O BC apurou lucro meses atrás e transferiu lucros para o TN mediante apuração do valor do estoque a preço do mercado das reservas cambiais, e, isto foi positivo e enaltecido à época, pois ajudou a situação caótica de Dívida Pública.
Mas esta prática tem seus riscos reversivos e, agora, com a expressiva queda do preço do dólar no nosso mercado de câmbio, certamente, na atualização que se espera ocorra no balanço do BC neste final do mês, encerramento do ano, desta vez com a marcação a preço de mercado das reservas cambiais haverá prejuízo, e há um silêncio em torno desta realidade tão próxima.
Porém, quando ocorre prejuízo no BC neste quesito o TN deveria assumir, no entanto não o faz devolvendo o lucro monetizado e sim emitindo Dívida Pública nova e entregando os títulos ao BC.
Evidentemente, este fato onera a Dívida Pública brasileira.
Fica o registro, a verificar.
Há absoluta clareza de que o dito “overshooting” havido no preço do dólar no país foi obra direta da estratégia estimulada pelo Ministro da Economia focando o “câmbio alto” e o “juro baixo”. Evidentemente, ao tempo desta inspiração do Ministro Guedes era uma tese, pois com o “câmbio alto” tornava o Brasil barato e atraente ao capital estrangeiro, que nunca negou esperar que se intensificasse para o país, poderia vender parte das reservas cambiais a preços fortes reduzindo o aperto fiscal, e fomentando, também, diretamente o setor exportador e a indústria nacional, já que encareceria o preço de produtos concorrentes importados e dava competitividade ao nosso, não necessariamente produtividade que é outra coisa, e as exportações brasileiras. Na contra ponta haveria o “juro baixo” que deveria motivar o empresariado brasileiro ao investimento produtivo e ao alívio fiscal do custo para o governo de carregamento da Dívida Pública brasileira.
As relações causas-efeitos objetivadas não se consumaram, não houve o retorno esperado em repercussões e induções, e desta forma beneficiou-se tão somente e fortemente o agronegócio em suas exportações, também favorecido pela pandemia do coronavírus que aviltou globalmente os preços das commodities alimentares e acentuou a demanda internacional.
Na outra ponta, o ”juro baixo” não despertou o "espírito empreendedor” do setor privado que deveria reagir com incremento aos investimentos produtivos, de vez que o governo não detinha como continua não detendo, recursos para investimentos na infraestrutura.
Brasil barato, programa efetivo de privatizações, dólar alto promovendo o estímulo aos investidores externos e juro baixo estimulando os investidores internos.
Não era uma má ideia em tese, mas houve um descontrole absoluto no equacionamento do “câmbio alto e juro baixo” por parte do governo e o câmbio ficou muito alto mesmo e o juro muito baixo mesmo, mutilando a simetria que necessariamente deve existir entre estes dois pilares da política monetária/cambial.
“Fugiu da mão” e o câmbio atingiu parâmetros que o Ministro considerou em “overshooting”, só deixou de esclarecer que foi o autor intelectual, pois o mercado só repercutiu o "estímulo retórico”, e, até prova em contrário, o país, por ser emergente, reduziu em demasia o juro e perdeu atratividade ao capital estrangeiro, que representava ao longo dos anos suporte em torno de 20% ao carregamento da Dívida Pública.
As reformas fundamentais, exceto a da Previdência, não saíram dos discursos e boas intenções e o programa de privatizações, importantíssimo, não passou de uma boa ideia sem propulsão.
Veio a crise pesada da pandemia do coronavírus, e o que já não obtinha sucesso piorou, e então o câmbio promoveu enorme impacto negativo na inflação brasileira, modestamente e seletivamente captada pelo IPCA de 4,5% e mais efetiva no IGP-M de 25,0%, sendo que mensurações mais conservadoras apontam que na cadeia de alimentos essenciais à população brasileira está em 12,5%, o que consideramos muito conservadora, mas já expressiva para dilapidar a capacidade de consumo da população.
Estrago feito pelo “câmbio alto” de forma pontual há uma desorganização na política monetária, com um distanciamento enorme entre o IPCA, a inflação real e efetiva e o IGP-M, e neste país de várias inflações e vários índices a proliferação danosa desta desordem na economia se tornou inevitável.
