Ontem, vimos a divulgação dos dados de desemprego do Caged, que mostraram a criação de 184 mil empregos com carteira assinada em março. O resultado veio acima das expectativas do mercado (150 mil) e foi recebido como uma surpresa positiva, tendo em vista o fechamento de boa parte da economia no mês.
Apesar disso, o dado não vem nos contando toda a história do impacto da pandemia sobre o mercado de trabalho. Segundo dados do IBGE, a crise vem impactando os empregos da população de maneira bastante díspar.
Entre os trabalhadores com ensino superior completo, por exemplo, que geralmente possuem renda mais elevada, houve uma contração de 7 por cento da população ocupada desde o início da crise. Já entre aqueles que não concluíram o ensino médio, que tendem a ter renda mais baixa, há ao menos 16 por cento menos pessoas trabalhando.
Boa parte do movimento se dá pela maior capacidade dos trabalhadores mais escolarizados se adaptarem à nova realidade, recorrendo ao home office, por exemplo. Enquanto os menos instruídos, por outro lado, são maioria nos empregos informais que, por sua vez, não são capturados pelos dados do Caged e vêm sendo mais impactados pela pandemia.
Resumo da ópera: a crise econômica provocada pelo coronavírus vem deixando cada vez mais claro o seu caráter desigual. E isso vale não apenas para o mercado de trabalho, mas também para os seus investimentos!
Recuperação em “V” para quem?
Ainda hoje, fico impressionado com a velocidade de recuperação das bolsas desde março do ano passado. Passado pouco mais de um ano após o auge da crise, o Ibovespa já voltou aos 121 mil pontos. Uma impressionante recuperação em “V” após as quedas sem precedentes pelas quais passamos.
Isso tudo considerando todas as incertezas, notícias negativas e polêmicas que ocorreram nesse ínterim. Enfim, é impressionante!
Embora grande parte das ações tenha se valorizado em alguma medida desde março de 2020, também vimos uma recuperação bastante desigual entre os diversos segmentos.
As ações ligadas a commodities, por exemplo, subiram muito e praticamente carregaram o Ibovespa nas costas de lá para cá. Os bancos, por outro lado, ficaram bem mais para trás.
Segmentos mais impactados pelas medidas de distanciamento social, como os shoppings e os escritórios, vêm sofrendo muito mais do que os galpões logísticos e fundos de recebíveis imobiliários.
[Rentabilidade do IFIX por segmentos. Fonte: RBR Asset.]
De fato, esse é um padrão que vem ocorrendo até aqui em razão da pandemia e que tende a se manter em alguma medida até avançarmos no desafio da vacinação em massa da população.
Enquanto isso, alguns segmentos da economia e faixas da população devem seguir a sua trajetória de recuperação, ao passo que outros tantos podem permanecer em dificuldades.
Em se tratando de investimentos, o mais importante agora é tomar cuidado com algumas narrativas criadas pelo mercado.
O mercado e suas histórias
É possível que você tenha visto, em algum momento ao longo do último ano, teses como “os escritórios vão acabar”, “os shoppings vão falir”, “Ibovespa a 60 mil é venda” e por aí vai.
Não há nada de errado com elas, pois há, sim, momentos em que determinados investimentos são preferíveis a outros, mas o problema dessas narrativas é que, muitas vezes, elas costumam entrar na moda quando já é tarde demais. Ou seja, quando os novos queridinhos do mercado já estão muito caros e/ou os patinhos feios estão descontados demais.
Apesar do discurso tentador, é preciso avaliá-las com certo ceticismo, pois elas podem muitas vezes induzi-lo em erro clássico de vender na baixa para comprar na alta.
Nem oito, nem oitenta
Parece-me que esse é o caso para alguns fundos imobiliários de shoppings e de lajes corporativas que vêm sendo preteridos neste momento. É certo que ainda temos um longo caminho até resolver o problema da pandemia no país e corremos o risco de seguir neste vaivém de restrições, que tanto impacta e gera receios nos dois segmentos.
Todavia temos, hoje, uma previsibilidade infinitamente maior sobre esse problema do que há um ano. Com isso, o investidor paciente e que souber escolher bons ativos a preços interessantes pode, sim, ser recompensado mais à frente.
Para tanto, é preciso tomar cuidado com as narrativas criadas pelo mercado, sobretudo quando estamos próximos ao olho do furacão.
Abraços e até a próxima!