Não é de hoje, mas pela movimentação presente, o fluxo cambial carreado para o Brasil passou a chamar a atenção. Faz tempo que isso já vem acontecendo e nos remete ao final do ano passado, desde quando o Bacen começou a acelerar a alta da Selic. Quando a taxa Selic estava em 2%, suspeitávamos que tinham ido muito longe no que tange a queda. Hoje, essa suspeita se tornou verdadeira.
Falava-se que o Bacen estava andando atrás da curva de juros. O Bacen não se fez de rogado e passou a elevar a taxa Selic, prevendo o estouro (longe) do teto da meta com a inflação oficial medida pelo IPCA de 10,06% em 2021, exigindo carta para o Conselho Monetário Nacional explicando o motivo do estouro. Taxa de câmbio deslocada, chuva em lugares errados, seca produzindo quebra de safra e gargalos na cadeia de insumos foram os motivos alegados.
Hoje, temos a taxa Selic em 10,75%, com expectativa de ficar perto de 12,50%/13% no final do ciclo, com reduções no final do ano podendo ser postergadas, ficando na dependência de muitos fatores, alguns que fogem do nosso controle, como possível invasão e guerra entre Rússia, Ucrânia e separatista, mas também a velocidade com que o FED e outros bancos centrais desenvolvidos possam imprimir nos próximos meses.
Na última sexta-feira, aparentemente, um dos mais importantes membros do FOMC (comitê de política monetária do FED), John Williams, de NY, deu o tom ao dizer que não via como fundamental iniciar com forte alta de 0,50%, que outros membros vinham defendendo. Mas é certo que no mercado internacional se falava em três/quatro altas, enquanto hoje tem sido projetado que o FED possa fazer seis ou sete.
Na nossa visão, além dos problemas internos, onde o teto da meta de inflação tem sido sobrepujado pelas previsões de 6% ou 5,56%, de acordo com a pesquisa Focus mais recente (o teto é de 5%), vamos ter que ficar de olho na atuação dos principais bancos centrais. Aparentemente, o FED tem produzido discursos duros dos membros sobre alta dos juros e também sobre redução do tamanho dos ativos carregados, o que certamente acabaria por influenciar também a atuação do nosso Bacen.
Também é esperada nova alta de juros pelo BOE (BC inglês), enquanto o BCE (BC europeu) começa a reduzir a compra de títulos no mercado, antes de pensar em elevar juros. Lá, há situações díspares entre países, o que justifica a prudência, mas o Bundesbank (Alemanha) já fez, na semana que passou, a colocação de títulos com taxa positiva para cinco anos, fato que não aconteceu nos últimos quatro anos. Como temos dito, a situação mais tranquila está no BOJ (BC japonês), com cheque em branco para compra de ativos, e no PBOC (BC chinês), que manteve taxa de juros dos títulos estabilizada.
Enquanto o mundo começa a projetar os juros futuros de melhor equilíbrio, o Brasil vai capturando fluxo de recursos decorrente de ser a segunda maior taxa de juros entre os emergentes, com a taxa real ao redor de 8% (neutra de 4%) e dando chance para montagens de operações estruturadas e de carry trade. Basta ver a entrada divulgada pelo Bacen até 11/02, de US$ 5,08 bilhões, sendo que o fluxo pelo canal financeiro foi de US$ US$ 4,55 bilhões (no ano, US$ 6,6 bilhões). Na Bovespa então, o fluxo de ingresso líquido produzido pelos investidores estrangeiros está em R$ 53,7 bilhões em 2022 (até 17/02), sendo que, em fevereiro, até essa data, já ingressaram R$ 21,2 bilhões, basicamente concentrados em ações de empresas de valor, líderes do mercado e exportadoras de commodities.
Isso reforça que o Bacen terá que ficar com “um olho no gato e outro no peixe” para que não haja brusca inversão de fluxo mais para frente, principalmente se as disputas e as polarizações de campanha para presidente se intensificarem.
Claramente, o momento é de valorização do real frente ao dólar, mas esse movimento pode não ser tão longo, dependendo dos mercados e bancos centrais no exterior e de nossas idiossincrasias.