Inevitável lembrar daquela artista que numa entrevista disse que daria uma guinada de 360 graus em sua vida. Antes fosse assim para o Brasil, pois voltaríamos ao mesmo lugar. Mas não foi nada disso, e tivemos de dar guinada de 180 graus.
O coronavírus nos pegou justamente no momento em que o país se preparava para mudanças radicais, levando a cabo reformas estruturantes importantes que certamente tornariam nossa economia mais confiável, com mais competitividade e com melhoria à produtividade. Começando pela reforma da Previdência, passaríamos pelas reformas tributária e administrativa, chegaríamos às privatizações em massa, no pacto social; e ainda a uma infinidade de mudanças no plano micro, não menos importantes.
Pois bem, a pandemia do coronavírus promete mudar o mundo em diferentes aspectos assim que, literalmente, houver tempo para aprendermos os ensinamentos, mudando as relações humanas, o entendimento entre países e as relações comerciais do planeta. Vai mudar também, no plano micro, o relacionamento e a forma de comunicação das pessoas, tornando-nos bem mais acessíveis e cordatos em nossas relações humanas, entre empresas e empregados mais próximos. Certamente a pandemia deixara muitas lições para ser aprendidas por todos nós. Porém, a que custo?
O planeta estará em recessão em 2020, exceto talvez a China. onde tudo isso começou, mas que também terá enormes perdas, já que seu crescimento provavelmente será reduzido em cerca de 3%. No resto do mundo, todos os continentes entrarão em recessão. E coitados dos países emergentes, principalmente aqueles que estavam desorganizados em suas finanças públicas, ou aqueles que estavam na direção correta para buscar o equilíbrio.
Aqui, o esforço que teremos de fazer mudou drasticamente as prioridades do governo de Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes. O ministro da economia Paulo Guedes fala de esforços generalizados que já somam R$ 750 bilhões, que soam ainda insuficientes para domar os problemas da economia. Precisamos de recursos urgentes para a saúde, precisamos proteger os vulneráveis da saúde e trabalhadores informais, as empresas de pequeno e médio porte (as grandes também); pois será com eles que o país buscará, mais à frente, a recuperação economia.
É um esforço de guerra contra um vírus não tão letal do ponto de vista da saúde, mas absolutamente cruel para as economias. A maior economia do planeta terá recessão, a zona do euro com sua locomotiva Alemanha em recessão profunda, a Ásia profundamente afetada e América Latina e seus emergentes sofrendo muito.
Aqui, esqueçam o déficit primário, que poderia ficar em algo como R$ 80 bilhões, pois provavelmente passaremos de R$ 350 bilhões. Esqueçam também aquele crescimento previsto de 2,5% (nada para encher os olhos), e vamos considerar o oposto disso, com uma recessão de igual tamanho ou maior, e ainda o nível de endividamento abaixo de 80%. Esqueça por hora todas as reformas, o pacto federativo, a queda do desemprego (vai subir para mais de 13%/14%), o processo de privatização e venda de ativos, os investimentos externos e de empreendedores locais e a Ibovespa chegando aos 130 mil/140 mil pontos. Tudo isso ficou para depois.
E o “depois” terá de ser de ajuste ainda mais duro para colocar o Brasil nos eixos. Será preciso que, nessa transição, seja tomado o cuidado de separar tudo que for circunstancial do que seria o ajuste social estrutural e trabalhar nessas duas vertentes simultaneamente. Dessa maneira, não teremos direito de errar em manter políticas contracíclicas por muito tempo, a exemplo do que foi feito no governo do PT. É fundamental não esquecer as reformas que estavam no pipeline, pois será com elas que recuperaremos nossa credibilidade e tornaremos o Brasil crível.
Mais uma vez, vamos ter de apostar na vontade política de nossos dirigentes de produzir as mudanças que necessitamos. Vamos continuar torcendo.