Avaliar uma criptomoeda funcional não é tarefa fácil. Os desafios técnicos surgem conforme os usos se consolidam. Ao fazer do Ethereum uma plataforma para decisões de investimento descentralizadas, houve o hack mais famoso das criptomoedas (para quem não conhece, aqui uma introdução ao caso do TheDAO. Recentemente, mesmo questões simples com erros de código no NEO levaram a uma paralisação total de sua blockchain. Um mercado experimental não pode ser facilmente antecipado e a colaboração com desenvolvedores – ou ao menos acompanhar suas novidades – é um recurso importante para analistas.
Entretanto, como saber avaliar algo que ainda não saiu? É, no mínimo, estranho que a EOS esteja com a quinta maior capitalização de mercado, valendo cerca de 10,5 bilhões de dólares. Esse criptoativo ainda é um token ERC20 sem grandes propriedades, que será trocado por um token EOS verdadeiro, com poder de voto sobre as decisões da rede e as demais prerrogativas dos investidores EOS. Sua emissão é periódica, com leilões sobre os tokens ERC20. A rede está prevista para junho, com sua atual capitalização de mercado possivelmente próxima do que investidores creem que a rede valerá quando lançada.
As promessas da moeda justificam essa valoração. Seu sistema de Delegated Proof-of-Stake permite maior escalabilidade, afinal há menos nodes para propagar as transações validadas. Nesse caso, no chamado “trilema da escalabilidade” – só se pode escolher priorizar dois focos dentre escalabilidade, descentralização e segurança – EOS escolhe sacrificar a descentralização. Entretanto, a equipe do EOS argumenta que há nodes suficientes para garantir descentralização e alguma resistência a censura. Além do mais, a rede do Ethereum se centraliza em três nodes controlando mais de 50% da mineração e a rede do NEO é completamente centralizada e dominada pela NEO foundation. Nesse caso, a EOS não sofreria tanto comparativamente a seus potenciais competidores no quesito descentralização.
Entretanto, por se tratar de um sistema de votos, há uma plutocracia potencial no EOS. Esse é o argumento de Vitalik Buterin, do Ethereum, nesse texto. Com, talvez, poucos players garantindo a segurança da rede poderia haver cartéis e, portanto, censura na plataforma. Nesse caso, não haveria razões para desenvolver na rede da EOS ao invés de usar um serviço centralizado. Não vejo muita credibilidade nesse argumento. O potencial de cartel no DPoS não é tão menor que o atual Proof-of-Work do Ethereum e censuras ainda não foram verificadas. Além do mais, o Ethereum perdeu suas características originais baseadas em idealismo e irreversabilidade de código, com um perfil que alguns argumentam pode trazer censura.
Portanto, é algo possível que de fato o EOS tenha problemas relacionado a descentralização. O que não é claro é se essa deficiência será pior que os sistemas já existentes. Dessa perspectiva, se considerarmos os atuais projetos com seu valor percebido do mercado, não é exagerada a valoração do EOS. Naturalmente, quando a rede for lançada mais problemas outros que a centralização serão percebidos, porém a priori a valoração não é de todo injustificada. Há críticas válidas, como a ausência de projetos sendo desenvolvidos, porém isso é esperado numa rede inexistente: realidade, o projeto evidentemente não é ainda e, sabemos, a realidade será dura. Entretanto, acreditar que o projeto é apenas hype não é recomendado, uma vez que seus concorrentes possuem problemas similares aos projetados no EOS e, dessa maneira, as críticas feitas em diversos textos linkados nessa coluna não são exatamente sólidas.