Passados seis meses desde que o primeiro shopping suspendeu suas atividades em decorrência da pandemia, o país voltou a apresentar 100 por cento dos ativos em funcionamento no final de agosto, segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).
Quantidade de Shoppings em funcionamento entre março e agosto de 2020. Fonte: Hedge Investments e Abrasce.
Mas apesar da retomada das atividades, sabemos que o segmento ainda terá uma longa jornada pela frente até retomar os seus níveis do pré-crise.
Os shoppings estão funcionando em horários reduzidos e o fluxo de visitantes é limitado. Sem falar que muitos consumidores ainda estão cautelosos enquanto as vacinas seguem na fase de testes.
Além disso, como os seus custos fixos são muito elevados, os shoppings dependem de altos volumes de receitas para rentabilizar suas operações. Afinal, aquelas estruturas colossais exigem manutenções frequentes para que se mantenham em bom estado.
Porém, para gerar receitas é preciso atrair um grande fluxo de pessoas.
Alguns meios que os shoppings utilizam para atrair fluxo, tais como cinemas e teatros, estão voltando aos poucos em algumas cidades, o que ajuda e muito. Mas outros tantos ainda sentem os efeitos da pandemia. As praças de alimentação, por exemplo, vêm registrando baixos fluxos de clientes devido ao Home Office.
Perceba que, mesmo passado o auge da pandemia, a situação dos shopping centers não é óbvia. Não por outro motivo, o setor segue na lanterna da recente recuperação do mercado de Fundos Imobiliários.
Fonte: Hedge Investments.
Mas o que poderíamos esperar para os FIIs de shopping centers daqui em frente?
Para tentar responder à pergunta, se é que é possível, devemos entender primeiro como os Fundos Imobiliários expostos ao segmento ganham dinheiro para seus cotistas.
Follow the money...
Em se tratando do mercado imobiliário, o segmento de Shopping Centers é repleto de peculiaridades.
Diferentemente do que ocorre com os escritórios, galpões logísticos e outros segmentos imobiliários, as fontes de receita desses empreendimentos não se limitam apenas a um aluguel fixo pago pela ocupação do seu espaço.
Seus principais meios de geração de receita são:
Aluguel
Principal fonte de renda dos shoppings, é o valor pago pelo locatário mensalmente à administradora do empreendimento.
Essa remuneração pode corresponder a um valor fixo, o chamado Aluguel Mínimo, e/ou pode ser vinculada a um percentual do faturamento mensal da loja, também conhecido como Aluguel Percentual.
Ou seja, a depender do contrato de locação, os shoppings podem ser “sócios” de seus lojistas.
Luvas/Taxa de adesão
Além do aluguel, é comum que haja a cobrança de luvas no primeiro contrato de locação do inquilino com o shopping. A taxa dá direito ao lojista de utilizar aquele ponto pelo período contratado, geralmente cinco anos.
Estacionamento
Parte dos valores arrecadados no estacionamento também é revertida aos proprietários do shopping, sendo outra importante fonte de receitas dos empreendimentos.
Fora as fontes de receita mencionadas, as administradoras dos shoppings também cobram dos inquilinos algumas taxas para arcar com os custos relacionados ao dia a dia.
O fundo de promoção, por exemplo, é o valor cobrado para custear campanhas de marketing e outras iniciativas que visam atrair clientes; já o condomínio corresponde à taxa cobrada para pagar as despesas comuns do empreendimento.
Diante dos custos explicitados, podemos concluir dois pontos.
O primeiro é que, quando somadas todas as taxas, o custo de um espaço no shopping está longe de ser algo barato para o lojista, concorda comigo?
É preciso que as vendas valham muito a pena para os lojistas. E, em condições normais de temperatura e pressão, elas valem.
Shoppings bem-sucedidos são capazes de atrair um fluxo de dezenas de milhares de pessoas por mês. Se um terço delas consumir produtos e serviços enquanto estiver dentro da instalação, o lojista colherá os frutos do investimento.
