imóvel.
Portanto, todo o raciocínio será "em cima" de um financiamento de 70% do imóvel.
Também, de acordo com a TABELA PRICE disponibilizada pelo Banco, dificilmente você conseguirá um financiamento que lhe imponha parcelas acima de 30% de sua renda.
Ora....ora.....ora......
Vamos tomar então como parâmetro inicial o rendimento de R$ 2.300,00 , QUE SERIA A MÉDIA entre um trabalhador comum e o funcionário público(R$ 1.800 e R$ 2.900).
Sabem qual o valor do imóvel que o site disponibiliza para uma renda média de 2.300,00, sem que a parcela ultrapasse os cerca de 30% de sua renda total, num financiamento de 20 anos e com as taxas de juros atuais?
R$ 100.000,00 ....
Isto é, se você, segundo a TABELA PRICE, ganhar cerca de R$ 2.300 por mês e solicitar um financiamento imobiliário, MUITO PROVAVELMENTE terá a sua disposição, apenas a possibilidade de comprar um imóvel de R$ 100.000,00, com parcelas em torno de R$ 790,00, dadas as taxas atuais.
Agora, me digam, caros leitores.
Na média......eu estou falando na média........onde, nas grandes regiões metropolitanas do Brasil, você encontrará um imóvel por R$ 100.000,00????
Há algo de estranho aí, não há?
Qual e mágica?
Possivelmente, assim como em outros casos de BOLHA IMOBILIÁRIA, vários bancos afrouxaram a regra dos 30% da renda familiar para a obtenção do financiamento.
Isso é evidente.......se não há, na média, imóveis disponíveis de R$ 100.000,00, muitos bancos aprovaram financiamentos com uma relação "financiamento-renda" acima de 30%, já que, na média, imóveis estão muito acima de R$ 100.000,00.
Muitos financiamentos em curso, por inúmeros motivos, estão carregados por condições completamente fora do "padrão normal".
É pouco provável que o "investidor primeiro" ou "investidor segundo" esteja ainda no mercado.
O que resta do mercado, provavelmente, são os "retardatários", ou seja, os pais de família ou "compradores normais".
E, agora?
Aham!!!! Agora?
Agora, o jogo começa a ser jogado de forma diferente.
O mundo está prestes a mudar a lógica do dinheiro fácil......os Estados Unidos discutem o fim dos estímulos monetários.....as taxas de juros americanas terão que ser jogadas pra cima, mais cedo ou mais tarde....
O fluxo mundial de dinheiro tomará outras direções, o custo do dinheiro aumentará, as construtoras e os bancos no Brasil, públicos ou privados, terão acesso dificultado ao dinheiro no mundo.
Na época do "dinheiro fácil", os bancos afrouxaram as regras.....
Na época do dinheiro "dificil", os bancos retornarão a "padrões normais".
Mais.....
O governo brasileiro cometeu tantas insanidades no trato da política econômica nos últimos 3 anos, que o Brasil nem precisa esperar o aumento da taxa de juros americana ou mesmo o término da COPA DO MUNDO ou das OLIMPÍADAS.
Na última semana, a Agência de Classificação de Risco, Standard & Poor's colocou em revisão o rating do Brasil nos próximos 2 anos.
Não somente isso; também colocou em revisão o rating de 11, eu disse 11 instituições financeiras brasileiras.
O próprio movimento de revisão colocará o Brasil e, particularmente tais instituições, em condições mais adversas de conseguir dinheiro lá fora e, mais ainda, "dinheiro barato".
Tudo isso impactará fortemente a atuação das várias instituições nos seus respectivos portfólios de financiamento.
Os bancos não só devem rever os "padrões normais", como, provavelmente caminharão para algo muito mais seletivo e rigoroso, um cenário oposto ao que vimos nos últimos 5-10 anos.
E, volto a dizer; ainda sem o tremor do aumento da taxa de juros americana.
Ora....se eles voltarem aos "padrões normais", não há 1 só imóvel que resista a regra simples da TABELA PRICE DE FINANCIAMENTO".
Os imóveis voltarão aos padrões normais.....
Num primeiro momento, se os portfólios estavam "fora do lugar", numa perspectiva de MATEMÁTICA BÁSICA E SIMPLES, o segundo momento, onde tudo começará a ficar mais difícil e mais caro, trará as coisas para a Realidade.......
Ou você aumenta a renda média do trabalhador pra algo, na média, pra R$ 5.000, ou você traz o valor do IMÓVEL pra, na média, R$ 100.000.
Pagar R$ 500.000 num apartamento de 50 m2 no Bairro da Tijuca ou mesmo R$ 800.000 no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, está completamente fora de próposito.
Igualmente insano é desembolsar a bagatela de R$ 700.000 para um apartamento de 80 m2 no Bairro do Brooklin em São Paulo....
Basta Matemática Básica, Matemática Simples.