A quarta-feira é marcada pela decisão de juros dos bancos centrais do Estados Unidos (Fed), à tarde, e do Brasil (Copom), após o fechamento do pregão local. Até lá, o mercado financeiro deve ter poucas movimentações, esperando o cronômetro passar à espera do apito final. Mas foi a tabelinha entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes (Economia) sobre o Renda Brasil que trouxe nervosismo entre os investidores ontem.
O que era para ser uma boa notícia, do ponto de vista fiscal, acabou virando um revés no jogo político. A fala do presidente, de que merece levar um “cartão vermelho” quem sugeriu compensar os gastos do novo programa social com o congelamento e a desindexação das aposentadorias, esquentou o clima nos bastidores, pouco tempo depois de Guedes ter levado um “carrinho” de Bolsonaro, na disputa sobre o “teto dos gastos”.
Por mais que a turma do “deixa disso” tenha entrado em campo, o comportamento dos ativos locais ontem evidenciou essa pressão interna. O Ibovespa titubeou na faixa dos 100 mil pontos, sem forças para acompanhar mais um dia de ganhos em Wall Street, ao passo que o dólar voltou a se aproximar dos R$ 5,30, depois de ter vindo abaixo de R$ 5,25 no início da sessão, e a curva a termo de juros futuros recompôs mais um pouco de prêmio.
De qualquer forma, a decisão de Bolsonaro de abandonar a ideia de substituir e ampliar o Bolsa Família até o fim do mandato traz certo alívio às contas públicas, em um momento que ainda não se sabe como o Orçamento de 2021 irá cobrir as despesas sem “furar” o “teto”. Mas é preciso combinar com o Congresso, que já articula a criação de um programa de renda mínima mais abrangente.
A fragilidade fiscal deve ser um dos temas de discussão durante a reunião do Copom, além do ritmo da recuperação econômica, doméstica e global, em tempos de pandemia, e da pressão nos preços vinda do atacado e da valorização do dólar. Ao final de todo esse debate, espera-se que o BC brasileiro interrompa o ciclo de cortes, iniciado em julho de 2019, e mantenha a Selic em 2%. A dúvida é se deixará uma fresta para novas quedas.
Fed abre o dia
Mas antes da decisão do Copom, o mercado financeiro acompanha os eventos do dia envolvendo o Fed. Mais que a decisão em si - que não deve trazer novidades, com a taxa de juros nos EUA seguindo no intervalo entre zero e 0,25% no qual está desde março - é grande a expectativa pelas projeções para a economia norte-americana. Ambos serão conhecidos às 15h.
A novidade fica com a inclusão do ano de 2023 no chamado gráfico de pontos (dot plot). Porém, depois que o presidente do Fed, Jerome Powell, sinalizou, no simpósio virtual em Jackson Hole de que irá tolerar uma inflação mais alta ao menos até que o desemprego caia abaixo de um nível natural, o mais provável é de que as metas do duplo mandato só sejam alcançadas em 2024, quando os juros dos EUA devem começar a se mover.
Ou seja, não se espera uma orientação detalhada para o horizonte relevante à frente. Por isso, também merece atenção a entrevista coletiva de Powell, a partir das 15h30. Será a primeira vez que Jay irá responder a perguntas desde que anunciou mudanças na estratégia de política monetária, no fim de agosto, e pode ser a oportunidade para revelar uma discussão mais aprofundada do Fed sobre a nova abordagem.
À espera desses eventos, os índices futuros das bolsas de Nova York exibem ganhos moderados, estendendo a alta observada na sessão regular ontem. As principais praças europeias tentam acompanhar o sinal positivo vindo de Wall Street, mas só irão reagir ao Fed no pregão de amanhã, quando o BC inglês (BoE) também anuncia sua decisão de política monetária.
A Bolsa de Londres, aliás, está no vermelho, após dados ruins sobre o mercado de trabalho no Reino Unido, que eliminou 700 mil vagas desde março, por causa das medidas de bloqueio (lockdown) para conter a disseminação de covid-19. Na Ásia, a sessão foi mista, com leves ganhos em Tóquio e ligeira baixa em Hong Kong, enquanto Xangai caiu (-0,4%), com os investidores adotando o modo “esperar-para-ver” a decisão do Fed.
Nos demais mercados, o petróleo avança, mas o barril do tipo WTI segue cotado abaixo de US$ 40, enquanto o dólar perde terreno. Destaque para o iene japonês, que é cotado na faixa de 105 por dólar, reagindo à renúncia oficial do primeiro-ministro Shinzo Abe e seu gabinete, abrindo caminho para a posse de Yoshihide Suga, e ao tombo menor que o esperado (-14,8%) das exportações no Japão em agosto.
Dia de agenda cheia
Além das decisões do Fed e do Copom, a agenda de indicadores econômicos também merece atenção. O destaque fica com o desempenho do varejo nos EUA em agosto (9h30). A expectativa é de manutenção no ritmo das vendas, com crescimento de 1%. Ainda por lá, também serão conhecidos os estoques das empresas em julho e o índice de confiança das construtoras em setembro, ambos às 11h.
Às 11h30, é a vez dos estoques semanais norte-americanos de petróleo bruto e derivados. Após os eventos envolvendo o Fed, o calendário nos EUA traz ainda o fluxo de capital estrangeiro no país em julho (17h). No Brasil, logo cedo (8h) sai o primeiro IGP do mês, o IGP-10, que deve reforçar as prévias e mostrar pressão nos preços do atacado. À tarde (14h30), é a vez dos dados parciais sobre a entrada e saída de dólares (fluxo cambial).