Ontem, o COPOM manteve a taxa SELIC em 2% e retirou do “forward guidance” a menção que coloca a perspectiva de baixa, mas não assume nenhuma postura pertinente a altas. Esta irrealidade protege os dispêndios do governo no custo de carregamento da Dívida Pública, mas tende a ser gradativamente criticada pelos especialistas.
A crise da pandemia agravou o já seríssimo quadro fiscal, preocupante mesmo e colocando presente o risco de rompimento do teto orçamentário, incômodo que prevalece no cotidiano do país e que exauriu os recursos do governo para manutenção dos programas assistenciais focados no suporte à população carente ao longo da crise do coronavírus, e desta forma impondo o término a partir deste mês de dezembro, devolvendo, assim, à miséria parte expressiva da população, num contexto que expressa números alarmantes de desempregados e desalentados.
O quadro brasileiro é preocupante com agravamento do risco fiscal e para o qual as soluções efetivas não são rápidas e, ainda, necessitam de iniciativas políticas; retomada em ascensão do risco sanitário com a nova rodada de proliferação da crise do coronavírus que poderá impactar efetivamente na retomada da atividade econômica e requerer do governo novos dispêndios para os quais não está preparado; absoluto descompasso no delineamento programático e aceitação da absoluta necessidade e premente da vacinação da população; etc...
Mas, neste ínterim, o governo americano sinalizou mudança de comando e isto trouxe ao mundo globalizado uma forte distensão de capitais que estavam defensivamente “empoçados” e que saíram pelo mundo procurando rentabilidade, e de início promoveram forte fragilização da moeda americana, o dólar, perante as demais moedas do mundo, com ênfase às dos países emergentes produtores de commodities.
Então, sem que o Brasil desse causa, o dólar passou a apresentar forte depreciação frente ao real e isto é benéfico para conter a inflação crescente em espiral, mitigando o impacto nefasto nos preços relativos da economia, já que o câmbio alto fracassou em seus objetivos primários.
Adicionalmente, o novo clima vem induzindo ao desmanche, posições compradas de dólares no mercado futuro, e isto acentua o viés de depreciação do dólar.
O BC previdentemente, sabedor do ajuste do “overhedge” de US$ 16,0 Bi por parte dos bancos este mês, atenua pressões com oferta adicional de 4.000 contratos novos de swaps diariamente, e, naturalmente poderá realizar, se e quando necessário oferta de dólares à vista.
Falta ajustar o juro, inadmissível por melhor que seja a justificativa, a manutenção em 2% em ambiente de inflação mascarada de 4,5% e IGP-M de 25%, mas que o governo mantém para não auto onerar-se nos custos de carregamento da Dívida Pública, já que o risco fiscal está no limite.
Há no momento um fluxo de investidores estrangeiros para a Bovespa, muito seletivo e direcionado às “blue chips” e a papéis de segmentos relevantes da economia que tiveram os preços deprimidos ao longo da pandemia, portanto não expansivo e homogêneo, mas extremamente “arisco” às preocupações com o risco fiscal do país e a percepção de que, de repente, poderá ser rompido o teto orçamentário, o que sinaliza que a atratividade pelo Brasil ainda é frágil e vulnerável.
É preciso acompanhar este comportamento dos investidores estrangeiros com absoluta acurácia, pois o fluxo poderá ser interrompido se houver insegurança no campo fiscal e, com alguma intensidade, revertido.
A preocupação que temos ressaltado é que o otimismo emanado da alta da Bovespa e da depreciação do dólar frente ao real possa induzir a ideia errática de que está tudo bem, muito pelo contrário, os problemas brasileiros são grandiosos e de difícil equacionamento, há falta de protagonismo por parte do governo nas questões centrais, muita retórica e agora muita expectativa sobre destravamentos de projetos engavetados na Câmara e no Senado com as mudanças de seus comandos a partir de fevereiro de 2021.
Há uma linha tênue que está separando o avanço do retrocesso, se não houver responsabilidade e ações efetivas por parte do governo, o país pode “perder o trem outra vez”.
É ilusório mesmo quando se compara que isto ou aquilo está voltando aos parâmetros pré-pandemia, pois, sabidamente, o país já vinha claudicante em sua dinâmica de atividade econômica, então é o péssimo passando ao ruim, mas a meta deve ser de retorno ao bom, este é o desafio.