“Se o inimigo foge, não o persiga. Não detenha um exército de volta para casa. Deixe sempre uma saída de fuga. Não acosse um inimigo desesperado.”
A lição que podemos apreender das frases acima é simples: se você quer que alguém desista de uma batalha, não o deixe sem saída. Uma pessoa acuada tem seu instinto de sobrevivência despertado e passa a tomar riscos que antes não estava disposta. Esse e outros ensinamentos são passados e estudados há mais de dois milênios em um dos livros sobre estratégia mais antigos e lidos no mundo: “A Arte da Guerra”, de Sun Tzu.
Para mim, a história de Hernán Cortés, conquistador espanhol responsável por liderar a expedição que levou à queda do Império Asteca, é uma das que melhor retrata a ideia acima.
Segundo a lenda, Cortés comandava cerca de 600 homens e teria que enfrentar uma civilização que possuía milhares de guerreiros. Sem muita saída e com seus homens desmoralizados e querendo embarcar de volta para casa, Cortés decidiu tirar essa opção da mesa ao destruir todas as suas embarcações. Pelo menos é assim que a história é contada — infelizmente, desconheço uma versão mais aceita pelos historiadores.
A decisão de Cortés encurralou seus homens e os deixou sem opção de fuga, pelo menos no curto prazo. O resultado foi interessante. Seu instinto de sobrevivência foi despertado e os levou a superar um desafio aparentemente intransponível.
E qual a relação disso com fundos de investimento?
Já imaginou o efeito psicológico que um prazo de resgate de 30 dias tem em você durante uma crise?
Quando um fundo cai muito, a primeira reação de um investidor inexperiente (sei que não é o seu caso) é pensar em resgatar. Se o prazo de resgate for curto, de cinco dias, por exemplo, provavelmente ele não vai pensar duas vezes, vai resgatar na hora.
O investidor assume que será o mais rápido e que será capaz de antecipar uma grande crise, reduzir suas perdas e, eventualmente, capturar uma recuperação. Assume que é mais esperto que todo o mercado, com suas equipes com décadas de experiência. Será mesmo?
Quando o gestor decide colocar um prazo de resgate de 30 dias ou mais, é acrescentada uma dose de incerteza no ato de resgatar do investidor. Fica aquele receio de que o mercado pode cair mais ou, ainda, que você pode ficar de fora de uma recuperação rápida.
Esse receio ou medo pode fazer com que o investidor acabe resistindo à tentação de curto prazo de resgatar, mantendo-se fiel aos motivos de longo prazo que o levaram a investir no fundo em primeiro lugar.
Se o medo não for suficiente, talvez o argumento a seguir te ajude a convencer algum conhecido ou amigo que não goste desses prazos longos. O Ibovespa teve 140 períodos de queda desde 1997. E entre essas quedas apenas dez superaram a marca de -15%.
No gráfico abaixo identificamos qual foi a média de performance do índice após cada uma das dez quedas. Repare que resgatar após uma grande queda é uma das piores coisas que você pode fazer para o seu dinheiro, considerando que em todos os prazos a média de retorno após o baque foi positiva. Quanto maior o prazo que olhamos, maior o benefício potencial de não sair do fundo.
Só esses dois argumentos já bastariam para uma defesa de prazos mais longos de resgate. Contudo, a ideia que levou os fundos a adotá-los teve origem no receio de o gestor ser obrigado a vender seus ativos com pressa, a preços muito descontados no mercado.
Já imaginou gerir um fundo no meio de uma crise como as de 2008 ou 2020? Você precisa entender o cenário, decidir o que fazer na carteira, responder às aflições dos investidores, lidar com venda dos ativos por conta de resgates e se preocupar em como remunerar e reter sua equipe em meio a uma perda relevante de receitas, estas diretamente atreladas ao patrimônio do fundo, que caiu por conta dos resgates e das perdas no mercado.
Alguns gestores podem até ser gênios, mas nenhum deles é super-herói.
O prazo de resgate reduz o efeito dos três últimos problemas. Dá tempo para o gestor vender os ativos sem pressa, ao mesmo tempo que ajuda a aumentar a tolerância de risco do investidor e diminui a perda de patrimônio.
Um grande abraço