Recentemente, o governo anunciou uma Medida Provisória (MP) que traz mudanças significativas para a tributação de fundos exclusivos. Contudo, o impacto da medida é mais extenso do que inicialmente se pensava, influenciando diretamente produtos financeiros bastante populares entre os brasileiros, como os Fundos Imobiliários (FIIs) e os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros).
Novo critério para isenção
O texto da MP, nos artigos 23, 24 e 30, nos ajudam a esclarecer a nova regra:
"Art. 23. O disposto nesta Medida Provisória, ressalvado o disposto no art. 24, não se aplica aos seguintes fundos de investimento: 1 - os Fundos de Investimento Imobiliário - FII e os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais - Fiagro, de que trata a Lei n° 8.668, de 25 de junho de 1993".
Art. 24. A Lei n° 11.033, de 2004, passa a vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 30 (...), III - na fonte e na declaração de ajuste anual das pessoas físicas, os rendimentos distribuídos pelos Fundos de Investimentos Imobiliário e pelos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais - Fiagro cujas cotas sejam admitidas à negociação exclusivamente em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado e sejam efetivamente negociadas em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado;
Parágrafo único. (...), I - será concedido somente nos casos em que os Fundos de Investimento Imobiliário ou os Fiagro possuam, no mínimo, 500 (quinhentos) cotistas;"
Observe que o parágrafo único do artigo 24 estabelece a única alteração que pode afetar o benefício tributário (isenção do IR) para os investidores (pessoa física) dos fundos imobiliários. A principal mudança é a nova exigência de um mínimo de 500 cotistas para que os FIIs e Fiagros se beneficiem da isenção nos rendimentos ou dividendos. Anteriormente, a barreira era de apenas 50 cotistas. A outra mudança é que estes fundos agora precisam ser efetivamente negociados no mercado, seja na Bolsa de Valores ou no mercado de balcão.
Impacto e Consequências
Estas mudanças visam aumentar a arrecadação e contribuir para o equilíbrio das contas públicas e compensar o aumento da faixa de isenção do IR, com uma expectativa de arrecadação de R$ 24 bilhões de 2023 a 2026, segundo estimativas do Ministério da Economia.
Podemos avaliar o impacto como limitado, pois a alteração afeta mais os fundos imobiliários patrimoniais, geralmente constituídos por famílias de elevado patrimônio e alguns fundos de gestoras de recursos independentes de pequeno e médio porte.
A nova regra passa a representar um grande obstáculo para estratégias de planejamento patrimonial e sucessório através dos Fiagros e dos FIIs. Dessa forma, até que a MP seja aprovada no Congresso, muitos irão se apressar para promover a revisão das suas estratégias tributárias e patrimoniais. A expectativa é que a mudança entre em vigor a partir de 1º de janeiro de 2024.
Até lá devemos observar quatro movimentos no mercado por parte daqueles que ainda não cumprem a nova regra para o benefício tributário: (i) corrida para aumentar a captação de novos cotistas; (ii) união de fundos menores; (iii) consolidação de fundos menores em fundos maiores; e (iv) "split" ou divisão das cotas para tornar o valor mais acessível.
Resumo das mudanças
Quanto ao "come-cotas": os fundos imobiliários continuam isentos.
Quanto à tributação dos dividendos: hoje, os dividendos são isentos para fundos listados na Bolsa de Valores que tenham ao menos 50 cotistas, sem a necessidade de efetiva negociação no mercado acionário. Com a MP, o fundo precisará ter no mínimo 500 cotistas e ser efetivamente negociado na Bolsa de Valores ou no mercado de balcão.
Uma dúvida que tem surgido diz respeito aos FOFs (fundos que compram cotas de outros fundos). Imagine que o fundo imobiliário FIPP11 possui 20 mil cotistas e comprou cotas do fundo imobiliário EXEM11 que, por sua vez, possui apenas 200 cotistas. Como aplicar a nova regra nesse caso? É simples. Os cotistas (pessoa física) do fundo FIPP11 ficam isentos, pois o fundo cumpre a nova regra. Já os cotistas (pessoa física) do fundo EXEM11 serão tributados, pois o fundo não cumpre a nova regra.
A boa notícia que poucos perceberam
O principal destaque da MP passou despercebido por grande parte do mercado. Explicitamente, a MP afirmou que os FIIs e Fiagros não estão na mira da sede arrecadatória do governo, dissipando um dos principais temores do mercado. A literatura a respeito dos fundos imobiliários costuma fazer um destaque ao comentar sobre os benefícios de se investir em fundos imobiliários, mencionando a eventual tributação dos rendimentos ou dividendos como um risco que paira sobre o tema. A MP, claramente, afasta esse fantasma da tributação.
É importante destacar que a isenção do IR para os investidores (pessoa física) é apenas mais um dos benefícios de se investir em fundos imobiliários. Temos outros benefícios, como maior liquidez, menor burocracia, maior diversificação e uma gestão profissional dos imóveis ou negócios imobiliários que compõem o portfólio de um fundo imobiliário.