Bom dia, Pessoal! No artigo de hoje, coescrito com Camila Affonso, sócia do Leggio Group e Joseph Boukai, consultor do Leggio Group, temos como objetivo explicar o conceito da estrutura de capital e como o equilíbrio entre o uso dos recursos que compõem o seu cálculo pode ajudar na viabilização dos projetos, especialmente aqueles voltados à infraestrutura (setor que possui linhas de crédito especificamente destacadas para esta finalidade). Mas antes de entender o conceito da estrutura ótima de capital, devemos entender incialmente o que é estrutura de capital e por que isto é importantíssimo para qualquer companhia.
A estrutura de capital de uma empresa nada mais é do que a forma como ela financia suas operações (sob uma perspectiva mais geral: como ela financia o seu capital, isto é, seus ativos). De maneira simplificada, trata-se da combinação entre o capital próprio (ou seja, capital dos sócios da empresa) e o capital de terceiros, sob a forma principalmente de dívida. Estes são os dois tipos fundamentais de fontes de recursos e, é claro, podemos ter subclasses (como, por exemplo, ações ordinárias e ações preferenciais no capital próprio e diferentes tipos de dívidas no capital de terceiros). Deste conceito de estrutura de capital, nasce um outro conceito importantíssimo dentro do contexto corporativo, que é o custo de capital. Como o capital vem de diferentes fontes, com diferentes taxas requeridas por conta dos diferentes níveis de risco aos quais cada provedor de capital se expõe, é natural termos de compor um custo de capital médio que reflita o custo de capital global daquela companhia. Como qualquer outro custo, ceteris paribus, uma empresa é mais competitiva do que outra quando consegue um custo de capital menor.
E é precisamente neste momento que surge uma das fórmulas clássicas dos livros de Finanças Corporativas: a fórmula do WACC (sigla em inglês para o custo médio ponderado de capital de uma empresa). A fórmula clássica do WACC está abaixo, na qual Ke representa o custo de capital próprio, Kd equivale ao custo do capital de terceiros, E e D respectivamente o valor total do capital próprio e da dívida (esta a valor presente!), além de τ representar a alíquota de imposto pago sobre o lucro.
Ao contrário do que muitos imaginam, a fórmula acima não é geral e deve ser interpretada como uma versão simplificada (e muitas vezes irrealista, por diversas razões distintas), mas ela serve como ideia geral do custo de capital corporativo para os propósitos deste artigo. Para citar apenas um caso no qual a fórmula acima não seria válida, empresas que estão no regime de lucro presumido não contam com o benefício fiscal da dívida e, portanto, não devem considerar o fator (1 - τ) na fórmula acima. Para aqueles que quiserem se aprofundar no tema, eu escrevi uma série de oito artigos sobre Valuation na qual abordo essa questão com a devida profundidade. Clique aqui para acessar um resumo desta série que aponta para todos os seus oito artigos. Com esta ressalva feita, seguimos.
Em situações normais e equilibradas de mercado, o custo de capital de terceiros é menor do que o custo de capital próprio, pois os credores têm uma prioridade mais alta em relação aos acionistas no recebimento do fluxo de caixa da companhia. Via de regra, eles também já têm definida uma regra de recebimento do seu capital de volta, ao passo que acionistas dependerão fortemente dos resultados da empresa. Em cenários mais drásticos como de recuperação judicial ou mesmo de falência, credores também têm prioridade e recebem antes dos acionistas qualquer quantia que vier a ser distribuída.
Pelo fato de o capital de terceiros ser mais barato (e pelo benefício fiscal da dívida, para empresas no regime de lucro real), ter 100% do seu capital financiado com recursos próprios acaba por não ser ideal por tornar o seu custo de capital muito alto. Por outro lado, uma empresa demasiadamente alavancada (ou seja, com nível alto de dívidas) incorre em custos adicionais desnecessários pela maior chance de problemas financeiros e, portanto, tem seu custo de capital (e valor) devidamente penalizados pelo mercado. Desta maneira, o conceito da estrutura ótima de capital surge quase que naturalmente: qual percentual de capital próprio uma companhia deve ter? A relação capital próprio vs. capital de terceiros que atingir o melhor equilíbrio risco vs. retorno possível irá se refletir no menor custo de capital possível para a companhia, o que a fortalecerá competitivamente e, principalmente, fará com que seu valor de mercado seja o maior possível.
