Quinta-feira foi um dia de incertezas nos mercados, primeiro pelos imbróglios em torno da reforma tributária, ainda cheia de incertezas, também pela saúde do presidente Bolsonaro, ainda internado em São Paulo, também pela aprovação do Orçamento (LDO) e por fim, depois de mais um discurso do presidente do Federal Reserve Jerome Powell no Senado, que mais causou dúvidas do que certezas.
Discurso de Powell
Depois de mais um discurso no Senado os debates giravam agora em torno dos próximos passos do Fed, ainda mais depois de Powell ter se mostrado desconfortável com a inflação, para ele, “acima do esperado”. Disse ele que a inflação está “bem acima da meta e de que tem acelerado de forma surpreendente”. Receio maior aqui é que o Fed acabe “atrás da curva”, tal qual observamos no Banco Central Brasileiro.
Mesmo assim, Powell reforça considerar a política atual adequada, reafirmando sua postura dovish. Considera a postura do Fed “apropriada” e lembra da variante Delta, o que pode impactar na retomada da economia global. Muitos, aliás, como Janet Yellen, do Tesouro, consideram a inflação mais elevada agora como “transitória”, não se propagando nos próximos meses. Powell, no entanto, considera já haver um debate entre os diretores, sobre o timing para o início do aperto monetário (retirada dos estímulos).
Reforma tributária
Na Câmara, as negociações ainda seguem intensas, com o parecer do relator Celso Sabino devendo ser definido em agosto, depois do recesso. Nossa sensação, no entanto, é que a reforma é insuficiente para melhorar a estrutura tributária do País, mais uma proposta cheia de "remendos" para retirar recursos do setor financeiro e dos governos subnacionais, para direcioná-los aos projetos e decisões eleitorais do presidente Bolsonaro. Lembremos que o auxílio emergencial foi postergado por mais três meses, até outubro.
Lembremos que esta reforma tributária é definida em três etapas, a primeira, com a fusão do PIS e Confins na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), a segunda, atual, com alteração nas alíquotas do IRPF e na taxação de fundos, e a terceira, talvez com a criação do IVA. Nesta segunda, o cerne está na elevação da faixa de isenção do IRPF para R$ 2,5 mil, contra R$ 1,9 mil antes, e no IRPJ na taxação reduzida de 25% para 12,5% até 2023. Deve ser mantida também a alíquota adicional de 10% para as empresas com lucro acima de R$ 20 mil.
O governo segue "costurando acordos" para tentar levar adiante estas medidas.
O desafio maior agora será encarar as críticas entre os "entes subnacionais", insatisfeitos com esta nova versão. Calculam-se perdas entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões para governadores e prefeitos, entre 77% e 90% de impacto da redução total da carga tributária com a queda do IRPJ. Outro ponto polêmico é a diminuição das faixas nas quais é possível fazer a declaração simplificada, que deve aumentar em até R$ 10 bilhões a arrecadação.
Na leitura do Ministério da Economia, para compensar possíveis perdas de receita, é objetivo cortar até R$ 30 bilhões em subsídios e torcer para a recuperação da economia e o aumento da arrecadação federal, o que pode compensar parte destas perdas com o IRPJ. Segundo Guedes, a recuperação da arrecadação no primeiro semestre ficou R$ 100 bilhões acima do esperado.
Uma preocupação a mais é de que esta reforma fatiada não permite avaliar o impacto das mudanças como um todo. Estudos preliminares sobre a segunda etapa indicam perda de arrecadação em torno de R$ 115 bilhões, compensada com mais R$ 85 bilhões em corte de subsídios, taxação de dividendos (20%) e fim da isenção do JCP.
A retirada dos benefícios tributários em 20 mil empresas dos setores de cosméticos, perfumaria, medicamentos, aeronaves, devem impactar as empresas de setores (fármacos, Embraer (SA:EMBR3), laboratórios, redes de hospital) listados em bolsa de valores. Por outro lado, o retorno da isenção para os fundos imobiliários, devem turbinar os setores de shopping e construção.
CPI da Covid
O depoimento do empresário Cristiano Carvalho, representante da Davati Medical Supply, deve ter como consequência a convocação de um grupo de militares, que trabalharam no ministério da Saúde na gestão Antônio Pazuello.
O coronel Elcio Franco, número 2 da gestão Pazuello, desponta como principal personagem, mas o depoimento de ontem destacou as ações do coronel Marcelo Blanco, ex-assessor no departamento de logística do ministério da Saúde, então sob o comando de Roberto Dias. A questão será como o ministério da Defesa e os comandos das Forças Armadas reagirão com a provável continuidade dessa linha de denúncia e investigação, após a nota com duras críticas ao presidente da CPI, senador Omar Aziz.
Aprovação da LDO
Pegou muito mal o forte aumento do financiamento público de campanha de 2022, passando de R$ 2 bilhões para R$ 5,7 bilhões. O presidente Bolsonaro terá que vetá-lo, mesmo devendo contrariar sua base no Congresso. A LDO determina as metas e prioridades para os gastos do governo no ano que vem.
Mercados. Neste clima de açodamento, cercado de incertezas, os mercados operaram sem rumo nesta quinta-feira. O Ibovespa devolveu parte dos ganhos nos últimos três pregões, em baixa de 0,73%, a 127.467 pontos. Na semana, o índice paulistano avança 1,63%, acumulando no mês 0,53% e no ano 7,1%. Já o dólar fechou em alta de 0,6%, a R$ 5,1147. Na semana, a queda da moeda norte-americana é de 2,38%. Já no exterior, o dólar, frente à seis moedas, pelo DXY, operou em alta durante o dia, para fechar a 92,5 pontos.
Na agenda desta sexta-feira, no Brasil o Monitor do PIB de maio, que deve confirmar a queda no PIB antecipada pelo IBC-Br, além do IGP-10 e do IPC-S da segunda quadrissemana de julho, nos colocando a par das tendências de inflação. No exterior, destaque para as vendas no varejo dos EUA e o CPI da zona do Euro, ambos de julho.
Vamos conversando.