Já o segundo ponto é que, ao fim do dia, as receitas dos FIIs de shoppings são impactadas diretamente pelas condições que influenciam o comércio varejista.
Dentre elas, destacam-se o crescimento econômico, as taxas de inflação e de juros, o desemprego e o nível de confiança dos consumidores.
Quando a maior parte desses fatores está favorável para o setor, os shoppings ficam cheios, as pessoas consomem produtos e experiências e os Fundos geram belos rendimentos a seus cotistas.
Ao passo que, quando estão desfavoráveis, como em momentos de recessão, por exemplo, as receitas dos FIIs de shopping são comprimidas em decorrência da redução do consumo da população.
É basicamente assim que a roda gira. Mas em que ponto o segmento se encontrava antes da pandemia e em qual retomará passado o pior da crise?
Antes
Após dois anos registrando crescimentos do PIB próximos a 1 por cento, iniciamos o ano de 2020 com uma grande expectativa de que, desta vez, a economia finalmente engataria a quarta marcha em um ambiente de juros baixos, inflação controlada e desemprego cadente.
Exatamente as condições necessárias para uma expansão mais vigorosa do setor varejista, que tenderiam a alçar os Fundos Imobiliários de Shopping como a bola da vez no mercado de FIIs.
No entanto, logo no início do ano, vimos sinais de que a economia ia bem, contudo, ainda distante das expectativas. Até aí tudo bem, um crescimento econômico morno não era uma novidade.
Mas aí chegou a pandemia. E o resto é história…
Depois
O que vemos hoje é uma economia em recuperação após encolher 9,7 por cento no segundo trimestre do ano em decorrência da pandemia.
Em meio a tantas incertezas, na semana passada tivemos boas notícias para o setor varejista.
De acordo com o IBGE, o volume de vendas do setor no conceito restrito avançou 5,2 por cento só no mês de julho, enquanto os economistas esperavam um aumento de apenas 1,3 por cento.
No conceito ampliado, que também inclui as vendas de materiais de construção, veículos e autopeças, o resultado foi de 7,2 por cento no mês, contra uma expectativa de 5,5 por cento.
Com isso, os resultados mostram que, até o momento, a recuperação do setor vem ocorrendo em forma de “V”.
Fonte: IBGE, Itaú (BVMF:ITUB4).
Entretanto, como já era de se imaginar, essa recuperação ainda ocorre de maneira muito heterogênea – em grande parte impulsionada pelas atividades de supermercados/produtos alimentícios e móveis/eletrodomésticos.
Sem falar nos impactos positivos, porém, temporários, que a demanda represada pelo período de quarentena e o auxílio emergencial vêm causando no setor.
Assim, é preciso entender como as diversas atividades que envolvem o setor varejista vão se comportar passados esses efeitos transitórios. Ou seja, ainda tem muita água para rolar nessa história...
Conclusão
De qualquer forma, se em meados de abril e maio não víamos uma luz no fim do túnel para os FIIs de Shopping, hoje é possível enxergá-la, mesmo que ainda de forma opaca.
Ainda, em um mercado que já não está exatamente uma barganha, esses Fundos podem representar, sim, boas opções de investimentos, tendo em vista que ficaram para trás na recente recuperação do mercado.
Mas é preciso cautela. Shoppings bem consolidados, dinâmicos e voltados para públicos menos afetados pela crise tendem a se recuperar mais rapidamente, ao passo que os demais tendem a enfrentar uma retomada mais árdua.
Também é importante que o investidor saiba que, devido à recuperação ainda gradual que o segmento deverá passar nos próximos meses, os FIIs de Shoppings não são bons ativos geradores de renda mensal para se estar posicionado no momento.
Atualmente, prefiro encará-los muito mais como ativos interessantes para quem busca ganhos de capital.
Um abraço e até a próxima.