Em artigo escrito recentemente citamos que o Brasil estava fazendo piquenique à beira do vulcão, por conta dos riscos incorridos. Hoje voltamos ao tema, pois essa é certamente a preocupação maior: o que fazer nos próximos meses! Como consertar a economia depois de tudo que foi feito durante a pandemia, ainda que tenha sido, como foi, da forma correta?
Para começo de conversa, o Brasil foi, dentre os emergentes de maior porte, aquele que mais gastou durante a pandemia. Nossa dívida pública saltou de algo como 75% do PIB, para o patamar de quase 89% no final do terceiro trimestre, enquanto outros emergentes possuem grau de endividamento próximo da metade. Já entramos mal nessa crise e é preciso sinalizar corretamente o que faremos.
Nossa inflação começa a mostrar sinais preocupantes no mais longo prazo, muito embora no curto não ofereça perigo iminente. Mas temos que observar alguns alertas emitidos pelo Bacen mais recentemente sobre necessidade de reformas e também o do secretário do Tesouro, dizendo que o ajuste fiscal passa por reformas que precisam elevar a produtividade. Nesta semana, teremos a decisão do Copom sobre juros que deve manter a Selic estabilizada em 2%, mas as taxas dos títulos mais longos (2025 e posteriores) mostram fortes altas, além de pressão. Além disso, o Tesouro encontra dificuldades para acatar as ofertas apresentadas pelos agentes do mercado e encurta ainda mais o prazo da dívida.
Cabe lembrar levantamento dando conta que ao longo do primeiro quadrimestre de 2021, teremos vencimentos de dívidas que ascendem a 15% do PIB, em montante estimado de R$ 643 bilhões. Enquanto isso não ocorre, o Congresso Nacional fica praticamente paralisado pelas próximas eleições municipais, alongando prazo para decisões de grave importância que deveriam estar sendo tomadas. A partir disso, muitos políticos já falam em estender o auxílio emergencial no início do próximo ano (e talvez seja mesmo necessário), ou arranjar fonte de recursos para financiar os programas de renda mínima. Diante disso, voltamos para o velho novo de arrecadar mais, com a sempre lembrada liberação de jogos no país.
Ficamos sabendo que o presidente Bolsonaro tem liberado emendas parlamentares que atingem R$ 17,2 bilhões, a maior desde 2015, no afã de atrair para perto o denominado centrão, para conseguir maior agilidade e facilidade para governar. Enquanto isso, as reformas dormitam nos escaninhos do Executivo e do Legislativo, com o Brasil perdendo tempo precioso. As privatizações e concessões não evoluem (seriam somente paliativos do déficit endêmico), os marcos regulatórios também não, e mesmo aqueles que foram votados e aprovados precisam voltar para avaliar vetos e serem retocados, como o marco do saneamento.
Nesse período de vacas magras, os investidores estrangeiros se mantêm arredios. Na Bovespa, pelo segundo ano seguido, recursos são sacados. Até 21/10 tinham saído liquidamente R$ 84,9 bilhões, depois de saques em 2019 de R$ 44,5 bilhões. Na dívida pública, os investidores não residentes que já detiveram no passado algo como 20% do total, hoje pouco superam os 9%. Já o investimento direto no país (IDP) cai forte nos dois últimos meses, em setembro ficaram tão-somente em US$ 1,6 bilhões, acumulando US$ 28, 55 bilhões, de projeção oficial para 2020 de US$ 50 bilhões. Para sermos justos, em 12 meses o IDP está em US$ 50 bilhões.
Já as agências de classificação de risco estão no aguardo das decisões adotadas, e nos arriscamos a dizer que qualquer desvio em relação a furar o teto de gastos, alongamentos de benefícios em função da pandemia ou demora em reformas; podem fazer com que o Brasil seja rebaixado, ficando ainda mais longe dos recursos dos investidores estrangeiros.
A situação que se apresenta é a seguinte: ou encaramos a realidade de um horizonte tempestuoso e seguimos o receituário macroeconômico, ou vamos ficar para trás na atração de investidores e empreendedores.
“Os grandes navegadores devem sua reputação aos temporais e tempestades”— Epicuro
Alvaro Bandeira é Sócio e Economista-chefe do banco digital modalmais