Inflação de Custos vs. Inflação de Demanda: Onde Foi Que a Heterodoxia se Perdeu?

Publicado 09.01.2018, 11:23

Inflação se combate com política monetária. Ponto pacífico na literatura e na prática dos bancos centrais, mundo a fora. Infelizmente, no Brasil, há um grupo de economistas alternativos, descolados demais para utilizar os modelos caretas aceitos no mundo todo, que pregam outra explicação para o processo inflacionário. Eles acreditam que a inflação brasileira seria eminentemente e na maior parte do tempo de custos, provocada, por exemplo, por preços administrados, por uma safra menor de alimentos, ou, os mais ousados, pela economia excessivamente oligopolizada. Se é esse o quadro, dizem esses economistas, a inflação não deve ser combatida com juros, um instrumento que atua basicamente sobre a demanda - e que deveria ser utilizada apenas para conter inflação de demanda. Qual é o equívoco com esse argumento, leitor?

Para explicar o equívoco com esse tipo de argumento, vamos considerar um modelo de quatro equações como abaixo:

Equações

Para um detalhamento desse modelo, consulte aqui. A Curva IS representa o lado da demanda, a Curva de Phillips representa o lado da oferta, a PTJ representa o contato com o setor externo e a Regra de Taylor diz como o Banco Central calibra os juros. A equação 2, por suposto, representa como a inflação se comporta ao longo do tempo, sendo afetada pelo componente regressivo, pelas expectativas de inflação dos agentes, pelo hiato do produto (que representa a ociosidade da economia), pela variação da taxa de câmbio e por , que representa choques de oferta, sendo supostamente um ruído branco. A ideia, por suposto, é que tudo o que não for explicado pelos fatores anteriores, entra em . Assim, uma quebra de safra, um aumento muito forte da energia elétrica, ou qualquer outro fator que os economistas alternativos chama de inflação de custos está em , isto é, entra como um choque de oferta.

Uma vez que ocorra um choque de oferta, o Banco Central não deve necessariamente reagir aos efeitos primários do mesmo, isto é, aos aumentos no preço de energia, de alimentos, etc. O que o Banco Central deve fazer, contudo, é circunscrever esse choque, evitando que haja efeitos secundários, isto é, efeitos sobre outros preços. Afinal, como qualquer pessoa sabe, energia elétrica é um insumo utilizado em todas as cadeias produtivas, logo se o preço dela aumenta, é razoável supor que haverá aumento em outros preços da economia. Alimentos, idem, assim como diversos outros bens e serviços, que são utilizados em várias cadeias produtivas.

Isso dito, não faz o menor sentido argumentar que o Banco Central não deve reagir a um choque de oferta ou à inflação de custos dos economistas alternativos. Se não o fizer, os efeitos secundários se proliferarão, bem como, o pior, as expectativas de inflação serão contaminadas, tornando mais custoso desinflacionar a economia.

Esse ponto, aliás, deveria ser muito claro depois do que ocorreu na economia brasileira. Afinal, acabamos de passar por um processo de forte aumento da inflação resultado de diversos expedientes recomendados por economistas alternativos. O governo Dilma Rousseff abdicou de controlar a inflação por meio da taxa de juros, fazendo uso do controle de preços. Não deu certo, como todos sabiam que não daria. Teve de voltar atrás, provocando um aumento de preços administrados assim que a eleição de 2014 terminou. Paralelo a esse controle artificial da inflação, as expectativas se desancoraram, fazendo aumentar a inércia inflacionária, tornando mais custosa a desinflação. Não à toa, foi só quando mudou o comando do Banco Central que a inflação começou a ceder.

Está tudo muito documentado em jornais, revistas, livros, blogs, etc. Confesso, diante de tudo isso, que acho simplesmente inexplicável que alguns economistas brasileiros continuem achando que não se deve utilizar política monetária para controlar a inflação. Diante disso, é esperar pelo próximo choque heterodoxo e pela subida da inflação e pelo stop and go no crescimento... Triste, não?

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