Instintos básicos
Toda semana, ao pensar no que escrever para vocês, pego-me pensando nas reflexões de se investir.
Para quem me acompanha aqui há mais tempo, sabe que uma das coisas que eu gosto de ler é sobre o comportamental de se investir.
É fascinante o quanto se consegue aprender simplesmente entendendo melhor como a sua mente funciona. Afinal de contas, investir é muito mais do que saber fazer planilhas complicadas.
Esses dias, estava refletindo sobre como investir é uma atividade desconfortável.
Se o mercado sobe, a ganância fala mais alto na hora de aumentar as apostas. Se a Bolsa cai, o instinto de sobrevivência faz querer salvar um pouco do que ainda sobra.
Por fim, temos a impaciência de ver a Bolsa lateralizar, passando meses sem ao menos ganhar sequer um centavo.
Talvez seja tão difícil investir para muitas pessoas porque isso depende de você lutar contra seus instintos básicos, alguns enraizados em você desde que nasceu.
É sobre isso que queria conversar com você hoje.
A ganância ainda te mata...
Talvez seja contraintuitivo para muitos de vocês, mas o próprio ato de ganhar dinheiro no mercado é perigoso.
De alguma forma, eletorna o sujeito mais corajoso, disposto a dobrar as apostas pensando em maiores ganhos. É nessa hora que ele coloca tudo a perder…
Vejo muitos investidores que, com a visão que têm hoje, arrependem-se de não estarem alavancados até as tampas na Bolsa em março. Dizem eles que, ao atingir os 60 mil pontos, era impossível a Bolsa cair mais.
Apesar de concordar que a Bolsa estava barata, não é porque o resultado foi bom que a decisão foi acertada. Em diversos momentos da nossa história, a Bolsa chegou a cair por meses.
O comportamento das crises não é racional. Ali, quem comanda é a emoção, o desespero e a incerteza, o que é totalmente imprevisível.
É verdade que, cedo ou tarde, o mercado fará uma conta e observará que os preços estão muito fora do lugar – mesmo que os fundamentos tenham deteriorado.
Entretanto, quando esse momento chegar, você pode já ter quebrado.
Quando você está alavancado em uma situação dessas, o tempo está contra você. Ao investir simplesmente nas Ações, tudo que você tem é tempo para esperar.
Não se exponha a esse risco. Um dos segredos dos investimentos é se manter no jogo, porque sem ele não há longo prazo.
Programados para sobreviver
Certa vez, enquanto estava de molho por quebrar o cotovelo, li uma matéria que dizia que, ao sentir uma dor extrema, o seu corpo libera endorfina para bloquear algumas transmissões nervosas e poupá-lo da má notícia.
Achei aquilo fascinante. De fato, não me recordo da dor no momento em que caí, mas, sim, quando cheguei ao hospital e descobri o que havia acontecido.
Não sei se é verdade isso – os nossos leitores médicos podem nos dizer –, mas fez bastante sentido quando li. É como se o nosso cérebro soubesse como somos avessos à dor, então nos poupa.
Richard Taller ganhou um prêmio Nobel mostrando algo parecido. Em seu estudo, ele mostrou que nós somos TOTALMENTE avessos a perdas.
Em bom português, isso quer dizer que a dor de perder 100 reais é muito maior do que a felicidade por encontrar o mesmo montante.
No mercado, vale a mesma ideia. Se ganhar dinheiro nos traz alegria, a dor e o desespero causados por ver seu patrimônio ruir pela metade são substancialmente maiores.
Por isso que, na maioria das vezes, muitos investidores preferem encerrar o sofrimento vendendo as Ações. Mas como vocês puderam perceber em março, este é o PIOR momento para se vender qualquer ativo financeiro.
Neste momento, o que você precisa é ter calma para fugir das armadilhas mentais que nos assolam e fazer boas escolhas. Não será diferente nas próximas crises do mercado, então esteja preparado.
A impaciência
Talvez, por ignorância, nunca vi uma explicação para o surto de ansiedade ou impaciência que temos hoje. Talvez seja uma simples consequência deste nosso mundo moderno, mas isso eu deixo para os psicoanalistas decidirem.
Não é tão relevante para nós aqui.
Porém, é fato: somos seres impacientes, seja em maior ou menor grau. Sempre queremos os resultados para ontem, e nos frustramos quando eles não chegam na velocidade desejada.
A falta de resultados de curto prazo nos impede de focar nos benefícios futuros de determinada atitude, o que leva muitos a desistirem antes de os resultados aparecerem.
Isso acontece porque o sacrifício é imediato, enquanto o benefício é difuso e está muito no futuro. Posso dizer que presenciei isso categoricamente em todos os dias que eu fiz fisioterapia.
Durante 8 meses, três vezes na semana, eu ia até a minha clínica e sofria por algumas horas na mão do meu fisioterapeuta. Na maior parte do tempo, mesmo depois de ter passado por tanta dor, eu chegava em casa frustrado por não ter visto melhora alguma.
Aquilo me indignava e me fazia pensar que algo estava sendo feito errado. Inclusive, não vou negar que quis desistir algumas vezes…
Meses depois de ter começado, mesmo sem notar uma evolução diária, vi o quanto tinha ganhado de mobilidade de quase 100 por cento. Algo incrível.
Para a Bolsa, vale a mesma lógica. Estamos há alguns meses à deriva, em um mar de interminável volatilidade sem muito sair do lugar. Para muitas pessoas, essa falta de definição no curto prazo é altamente angustiante.
Se esse é o seu caso, lembre-se: os benefícios da Bolsa são de longo prazo. A pressa é inimiga do investidor em Bolsa, então tenha calma.
Assim como eu, quando menos esperar, estará colhendo os frutos de tudo o que está plantando hoje.
Lute contra os seus próprios instintos
Invariavelmente, muito do seu sucesso em Bolsa também está diretamente ligado a como você domará seus instintos mais básicos.
Está ligado a como treina o seu psicológico, domando-o para pensar como um investidor que olha décadas, não meses.
Instruindo-o a superar a dor quando o mercado cair e aproveitar as oportunidades. É isso que fará a diferença no longo prazo.
Sem dúvidas, transformar o seu maior passivo em um ativo não é tarefa fácil. É preciso muito treino e vários anos de investimento, mas isso será transformacional para a sua vida como investidor.
Abraços.