Se é que a pressão pode aumentar ainda mais, o governo começa nova semana francamente acuado, apesar de notícias boas do lado da vacinação. Pode ser que o presidente tenha aprendido a se equilibrar no slackline (tenho a sensação que não existia quando estava no exército), mas o vento só faz aumentar nessa semana curta da paixão de Cristo, com Bolsonaro pedindo para jejuarem (o brasileiro já está fazendo isso por necessidade) e orarem, cada um para seu santo e por razões diversas.
O fato é que a pressão aumento bastante na semana passada e por duas razões principais. De um lado as pedaladas no orçamento de 2021, e de outro na pressão política sobre Bolsonaro para remover Ernesto Araújo do Ministério das Relações Exteriores, extensivo ao também ministro do Meio Ambiente.
Sobre o orçamento de 2021, a equipe econômica e o próprio ministro Paulo Guedes se debruçaram sobre os números e chegaram à conclusão de queé inexequível. Sobrariam cerca de R$ 49,5 bilhões em despesas discricionárias para todo o ano, exigindo cortes de cerca de 51%, e travando o governo. A consultoria IFI, que assessora o parlamento, disse que Paulo Guedes criticou recentemente que as despesas discricionárias superariam o teto em R$ 31 bilhões. Mas o Brasil tem sempre os seus “jeitinhos” de economia de guerra para manter emendas parlamentares de quase R$ 50 bilhões, nessa fase absolutamente crítica de desequilíbrio fiscal.
Já sobre Ernesto Araújo, nosso chanceler, o ministro entrou em linha de choque com a senadora Kátia Abreu nas redes sociais, ao acusar que tinha interesse em manter a China dentro da tecnologia 5G, tendo sido então chamado de bandido. O presidente do Senado Rodrigo Pacheco e outros parlamentares foram em defesa, dizendo ser uma afronta ao Senado. Bem verdade que os pleitos para Bolsonaro tirar Araújo eram antigos e ganhou força com os empresários sobre o episódio com vacinas e negociação frágil do Itamarati. Ao que parece também existiu uma carta de integrantes do Itamarati pedindo a saída
Outro que parece estar na “corda bamba e sem sombrinha” é o titular do Meio Ambiente Ricardo Salles, desde abril do ano passado, com a história de “passar uma boiada”, naquela reunião ministerial fatídica. Destacamos que o presidente Biden formalizou convite para que Bolsonaro e mais 39 líderes para a cúpula do clima em abril. Bolsonaro terá que mudar seu discurso, sob pena de ter a unanimidade contra.
Ainda que exista esse risco, Bolsonaro já está mudando sua abordagem sobre pandemia e clima. Aparece usando máscara, fala abertamente de vacinação massiva e esqueceu um pouco o tratamento precoce. No ministério da Saúde, por exemplo, a ordem e uso corrente e obrigatório de máscaras na gestão Queiroga. Com relação ao clima, Bolsonaro tem evitado falar, mas em ambos os temas, às vezes, tem algumas recaídas.
Não podemos esquecer também o discurso do presidente da Câmara Arthur Lira (Bolsonaro foi cabo eleitoral) na semana passada sugerindo que poderia abrir processo de impeachment do presidente, tema já comentado francamente no Congresso Nacional, o que pode tornar o presidente ainda mais arredio e/ou agressivo.
Só para piorar um pouco começa a aparecer boatos de descontentamento ente os técnicos da esfacelada equipe econômica, inclusive o próprio ministro, o que agravaria ainda mais a tensão. Ou seja, a pressão segue ampliando e os próximos lances podem ser inusitados. Mas uma coisa é certa: perde o Brasil e complica ainda mais todo o resto de vacinas despesas, etc.
Resumindo, o momento é de pandemia se fortalecendo mesmo com vacinação ampliando e apontando para 1,0 milhão de doses aplicadas por dia, desvalorização forte da moeda real e repasse para inflação, desemprego e subemprego ampliando a parcela de vulneráveis e miseráveis, descontrole fiscal e inflação em alta e despesas crescentes, principalmente se for necessário estender ainda mais o auxílio emergencial.
Resultado é que a tensão é crescente e a janela de oportunidades para reformas e ajustes vai se estreitando.