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Fogo no Parquinho

Publicado 17.04.2020, 13:22

Crise Institucional

Ontem, em entrevista ao canal jornalístico CNN Brasil, o Presidente Jair Bolsonaro fez duras críticas ao Presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Segundo ele, não há problema com o Parlamento, mas sim com a "péssima" atuação do líder da Câmara, que estaria colocando a conta da crise no colo da presidência.

As desavenças giram em torno, principalmente, do projeto de socorro aos Estados. Sem contrapartidas fiscais, como era de desejo do ministro Paulo Guedes, os Estados receberiam em torno de 80 bilhões de reais para compensar as perdas com ICMS e ISS.

Além deste projeto, novos socorros estariam sendo encaminhados para pauta, nos quais o governo federal seria o último provedor. Segundo o Presidente: "Não temos como pagar uma dívida monstruosa que está alí".  

Há alguns dias, Rodrigo Maia havia dito em uma entrevista que conversou com economistas e "não havia consenso sobre o limite de endividamento interno do Brasil".

Assustado, o Tesouro soltou uma nota dizendo que já estava, antes mesmo da crise, tendo dificuldades de colocar seus títulos de dívida no mercado, e que nenhum governo tem capacidade de se endividar infinitamente e controlar a inflação simultaneamente. A fala foi: “Ainda que, em tese, um governo possa ofertar quantos títulos quiser, ele só poderá emitir se tiver alguém que os compre”.

As palavras de Bolsonaro devem causar um desconforto na Câmara. Apesar de não ser possível antecipar onde tudo isso vai acabar, é possível antecipar que haverá baixa articulação para medidas econômicas necessárias.

Quando a crise do coronavírus chegar ao fim, estaremos com uma economia frágil, uma conta fiscal grande (estimativas de déficit para 2020 estão em cerca de 8 por cento do PIB) e uma vontade enorme de voltar a crescer.

Mas, para que a recessão não se prolongue, precisaríamos de coordenação entre os poderes, com garantias de que a piora fiscal será apenas temporária, somada com medidas de estímulo à produtividade (reformas estruturais). Na minha visão, não parece que isso vai acontecer. A guerra entre o executivo e o legislativo deve manter estes projetos paralisados, por falta de acordo.

Isso deve gerar duas consequências. A primeira seria uma demora um pouco maior da retomada do crescimento. A segunda, em termos de mercado, seria manter um prêmio de risco mais alto nos juros longos.

O gráfico abaixo mostra os juros prefixados de 10 anos subtraído dos juros de 2 anos, dando ideia do tamanho de prêmio de risco embutido nos juros longos.

Fonte: Bloomberg

Podemos ver que estamos em níveis máximos históricos. Ou seja, mesmo com os juros de curto prazo em níveis mínimos, os juros longos estão altos, cobrando muito prêmio para financiar o país no longo prazo.

Por todo o risco fiscal da medida de socorro aos estados, levando a Dívida Bruta para em torno de 100 por cento do PIB, além do desentendimento dos poderes, esse prêmio não irá se esgotar tão cedo.

Ontem, com a aprovação em primeiro turno no Senado da PEC da Guerra, que permite entre outros que o BC compre títulos longos, o mercado derrubou as taxas do mercado futuro. O Banco Central, quando empoderado pelas medidas, deve atacar exatamente este problema, pois juros longos altos atrapalham a retomada do país, deixando mais caro todos os financiamentos de longo prazo.

Enquanto o Brasil segue batendo a cabeça, outros países já se preparam para suportar a economia de forma organizada e com alta dose de estímulos.

Os Estados Unidos anunciaram ontem diretrizes para iniciar a abertura da quarentena, dando ânimo aos mercados nesta manhã, juntamente com boatos de novos acordos entre Rússia e Arábia Saudita (para novos cortes na produção de petróleo) e esperanças de um novo medicamento (Gilead) de combate ao coronavírus, que tem se mostrado altamente eficaz em pacientes graves.

A China já experimenta a liberdade, embora não esteja funcionando em plena capacidade. Mas já podemos perceber impactos da crise e da quarentena nos dados econômicos. O PIB do primeiro trimestre, anunciado ontem, mostrou queda de 6,8 por cento, enquanto o mercado esperava queda de 8 por cento. A produção industrial caiu 1,1 por cento em março, enquanto a expectativa era de queda de 7,5 por cento. Setores ligados ao lazer, como shopping e hotéis ainda sofrem, enquanto vendas on-line ganham mercado.

A diferença de capacidade de crescimento e organização entre nós e eles, assim como a baixa diferença atual dos juros reais, deve manter o dólar contra o real em patamares elevados.

Por fim, o efeito para nossas empresas será bem distinto entre tamanhos e setores. Empresas pequenas e médias devem sofrer bastante com o baixo acesso ao crédito e taxas caras. Empresas grandes, líderes de setor e com caixa elevado, devem aproveitar o momento para ganhar espaço, consolidarem-se e se colocarem melhor posicionadas para quando vier a recuperação.    

Lembrando que a bolsa brasileira reúne as maiores e melhores empresas do país, e uma boa parte delas não tem relação com crescimento doméstico, mas possuem exposição ao crescimento no resto do mundo — que deve ser melhor que o local. Apesar disso, boa parte delas tiveram quedas agressivas nos preços de suas ações, gerando grandes oportunidades.

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