Fico impressionado como 2020 tem passado rápido. Não sei o seu caso, mas quando olho para trás, fico com a sensação de que o ano ainda não aconteceu. E pensar que nesta semana ingressaremos no mês de outubro...
Entretanto, o lado bom de o ano estar voando é que daqui a pouco chegaremos em novembro – o mês das promoções da Black Friday.
Confesso para você que essa é uma data muito aguardada por mim. Sou o tipo de consumidor que, sempre que possível, evita gastar ao longo do ano esperando esse período de promoções.
Inclusive, costumo sair pesquisando os preços nas semanas anteriores ao evento para garantir que não cairei no conto do “metade do dobro”. Sim, eu levo isso a sério demais...
Há quem diga que esse tipo de comportamento é mania de economista, como se essa graduação nos tornasse mais econômicos. Não nos torna. Sou “pão duro” de natureza mesmo. Aliás, acho essa expressão genial.
Mas cá entre nós, quem não gosta de uma promoção?
Nada melhor do que comprar aquelas roupas ou pacote de viagem a um valor bem inferior ao atribuído por você anteriormente, concorda comigo? A sensação é de que “ganhamos” essa diferença, também chamada de “excedente do consumidor” na aula zero de microeconomia.
Enfim, meu ponto é que costumamos ficar muito atentos aos preços dos bens e serviços na hora de consumir, pois aprendemos desde cedo que o preço é uma informação importante para as relações de trocas.
Já tentou convencer uma criança a trocar uma nota de R$ 50 por uma de R$ 10 sem direito a troco? Se ela já tiver uma idade razoável, dificilmente aceitará.
Mas o que me chama a atenção é que, quando o assunto são os investimentos, muitos investidores deixam de lado a noção de preço que aprenderam desde cedo.
Abrem mão, por exemplo, do princípio do “Leve 3 e Pague 2” e acabam fazendo negócios que mais se parecem com um “Leve 2 e Pague 3”.
Talvez por acharem que, em se tratando de Ações ou cotas de FIIs, o princípio é outro. Não é!
Um FII de Laje Corporativa monoativo, em uma região nada óbvia e sem um inquilino sequer há 3 anos até poderia ser um bom investimento, desde que negociado em Bolsa a um preço/m² próximo ao valor de seu terreno.
Por outro lado, um FII de galpão logístico de ótima localidade e especificações técnicas pode ser um mau negócio se negociado em Bolsa a mais de 4 mil reais/m², por exemplo.
Portanto, tudo é uma questão de preço. O preço importa e muito na hora de investir.
Recentemente, acompanhei o caso de um Fundo de Fundos Imobiliários (FOF) que me motivou a falar sobre a importância de se olhar o preço antes de investir em FIIs.
Mas antes de ir direto ao ponto, preciso garantir que partiremos juntos da mesma página. Para isso, explicarei um pouco mais sobre o que é um FOF a seguir.
Um FOF é um Fundo Imobiliário que tem como mandato auferir rendimentos por meio do investimento em cotas de outros FIIs.
Esse tipo de Fundo costuma ter custos mais elevados para os cotistas, afinal, além das taxas cobradas pelos FIIs em sua carteira, ele conta com suas próprias taxas de administração, gestão e, em muitos casos, de performance sobre algum indicador de referência (benchmark).
O custo “dobrado” é o preço que o investidor paga por colocar uma fração de seus recursos na mão de uma gestão profissional.
Não vejo nada de errado nisso, afinal, não existe almoço grátis no mercado. É como dizem: quem quer rir, tem que fazer rir.
O principal risco que envolve o investimento em FOFs é o de gestão. Como estamos terceirizando a escolha de em quais FIIs investir, além do monitoramento da carteira, é preciso que confiemos no trabalho da equipe de gestão do Fundo.
Conhecer bem a sua filosofia de investimentos e o seu histórico profissional é um bom ponto de partida, mas também é importante entender se há de fato um alinhamento de interesses entre os cotistas e a gestão.
Também vale sempre se perguntar: de que forma o gestor do Fundo pode ganhar dinheiro que você não poderia?
Gosto muito dos FOFs que participam ativamente de ofertas ICVM 476, por exemplo.
Apesar de muitas dessas emissões serem atrativas, elas são restritas apenas a investidores profissionais. Assim, um FOF atuante nesse tipo de emissão pode gerar valor ao pequeno investidor, já que ele não teria acesso a essas oportunidades investindo por conta própria.
Essa é uma forma de os FOFs gerarem retornos acima da média do mercado para seus cotistas. E isso é fundamental para que o seu custo adicional seja justificável.
Mas esses Fundos contam com outra característica importante.
