O ano de 2020 foi duro para os fundos de ações (FIAs) brasileiros. De forma geral, muitos gestores renomados ficaram atrás do Ibovespa no ano.
Os resultados, em média, não foram bons, o que é um fato. Em um ano no qual a bolsa teve uma das recuperações mais rápidas da sua história, muitos investidores se decepcionaram com os números.
Com as resoluções para 2021 já começando a aparecer, a pergunta que atormenta muitos cotistas é: “será que eu deveria pedir resgate do meu fundo por conta da performance “ruim” vista em 2020?”
Essa é a fonte de angústia que eu mais vejo, então queria dedicar um tempinho para conversar com você sobre esse tópico hoje. Seria essa a melhor métrica? Será que bons fundos realmente batem o Ibovespa todos os anos?
O paradoxo do curto e longo prazo
Quem me acompanha há mais tempo por aqui sabe do meu apreço em olhar os dados, e hoje não será diferente. Precisamos nos basear neles antes de mais nada.
Fiz uma seleção dos fundos que seguiam duas regras simples: i) estão na classificação Anbima como “ações livres" e ações de crescimento e (ii) possuem 10 anos de histórico.
Chegamos a uma amostra com pouco mais de 200 candidatos. Essas duas características são importantes, pois conseguimos avaliar boa parte da indústria de gestores ativos e a sua atuação em um horizonte com 2 ciclos de mercado (bull market e bear market). Há todo tipo de fundo nessa amostra, inclusive lendas como Atmos e Dynamo.
O interessante é que, quando analisamos os dados, somente 1 por cento dos fundos bateu o mercado em todos os anos desde 2011, o que eu diria que é irrisório. Além disso, se olharmos os últimos 5 anos, somente 4,90 por cento dos fundos superaram a bolsa em todos os anos.
Fonte: Nord Research e Economatica.
Ainda assim, considerando o período de 10 anos completos, 78 por cento dos gestores desse estudo superaram o Ibovespa. Como será que isso é possível?
É nas quedas que a mágica acontece
Nos últimos 5 anos, os resultados da bolsa foram impressionantes e permitiram multiplicação de capital incríveis.
Em momentos como este – de grandes subidas da bolsa – no imaginário geral dos investidores, profissionais de fundos de investimento deveriam ter resultados ainda superiores ao índice.
Faz total sentido, ainda mais porque eles são mais experientes. Entretanto, olhando para a história, não é exatamente o que acontece. Quando avaliamos os dados, 45 por cento dos gestores superaram o Ibovespa somente em 1 ou 2 anos, e 78 por cento não ultrapassaram 3 anos vitoriosos. Ou seja, a vasta maioria passou pelo menos 2 anos sem bater o índice.
Eis, então, a pergunta: se os fundos não superaram o índice nas subidas, como é possível terem entregado retornos maiores que o Ibovespa em 10 anos? A resposta é bem simples: porque eles recuam menos que a bolsa nos ciclos de bear market do mercado.
Historicamente, a maior parte dos bons gestores conseguiu recuar menos que o Ibovespa em momentos de maior adversidade, por meio de um portfólio equilibrado e um bom stock picking.
Isso é bem comprovado pelos dados: se olharmos o último ciclo de queda mais estrutural do mercado, entre 2011 e 2015, 51 por cento dos gestores conseguiram bater o Ibovespa em todos os anos e75,8 por cento dos gestores superaram o índice em 4 anos.
Fonte: Nord Research e Economatica.
É nos momentos mais difíceis que a mágica acontece. Então, se o seu fundo não bateu o Ibovespa em 2020, não se preocupe. Esse fator, por si só, não coloca ele na caixinha de “gestores ruins”. Como eu sempre busco dizer por aqui, precisamos olhar para muitos outros pontos além desse.
Gaste energia no lugar certo
É compreensível que a maioria das pessoas adote o resultado na cota como o fator mais relevante a se olhar em um gestor de fundos, afinal, é o que mais salta aos olhos. Eu entendo, de verdade, mas você não deve focar suas energias nisso.
É ainda mais importante avaliar a capacidade do gestor de gerar aqueles retornos no futuro. Isso nunca estará diretamente espelhado na cota, então precisamos ir mais fundo. A meu ver, dois são os pontos importantes na gestão de recursos: pessoas e processos.
A gestão de recursos é um trabalho de pessoas, então é preciso conhecer exatamente a quem você está confiando o seu patrimônio. Perguntas como: “quem faz parte do time?”; “há quanto tempo trabalham juntos?” e “houve alguma saída importante da equipe?” apontam aspectos que devem ser levados em consideração. Fora isso, você deve conhecer todos os processos que envolvem a gestora, por exemplo, qual o processo que gera as ideias de investimento para o time.
Os gestores não acordam de manhã com um sonho divino de comprar VALE3; na verdade, isso envolve todo um estudo por trás.Então entender os processos de entrada de ações novas na carteira, saída e erros cometidos é mais importante do que saber qual ticker novo entrou na carteira.
Um abraço