O conceito de nível ótimo de capital próprio e de terceiros é bastante claro qualitativamente, mas ainda não há uma fórmula matemática ou algo similar que identifique a estrutura ótima de capital de uma empresa. Aliás, convém ressaltar que a estrutura ótima de capital não é a mesma para toda e qualquer empresa, pois varia com diversos fatores, tais como setor econômico de atuação, nível de incerteza do fluxo de caixa futuro, oportunidades de crescimento, subsídios existentes, natureza e prazo dos projetos da empresa etc. E é exatamente o fato de não ser uma questão com resposta precisamente definida que a discussão em torno da estrutura ótima de capital é quente e relevante para qualquer empresa.
O uso de capital próprio de forma calibrada e condizente com o negócio e setor é extremamente saudável, pois demonstra que a empresa tem saúde financeira e recursos para correr riscos condizentes com o seu negócio, porém limitados ao seu capital próprio. Por outro lado, existem recursos financeiros disponíveis em todo o mercado bancário e de investimentos que desejam correr um tipo de risco menor que o de acionistas e, portanto, aceitam uma remuneração menor: isso, uma vez mais, sem falar no benefício fiscal válido para empresas no lucro real, que é o caso na maioria das grandes empresas que atuam no Brasil.
Como ressaltamos acima, essa composição deve ser saudavelmente equilibrada. Por exemplo, na medida em que uma empresa ultrapassa esse limite saudável e assume índices de endividamento muito altos, o custo do endividamento pode se tornar preocupantemente alto, podendo até quebrar covenants, o que deflagaria a possibilidade de exigência antecipada do valor da dívida pelos credores. No limite, caso não recebam valores aos quais têm direitos, credores poderiam até pedir a falência da empresa.
No Brasil, há diversas opções específicas de financiamento para projetos de infraestrutura, sendo algumas delas com taxas bastante competitivas e até atraentes. Alguns dos principais mecanismos e instituições que oferecem suporte financeiro ao setor de infraestrutura incluem:
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Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES): O BNDES desempenha um papel significativo no financiamento de projetos de infraestrutura no Brasil. Ele fornece empréstimos e financiamentos em condições favoráveis e diferenciadas para projetos que contribuem com o desenvolvimento econômico e social do país.
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Programa de Parcerias de Investimentos (PPI): O PPI é uma iniciativa do governo federal brasileiro que busca atrair investimentos privados para projetos de infraestrutura por meio de concessões e privatizações. Ele abrange, dentre outros, setores como transporte, energia, saneamento etc.
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Bancos regionais de desenvolvimento: O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco da Amazônia (BASA) são bons exemplos de instituições que oferecem financiamento diferenciado para projetos de infraestrutura em suas respectivas regiões.
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Investidores Privados e Fundos de Infraestrutura: O Brasil tem atraído investidores privados e fundos de infraestrutura para participar em parcerias público-privadas (PPPs) e concessões, contribuindo com capital privado para o desenvolvimento de projetos.
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Mercado de Capitais: A emissão de títulos no mercado de capitais é uma opção para captar recursos para projetos de infraestrutura, permitindo que investidores institucionais e individuais participem do financiamento. Aliás, neste contexto, escrevemos este artigo por aqui (pode ser que interesse a você leitor, caso não tenha lido).
Ainda sobre a estrutura de capital corporativa, empresas distantes do ponto ótimo terão seus projetos subprecificados pelo mercado exatamente porque uma estrutura de capital ineficiente aumenta o WACC e, portanto, reduz o valuation dos seus investimentos. Neste sentido, faz-se mister analisar outros participantes do mercado no tocante às suas estruturas de capital e como o mercado reage diante de novos projetos de investimento. Definir a combinação ideal de financiamento corporativo, ou seja, a sua estrutura ótima de capital precisa ser parte da agenda estratégica de toda empresa. Para isso, compreender todas as nuances da discussão é fundamental para que se consiga maximizar o valor entregue pela companhia aos seus acionistas e, por que não dizer, à toda a sociedade.
Um forte e respeitoso abraço a todos vocês. Fiquem à vontade para comentar abaixo com o intuito de agregar conteúdo à discussão. Para saber muito mais e acompanhar todo o meu trabalho, fica o convite para me seguir (@carlosheitorcampani) no Instagram, no LinkedIn e no Youtube.
* Carlos Heitor Campani é PhD em Finanças, Certificado pelo CNPI e Pesquisador da ENS – Escola de Negócios e Seguros. Além disso, ele é Diretor Acadêmico da iluminus – Academia de Finanças e Sócio-Fundador da CHC Treinamento e Consultoria. Campani pode ser encontrado em www.carlosheitorcampani.com e nas redes sociais: @carlosheitorcampani. Esta coluna sai a cada duas semanas, sempre na quinta-feira.