Como venho argumentando em outros textos, neste Investing.com, há uma distância considerável entre o modo como nossa economia e a gestão de Jair Bolsonaro são percebidas no Brasil e no exterior. A nível doméstico, o Ministério da Economia e seu arauto, o ministro Paulo Guedes, são blindados de críticas em meio a as contínuas polêmicas envolvendo o resto do governo, vendendo a ideia de que nossa economia está em franca recuperação.
Entretanto, a nível internacional, a recuperação econômica do país é considerada excessivamente lenta e o espaço dedicado às trapalhadas do Planalto ocupam a maior parte do noticiário sobre o país. Excentricidades à parte – como no caso de Roberto Alvim, que parafraseou Goebbels ao som da ópera favorita de Hitler –, o grande destaque negativo tem sido em relação ao descaso com a preservação da Amazônia brasileira.
Pois bem, eis que essa semana teve início o Fórum Econômico Mundial, que trouxe como figura central a ativista sueca Greta Thunberg e os desafios impostos pela mudança climática – que, vale lembrar, o Chanceler do Brasil, Ernesto Araújo, considera ser parte de uma conspiração globalista que visa dar mais poder a China. Bolsonaro, que ganhou notoriedade mundial pelo descaso com a preservação ambiental (vide artigos do Guardian, do New York Times e da AP, além dos incêndios na Amazônia no ano passado), optou por não ir, restando ao mandatário da Economia, Paulo Guedes, a função de representar oficialmente o Brasil no encontro.
Como era de se esperar, a visão bolsonarista da economia, do próprio governo e do Brasil bateu de frente com a do restante do mundo, resultando num aprofundamento ainda maior da aversão estrangeira a investimentos qualificados no país. Em síntese, a estratégia do governo frente a elite financeira do mundo, que pela primeira vez se articula frente a ameaça climática – do Fundo Monetário Internacional aos maiores fundos de investimento do mundo – foi tentar vender números pífios a uma plateia que ansiava por soluções verdes.
Em memorável desserviço a recuperação das credenciais do Brasil frente ao mundo, o Ministro afirmou que “O pior inimigo da natureza é a pobreza. As pessoas destroem o meio ambiente porque precisam comer”. A fala diz muito sobre o atual governo: ignora que a maior parte do desmatamento é feita pela agropecuária extensiva, produção de soja, mineração e extração ilegal de madeira.
Acontece que, ao colocar os interesses do agronegócio acima da pauta ambiental, fica difícil convencer investidores qualificados/as, cada vez mais comprometidos com o impacto climático de seus investimentos, a se envolverem com a claudicante economia brasileira. Ao jogar a favor de um modelo arcaico, o Brasil não pode esperar contar com o auxílio de uma iniciativa privada que busca soluções de vanguarda.
Seguindo na mesma toada, o Ministro tentou defender o uso de agrotóxicos, ignorando agora a repercussão negativa suscitado pelo processo de aprovação-relâmpago de dezenas de pesticidas no ano passado. Sobre o uso de tais substâncias, comentou que “todos nós queremos um espaço mais verde e queremos mais comida. E dependendo de quais químicos você usa para ter mais comida, você não tem um espaço limpo”. Mais uma vez, a postura apologética em relação ao agronegócio e indústria extrativista reforçam a imagem negativa do país.
Num episódio bastante ilustrativo do governo Bolsonaro, o secretário especial da Produtividade, Emprego e Competividade, Carlos Costa, interrompeu a apresentação do cientista Carlos Nobre, sobre o desmatamento das florestas tropicais e economia sustentável, para ir ao palco defender o governo – que sequer havia sido mencionado – frente a uma plateia que, escreve o Jornal do Brasil, “pouco compreendeu a iniciativa”.
Esse senso de importância exacerbado, em parte nutrido pela cobertura midiática brasileira, só não é superado pela fala do Secretário Especial de Comércio Exterior, Marcos Troyjo, que registrou no Estado de S. Paulo a seguinte fala: “Em que lugar no mundo está acontecendo o mais dramático processo de reformas institucionais e reformas estruturais? É no Brasil" – aparentemente, o resto do mundo ainda não percebeu.
Entretanto, como escreveu Reinaldo Azevedo, ainda há como correr atrás do prejuízo - embora improvável, visto que há pouco mais de um ano atrás, Bolsonaro ponderou submeter o Ministério do Meio Ambiente ao da Agricultura, gerando ampla repercussão. Em todo caso, trata-se de uma questão crítica para a retomada efetiva e longeva da economia brasileira.
Basta tomar, por exemplo, matéria publicada hoje pelo Estado de S. Paulo, que conversou com executivos que participam do Fórum para ver o impacto que a imagem do Brasil tem em sua tomada de decisão. Embora se mostrem inclinados a ignorar as trapalhadas do governo, alertam que o fator ambiental é cada vez mais decisivo numa economia cada vez mais global e competitiva – em especial, porque os impactos climáticos, diferente das políticas econômicas, não se limitam às fronteiras nacionais.
Embora a postura Brasileira esteja, de fato, alinhada à da gestão de Trump nos EUA, tem-se que levar em conta uma questão que, embora óbvia, é corriqueiramente ignorada: o Brasil, que lentamente se recupera de uma recessão, não é os Estados Unidos, maior economia do mundo, embalada por um período de crescimento recorde. O luxo de ir na contramão da economia contemporânea não pertence ao Brasil – que, diga-se de passagem, é quem mais tem a ganhar com a onda verde. Em especial, quando faz isso em nome dos setores mais rudimentares da indústria mundial, preterindo o imenso potencial biotecnológico por boi, soja e minério de ferro.