Temos salientado que o “câmbio alto”, mais alto que o razoável, está impactando com força na cadeia de produtos agrícolas e pecuários exportáveis, provocando o “rebound” dos preços internacionais para a economia doméstica brasileira, provocando expressivo impacto inflacionário, e, adicionalmente com severo risco de ocasionar escassez.
A FAESC já admite a hipótese do Brasil vir a importar soja, a despeito de sermos um dos maiores exportadores do mundo, se não o maior, pois pode enfrentar problema de escassez de grãos, da mesma forma que foi evidenciada no arroz, e mais, ainda comprometer as cadeias produtivas de aves e suínos.
A visão prospectiva dos analistas está muito tênue a respeito deste agravamento, mitigado o impacto no IPCA e alavancado no IGP-M, fato que acarretará forte distorção nos ajustes dos preços da economia, com expressivo impacto redutor da renda dos consumidores.
Com esta perspectiva e já considerando que a recomposição da renda e do consumo na economia sinaliza ocorrência gradual e lenta, com perspectivas de achatamentos salariais e menor demanda, este desencontro forte e relevante entre indicadores inflacionários poderá ocasionar menor capacidade de consumo pela população, com reflexos no varejo, que já deve repercutir a redução dos programas assistenciais do governo relativos à pandemia do coronavírus.
Este desarranjo de captações/percepções tende a criar enorme impacto na desejada retomada da atividade econômica, que em última análise é dependente do consumo, a ponta final.
O governo está num novo “corner”, desta vez em relação ao preço do dólar estimulado para ser “alto” com foco em inúmeros objetivos de retomada da atividade econômica, poucos revelando algum sucesso, que está acostado num ambiente de relativa estabilidade entre R$ 5,00 e R$ 5,50, visto não ter, após as saídas de recursos estrangeiros em 2019 e início de 2020, perspectivas de demanda acentuada e, também, não ter da mesma forma perspectiva de oferta acentuada, que foi amplamente desestimulada pela contra ponta ao câmbio alto, qual seja o juro baixo.
Na realidade o que desponta é que ambos estão exacerbados face à realidade do país, tanto o câmbio alto quanto ao juro baixo, mas notoriamente foge à capacidade de interferência do governo a colocação de ambos os preços/indicadores em níveis palatáveis e equânimes com a realidade.
Contraditoriamente ao “habitual”, o câmbio não sugere perspectiva de pressão ocasionada pelo risco fiscal do país, podendo até mesmo ser considerado que se estivesse num patamar mais baixo estaria precificado e em linha com o CDS atual, visto que não há demanda legítima projetada pela posição de deveres do país, que detém substantivo volume de reservas e ainda o BC dispondo de instrumentos derivativos adequados para suprir a demanda, visto que o ambiente não sugere apostas especulativas contra o real.
Portanto, o preço do dólar precisaria ser depreciado no país, mas é fundamental que para tanto haja fluxo cambial positivo intenso para impulsionar o ajuste no preço, que neste momento está acomodado, mas não fundamentado, no patamar atual com a mediana de R$ 5,25.
Por outro lado, só há uma forma de criar atratividade do país aos investidores estrangeiros, que não vieram para a Bovespa estimulados pelo câmbio alto, que barateou o preço das ações, que seria para aplicações no mercado de renda fixa com a adequação da taxa de juro a melhor realidade no momento, e desta forma ativando o fluxo cambial favorável que deprimiria a taxa cambial pela oferta, reduzindo a pressão inflacionária decorrente, e favorecendo o governo na rolagem da dívida pública.
O imbróglio está montado, cabe ao governo mover neste tabuleiro a peça que pode mover, o juro, e daí buscar o ajuste em bases adequadas dos parâmetros de “câmbio alto e juro baixo”, já que quando foi lançada a ideia não houve definição dos parâmetros objetivados e nem das compatibilidades adequadas.
O BC/COPOM precisa ser o protagonista da gestão e não ficar à mercê do mercado nesta fase de adaptação ao “novo normal”. Contrariar faz parte do jogo.
O IBC-Br de julho deixou evidente que as expectativas precisarão ser atenuadas, pois 2,15% ante 3,40% de projeção evidencia que a trajetória será mais desafiadora do que os anseios têm indicado.
E a ocorrência de pressão inflacionária intensa seria devastadora para os anseios do país, até porque inflação é algo muito presente na memória brasileira.
O “novo” novo do cenário brasileiro ainda está sujeito a adequações e busca de seus pontos de equilíbrio, por isso será temerário se o governo fizer “vistas grossas” a realidade presente, pois os impactos negativos na economia poderão ser expressivos.