Não sei como funciona a modernidade.
No meu tempo de estudante, 80% das aulas semanais de educação física dos moleques eram dedicadas ao futsal.
Eu amava isso, e ficava injuriado quando o professor queria propor um handebol.
Hoje, tendo desenvolvido certa empatia social, consigo imaginar que alguns dos meus colegas teriam preferido uma distribuição diferente entre os esportes.
No entanto, sendo bem sincero, não me lembro de um só caso de real descontentamento com a hegemonia futebolística, em mais de dez anos de escola.
Não estávamos jogando bola. Estávamos simplesmente indo com o fluxo, no melhor sentido coletivo (o efeito manada, fundamental para a sobrevivência das espécies, é injustamente simplificado como nocivo pelas finanças comportamentais).
Dentro das quatro linhas, melhores amigos, quase amigos e inimigos, ainda que sorteados aleatoriamente, faziam parte de um mesmo plantel sistêmico.
Mediante o apito do professor, quaisquer diferenças intrínsecas eram deixadas do lado de fora da quadra.
Ao menos, é assim que me lembro das coisas, e assim que penso em escrevê-las agora.
À medida que o tempo passa, compreendo que nenhum escritor possui o real entendimento daquilo que escreve. Logo, resta-lhe acreditar em quase tudo o que é dito por seus leitores a respeito do texto.
Uma vez mais, a sabedoria coletiva ultrapassa as vaidades individuais.
Isso acontece também no mercado, no consenso de mercado, a despeito de os financistas serem treinados no vício da arrogância, de cada um achar que está muito acima da média, capaz de perceber o que outros não percebem.
Se esse vício ainda não lhe foi apresentado, caro leitor, gostaria de tentar preveni-lo com a seguinte cautela: o infinito particular do investidor vale muito, desde que usado com moderação.
A partir de um histórico de décadas de retornos acumulados, Soros e Druckenmiller atuaram dentro do consenso de mercado durante 85% do tempo, tendo deixado os outros 15% para exibições contrárias.
A particularidade é uma exceção ao bom investidor.
Aqueles que conseguem respeitar a proporção de 85/15 se destacam pela resistência às pressões externas, às cobranças para continuar sendo diferente.
Mas e se eu sou diferente justamente porque tento ser igual?
Não me venha com essa, ninguém mandou ficar famoso, agora assuma a carga de ser um investidor especial.
Warren Buffett, coitado, está sendo acusado pelo Financial Times de agir como uma pessoa normal.
"It is a bit alarming to discover that Warren Buffett has been making the same trades as everyone else."
Não era esse o guru que pregava o medo quando os outros queriam a ganância, e pregava a ganância em meio ao pânico das massas?
Ele mesmo.
Mas, durante a maior parte do tempo, as massas não estão com medo, nem estão gananciosas. Estão apenas batendo uma bolinha.