O rali de ontem no mercado internacional tem continuidade hoje, com os índices futuros das bolsas de Nova York e as principais bolsas europeias exibindo ganhos acelerados nesta manhã, após as fortes altas da véspera em Wall Street, que embalaram o pregão na Ásia. A ver, então, se os negócios locais vão conseguir acompanhar o cenário externo favorável ao apetite por risco, em meio à grave tensão política que potencializa a crise do vírus no Brasil.
Causou desconforto no mercado doméstico ontem todo o constrangimento criado pelo presidente Jair Bolsonaro contra o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Os ruídos em relação à saída dele da Pasta só foram interrompidos no fim do dia, após reunião ministerial no Palácio do Planalto. O anúncio do “fico” foi feito em coletiva de imprensa marcada às pressas e realizada após as gavetas do ministro já estarem “limpas”.
Todo esse mal-estar envolvendo Mandetta, de caráter meramente político, deixou o governo sem resposta para os milhões de trabalhadores informais que precisam de ajuda financeira para pagar as contas que chegam neste início de mês e garantir o sustento na casa. A promessa do Ministério da Cidadania é de que algumas pessoas já poderiam receber o auxílio de R$ 600 hoje, mas nada foi divulgado.
Uma coletiva com a presença dos ministros Onyx Lorenzoni (Cidadania), Paulo Guedes (Economia) e o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, está marcada para às 9 horas e deve dar explicações à população. Mas já ficou claro que, enquanto Bolsonaro defende publicamente o fim do isolamento social para que na casa das pessoas não venha a “faltar pão”, nos bastidores em Brasília a preocupação do presidente é com quem quer “virar estrela”, assumindo o protagonismo na crise do coronavírus.
Enquanto isso, o número de mortes pela doença no país subiu em 67 em 24 horas, passando de 486 óbitos para 553. No total, já são mais de 12 mil casos confirmados de Covid-19 no país, com um aumento de 926 entre ontem e hoje. Mas o Brasil continua enfrentando um sério problema de subnotificação de casos, que ofusca a realidade em relação à disseminação do vírus.
Mesmo assim, o governo já avalia cenário para flexibilizar o isolamento “no futuro”, ao invés de concentrar os esforços na realização de testes e na aquisição de equipamentos para suprir a necessidade de médicos e pacientes nos hospitais. Talvez o governo esteja esperando a aprovação do chamado "Orçamento de Guerra", que só deve ser votado no Senado no dia 13.
Aliás, atenta às conta públicas, a Standard & Poor's (S&P) piorou a perspectiva da nota de crédito (rating) soberano do Brasil, de positiva para estável, citando os efeitos econômicos e fiscais da pandemia de coronavírus. A agência de classificação de risco manteve a nota do país em BB-, portanto, três degraus abaixo do mínimo para alcançar o selo de grau de investimento.
E eu com isso?
Enquanto isso, lá fora, os mercados internacionais estendem o rali pelo segundo dia. As principais bolsas europeias têm ganhos firmes, de mais de 4%, embaladas por dados que mostram sinais de crescimento mais lento da disseminação do coronavírus no velho continente.
Já a Bolsa de Londres tem alta mais moderada, ao passo que a libra esterlina se recupera, monitorando as notícias sobre o estado de saúde do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, que foi internado por “precaução” no domingo e conduzido à unidade de terapia intensiva (UTI) ontem. O euro também avança, enquanto o dólar perde força.
Os índices futuros das bolsas de Nova York também sobem forte, após a taxa de crescimento dos casos da doença nos Estados Unidos ficar abaixo de 10% pelo segundo dia consecutivo. Ao mesmo tempo, os legisladores norte-americanos avaliam a possibilidade de um novo pacote de estímulo, que pode valer mais de US$ 1 trilhão.
Na Ásia, porém, a notícia de que o Japão declarou estado de emergência em várias regiões pesou nos negócios, encurtando o fôlego de alta, ao passo que a China continua registrando apenas casos importados de coronavírus. Tóquio, Xangai e Hong Kong subiram 2%, cada. Já o petróleo avança, afastando-se do limiar da marca de US$ 20 por barril.
Varejo brasileiro em destaque
A agenda econômica desta terça-feira traz como destaque o desempenho do varejo brasileiro em fevereiro, que deve cair pelo segundo mês seguido em 2020. Portanto, ainda sem registrar crescimento nas vendas neste ano. A previsão é de recuo de 0,5% em relação a fevereiro. Já em relação a um ano antes, o setor deve crescer pela 11ª vez, em +2%.
O resultado efetivo será conhecido às 9h. Lá fora, merece atenção o relatório Jolts com dados de fevereiro sobre as demissões e contratações nos EUA (11h), que pode trazer os reflexos iniciais do isolamento social sobre o mercado de trabalho. Também serão conhecidos dados sobre o crédito ao consumidor norte-americano (16h) em fevereiro.