Um assunto que, paradoxalmente, é muito discutido e, ao mesmo tempo, tratado com certa leviandade por investidores é o que motiva pessoas a adotarem uma tecnologia. Ao passo que a Lei de Metcalfe é frequentemente recitada por defensores das criptomoedas e os anúncios positivos de grandes empresas são sempre ecoados, ainda há certas questões a serem clarificadas. Dentre o que há para ser dito no assunto, vou focar nesse texto em um ponto que creio fundamental: como inovações são difundidas. Aplicarei os insights desse debate na tecnologia Lightning Network.
Minha análise será embasada na pesquisa em marketing quantitativo. Em 1968, Michael Bass lançou um artigo influente propondo um modelo para a adoção de inovações. Nesse modelo, há pessoas que adotam a inovação porque são informadas e adotam simplesmente porque querem e há pessoas que descobrem (e imitam) essas primeiras. Com algumas premissas sobre essas pessoas, Bass criou um modelo que se assemelha a uma curva “S” para explicar a difusão de inovações.
A beleza que esse modelo captura, e também seu principal insight, é a não linearidade na adoção das inovações. Uma vez que se entra na fase onde há forte imitação, a adoção é acelerada. A questão relevante é: esse modelo traz intuições para a adoção de tecnologias, criptomoedas e soluções off-chain? Alguns partidários dessa teoria tendem a afirmar que as criptomoedas vão sofrer ainda uma forte adoção cada vez mais acelerada. Por uma breve análise visual, temos que a adoção do Bitcoin, com forte explosão no número de carteiras e transações, leva a crer que o modelo se aplica.
Entretanto, tendo como caso a adoção do SegWit, eu tendo a acreditar que não é fácil acreditar na universalidade tanto dessa ideia. Ainda não fiz nenhuma análise quantitativa do caso, porém uma inspeção visual mostra que a adoção de uma tecnologia tão complexa como a SegWit não possui padrão de S, sendo motivada por saltos e puxada por fatores externos bem difíceis, como os retornos do Bitcoin. A adoção é puxada pela entrada de grandes players que tem outros motivos que adquirir uma inovação por gosto ou por imitação, decisões de negócio.
Nessa semana, foi anunciado que já há mais de 1000 usuários da Lightning Network, tecnologia off-chain que pretende resolver os problemas de escalabilidade do Bitcoin. Será que a Lightining Network segue o modelo de Bass? Há pessoas interessadas em entrar nela para conhecer. Conforme essas pessoas forem entendendo o uso dessa tecnologia, mais material sobre a plataforma será produzido e divulgado. Nisso, o mecanismo de Bass parece valer, sendo a intuição do modelo válida. Entretanto, é preciso lembrar que a adoção da Lightning Network depende da adoção da SegWit que, como vemos na figura acima, ainda patina.
No entanto, vale notar que a própria adoção da SegWit é fruto do mercado. Se houver demanda por menores fees e pela Lightning Network, carteiras e plataformas que adotarem as soluções serão mais procuradas. Isso possibilita lucros a quem implementá-las. A famosa frase de Ludwig von Mises valerá: “não é porque existem destilarias que as pessoas bebem whisky, é porque as pessoas bebem whisky que existem destilarias”. Não acho impossível crer que esse será o estímulo que falta para adotarem a solução SegWit que é extremamente benéfica para a blockchain do Bitcoin. Nesse caso, o modelo de Bass ainda parece válido e podemos esperar surpresas a respeito da adoção da Lightning Network.
Em resumo, os mecanismos parecem fazer valer o modelo, mas falta observar o número de usuários da rede off-chain e a adoção da SegWit voltar a crescer. Esse texto traz a intuição de que, quando menos esperarmos, a rede poderá estar sendo adotada e discutida em inúmeros lugares. Atenção aos fundamentos e aos dados nesse caso é importante para não ser pego de surpresa. Entretanto, vale o anúncio de que a análise de premissas importa mais do que a fé cega na curva ou em modelos. Extrema atenção vale não só para evitar surpresas, mas também para saber se efetivamente teremos surpresas.