Como o Patrimônio Líquido de um FOF está majoritariamente alocado em cotas de outros FIIs, que possuem preços de compra/venda em Bolsa, o seu Valor Patrimonial por cota (VP) é frequentemente atualizado pelo real valor de mercado de seus ativos, diferentemente do que ocorre com os Fundos de Tijolo, por exemplo.
Isso é importante, pois a marcação a mercado torna o VP dos FOFs “puro sangue”, um dos poucos casos – senão o único – em que a utilização do múltiplo P/VP para saber se o FII está ou não barato é fidedigna.
Se o VP por cota do FOF for de 100 reais, por exemplo, então isso significa que o último valor atualizado da sua carteira é de 100 reais. Ele não vale nem mais, nem menos do que isso.
Sendo assim, caso o preço de sua cota negociada em Bolsa (P) esteja em 115 reais (múltiplo P/VP de 1,15), dizemos que o mercado está pagando 15 por cento a mais do que o Fundo efetivamente vale.
Por outro lado, se o preço da cota de mercado for de 90 reais, o P/VP será de 0,90, o que mostra que o Fundo está 11 por cento descontado em Bolsa frente ao valor atual de sua carteira de ativos.
Não pague 117 reais por uma nota de 100 reais
É fundamental que você faça uma análise qualitativa cuidadosa antes de investir em um FOF. Mas a boa notícia é que, pelos motivos apresentados acima, a análise quantitativa desse segmento é mais simples do que a necessária para avaliar os demais FIIs sem correr o risco de cair em pegadinhas.
Quando olhamos apenas para o preço, não tem muito mistério sobre em qual FOF investir. Busque sempre que possível as promoções, ou seja, aquelas com um múltiplo P/VP inferior a 1.
O problema é que muitos investidores esquecem do preço ao investir em FIIs. Topando comprar um FOF, por exemplo, a um P/VP muito superior a 1 apenas porque ele pagou um belo rendimento recentemente. Sem procurar entender se aquele rendimento é perene ou apenas pontual.
Quer um exemplo?
Nos últimos dois meses, foi possível notar que um determinado FOF “XPTO11” caiu nas graças de muitos investidores por conta de seus belos dividendos.
Fui constantemente indagado se valeria a pena o investimento. Gosto do perfil da estratégia e acredito no trabalho da gestão do Fundo mas, apesar disso, a resposta foi sempre um categórico “não”.
O motivo?
O Fundo vinha pagando belos Dividend Yields por conta de fatores não recorrentes, como ganhos de capital (importantes para que os FOFs gerem valor aos cotistas) e distribuição de reservas de lucros – comumente utilizadas pelas gestões para suavizar os pagamentos de proventos.
Mas os investidores desavisados – e aqueles que olham apenas para o rendimento corrente para decidir onde investir, também conhecidos como Zé Cotinhas–, compraram cotas do FII na tentativa de se beneficiar do movimento.
O múltiplo P/VP do FOF chegou ao patamar de 1,17 no fechamento do último mês, o que não fazia sentido algum.
Você pagaria 117 reais por algo que vale apenas 100 reais? Eu não!
Era certo que cedo ou tarde o mercado reconheceria os seus excessos, o que levaria a uma redução no preço da cota do FII para algo mais próximo a um P/VP igual a 1.
E não deu outra. Sem nenhuma mudança de rota estrutural que justificasse o movimento, o Fundo já caiu mais de 10 por cento desde o seu auge, sendo mais de 7 por cento apenas nas últimas semanas.
Fonte: Bloomberg.
O investidor desavisado que o adquiriu no topo viu uma grande desvalorização em seus investimentos. Não se sabe se será possível recuperar a perda, visto que o Fundo ainda está negociando com 5 por cento de ágio.
Assumindo um patamar de Dividend Yield na média do mercado de hoje, uma desvalorização de mais de 10,3 por cento no preço da cota exige quase dois anos de recebimento de proventos para ser compensada.
Grosso modo, seria como se o dinheiro do investidor ficasse parado sem rentabilizar por todo esse período, o que nunca é bom.
Não seja um Zé Cotinha
Portanto, cuidado. O caso acima está longe de ser um relato dramático do que pode acontecer com investidores que não olham para o preço dos FIIs que investem, pois estão preocupados apenas com os proventos correntes.
Não seja um Zé Cotinha e não invista em negócios do tipo “Leve 2 e Pague 3”, pois o preço dos FIIs, assim como os das Ações, importa e muito.
Lembre-se de que pagar barato é condição necessária, mas não suficiente para um bom investimento.
No caso dos FOFs, é muito importante conhecer o histórico da gestão, verificar o seu alinhamento de interesses com os cotistas, entender muito bem a sua estratégia e verificar se há potencial de geração de retornos acima da média do mercado.
Um FOF adquirido pelo preço certo e que atenda a condições como essas pode gerar valor ao investidor. Além disso, de quebra, você evita cair em Value Traps.
Um abraço e até a próxima.